Eleito o mais belo transformista do estado de São Paulo, o maquiador Gerald Pizzi, de 25 anos, revela um passado difícil, de preconceitos e sofrimento, até alcançar seu maior sonho: o título de Miss SP Gay, conquistado em junho, com a personagem Bárbara Rivera.
Pizzi conta que foi o desejo de brilhar em um concurso de beleza que o motivou a enfrentar todas as críticas que sempre ouviu desde a infância em Brodowski (SP), cidade com pouco mais de 20 mil habitantes, onde nasceu e vive até hoje.
“Eu cresci me sentindo uma pessoa feia, me sentindo menosprezado pela sociedade, me sentindo diferente, mas não apenas em termos de orientação sexual. Eu nem pensava nisso naquela época. Para mim, era apenas coisa de aparência”, desabafa.
Nascido em família humilde, Pizzi e os quatro irmãos nunca tiveram regalias. Apesar da situação financeira difícil, a mãe, dona de casa, e o pai, vendedor de frutas, fizeram o possível para que os filhos concluíssem os estudos. Mas, foi na escola que o menino sofreu a primeira rejeição.
“Eu era ridicularizado, dificilmente tinha par para dançar festa junina, as mães me afastavam dos filhos dela, mas eu não entendia muito bem o por quê. Eu era uma criança inocente, só fui me descobrir gay aos 13 anos. Aliás, eu nem sabia o que era ser gay”, diz.
O maquiador chegou a pesar 107 quilos e a obesidade também o levava a ser alvo de piadas por parte dos colegas. Pizzi relata que se sentia muito triste com os apelidos que recebia e aos 9 anos decidiu, por conta própria, iniciar a primeira de muitas dietas.
“No popular, eu era pobre, gordo, negro e gay. Era só assim que as pessoas me enxergavam. Hoje, não existe tanto preconceito, mas naquela época era muito diferente. Eu era tudo o que as pessoas não gostavam”, afirma.
Mas, as “brincadeiras” foram se tornando mais agressivas. Prestes a concluir o ensino médio, Pizzi abandonou os estudos. Foram dois anos longe das salas de aula, até que a família o matriculou em uma escola em Ribeirão Preto (SP), município vizinho.
“Fui um adolescente recluso, saía poucas vezes, não tinha amigos. Só ia do trabalho para casa e de casa para o trabalho. Na rua, eu andava de cabeça baixa, tinha vergonha de olhar na cara das pessoas e ser atacado, ou ser ofendido. E, realmente, isso acontecia”, revela.
Até na vida profissional, Pizzi conta que enfrentou muitos obstáculos e chegou a ser demitido de uma empresa onde trabalhava porque usava protetor solar com cor no rosto, devido à pele morena, e manteiga de cacau nos lábios.
“Eles entraram em contato comigo, dizendo que estavam recebendo reclamações por eu trabalhar maquiado e justificando que as pessoas não estavam acostumadas com isso, ainda mais por ser uma empresa que vendia material de construção”, conta.
A pressão psicológica se tornou depressão. Pizzi afirma que não sentia mais vontade de viver e passava os dias fechado no quarto. A televisão era a única companhia e foi justamente assistindo a um concurso de beleza que tudo começou a mudar.
O maquiador relembra exatamente a data: era 28 de maio de 2007, quando a então Miss Brasil Natália Guimarães perdeu para a concorrente japonesa e ficou em segundo ligar no Miss Universo daquele ano.
“Naquele momento, eu decidi que minha vida seria diferente, eu queria me tornar miss. Eu sentei, escrevi em um papel todas as minhas metas e em que época conquistaria cada coisa. Eu me apoiei no mundo miss para viver”, relembra.
Foi nesse mesmo período que Pizzi começou a se interessar por maquiagem, ao perceber que a prática funcionava como uma forma de terapia. Aos 18 anos, concluiu o primeiro curso na área e, aos 22, já havia se tornado um profissional reconhecido no interior de São Paulo.
“A maquiagem foi uma válvula de escape que, aos poucos, se tornou uma paixão. Acho que ela também ajuda a esconder um pouco do meu sofrimento interno. Quando estuo mal, eu me maquio. Se estou triste, ou com a autoestima baixa, me maquio”, afirma.
Focado exclusivamente nos concursos de beleza, o maquiador conta que emagreceu 40 quilos em um ano e meio. Só na reta final para o Miss SP Gay foram 16 quilos eliminados em 45 dias. Conforme Pizzi se preparava, aos poucos a personagem Bárbara Rivera nascia.
Junto com ela, o estúdio do maquiador foi ganhando mais cor: vestidos, saltos, perucas, unhas e cílios postiços, além de muitos e muitos itens de beleza para uma maquiagem impecável, a marca registrada do transformista.
“Apesar de tudo isso, na hora que abriram as cortinas do Miss São Paulo eu pensei ‘não vou fazer nada ensaiado’. Fui eu mesmo, de coração, e então eu percebi que dentro de mim não havia só sofrimento, descobri uma beleza que nem eu sabia que existia. Foi a beleza interna que me fez vencer o concurso”, diz.
Agora, Bárbara Rivera se prepara para o Miss Brasil Gay. E diante de um desafio maior, a expectativa é de alçar um voo ainda mais alto e conquistar a coroa de Miss Universo Gay. Do passado de sofrimento, o transformista diz que só leva consigo o aprendizado.
“Hoje, eu tenho a admiração e o arrependimento das pessoas que me fizeram mal. Hoje, as mesmas pessoas que, antes, me julgavam, pedem foto. Por isso, eu aconselho sempre as pessoas a nunca desistirem dos seus sonhos e não darem ouvidos ao que as pessoas dizem, a menos que forem palavras de incentivo”, conclui.