Artigos e Opinião

OPINIÃO

A+ A-

Rolemberg Estevão de Souza: "Violência urbana e narcotráfico"

Diplomata

Redação

16/07/2018 - 01h00
Continue lendo...

A violência urbana em seus diversos formatos – feminicídios e homicídios, assaltos e roubos, latrocínios e sequestros, extorsões e achaques, preconceitos e discriminações – entraram há muito no cotidiano do País.

Agravada nos últimos anos em razão da crise econômica e política, a violência deverá ocupar o centro dos debates eleitorais a partir de agosto, cenário no qual a eleitora e o eleitor deverão prestar a máxima atenção aos discursos dos candidatos (as), interpretar suas intenções e captar as entrelinhas. O único consenso entre analistas do tema é que não há soluções fáceis e que as mais promissoras têm tempo mais longo de maturação.

Explico-me. Assim como os momentos mais dramáticos da Revolução Francesa foram aqueles nos quais o preço do pão atingiu seus maiores níveis, sabemos que a pobreza, a desigualdade e as carências nas áreas de habitação, saneamento, educação, saúde e segurança estão na base dos índices assombrosos apresentados pelo Brasil. Entretanto, a redução das desigualdades, a geração de empregos em grande escala, a distribuição e a eventual redistribuição de renda são tarefas que ultrapassam um período governamental ou as possibilidades de atuação de poucos políticos e partidos. É o desafio de toda a sociedade, cabendo aos partidos  apresentar o seu projeto para o médio ou longo prazo, os objetivos a serem atingidos e os meios para alcançá-los.

Ciente da amplitude do problema e de sua complexidade, venho apresentar modestamente algumas considerações. Na atual situação do País e de Mato Grosso do Sul, em particular, três linhas de ações podem ser adotadas, uma vez legitimadas pelo voto: a) o combate ao narcotráfico, tanto por meio da diminuição da oferta quanto pela redução da demanda; b) a redução do número de armas que ingressam a cada dia no estado; e c) a diminuição da influência da cultura da violência nos casos aparentemente mais brandos. Esses três pontos não devem ser tomados como as únicas ações a serem implementadas, mas como indicativos de uma orientação, de uma estratégia em sentido amplo. 

Há grande convergência entre os analistas do tema quanto à força do narcotráfico como instrumento de promoção da violência. O combate ao tráfico de drogas deve prosseguir, por meio do aprimoramento das ações de inteligência, de apreensões e prisões de traficantes e de maior agilidade no processo penal. Mais importante, porém, é atacar também a demanda pela droga, com campanhas de esclarecimentos sobre seus efeitos de longo prazo, em política similar à que o país adotou no passado frente ao tabagismo. O Brasil é um dos casos mais relevantes no mundo de redução do número de fumantes, e uma campanha semelhante para as drogas ilícitas deve render frutos.

Outro fator que pode contribuir para a diminuição do tráfico de drogas e, consequentemente, para a violência urbana um maior controle do ingresso de armas no estado. Sem ilusões quanto às dificuldades que é controlar as fronteiras – nem os Estados Unidos conseguem fazê-lo –, a intensificação do uso de equipamentos modernos e de ações de inteligência interligada a agências internacionais é o caminho natural. Nesse sentido, temos que reconhecer que a Polícia Federal e as Forças Armadas brasileiras já cumprem – em boa medida – papel exemplar.

Quanto às causas relacionadas à cultura da violência, a educação e a mídia podem contribuir ao esclarecer aspectos simbólicos do problema da violência, como o machismo, o sexismo, o racismo e outras formas de discriminação. Somente a tolerância em relação à diferença pode gerar uma sociedade mais equilibrada.
Vamos assumir parte da responsabilidade e perguntar aos nossos concidadãos consumidores se não se preocupam com a dimensão social do uso de drogas. Se a droga, para chegar aos olhos, à boca e ao nariz do consumidor final, passa por disputas que redundam em mortes, por que alimentar esse que é um dos principais fatores da violência urbana? Se muitos jovens de nossas favelas morrem precocemente, vale a pena o consumo recreativo desta ou daquela substância? O argumento contrário que invoca a liberalização esbarra em outros problemas como o potencial crescimento de usuários e os gastos crescentes do setor da saúde com doenças decorrentes do vício, o que inclui o álcool.

Enfim, deveríamos estar cientes de que, por trás da convivência e da conivência diária com o consumo recreativo de drogas, comum a parte de nossa sociedade, se encontra muito de violência tanto física quanto simbólica.