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OPINIÃO

Mateus Boldrine Abrita: "A geografia da inovação"

Mateus Boldrine Abrita: "A geografia da inovação"

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A geografia é muito importante para a compreensão do complexo processo de geração de conhecimento e inovação. O conhecimento, o processo inovativo e o desenvolvimento são motivados e reproduzidos de forma desigual, principalmente no que diz respeito ao espaço local, regional e temporal.

A inovação não é distribuída aleatoriamente ou uniformemente no espaço, mas, sim, existe uma tendência à concentração espacial, processo que tem se intensificado no decorrer do tempo. Como exemplo, temos as concentrações do Vale do Silício, na Califórnia, e Boston, em Massachusetts, ambas nos Estados Unidos; região de Londres, na Inglaterra; Tóquio, no Japão; recentemente têm-se destacado também Pequim, na China, e Seul, na Coreia do Sul.

A contemporaneidade econômica é caracterizada por alta competitividade, em que o sucesso das empresas depende cada vez mais da capacidade de produzir produtos e processos novos ou melhorados. Um efeito da globalização que é muito difundido é que muitas capacidades e fatores de produção previamente localizados se tornaram onipresentes, ou seja, globais.

No entanto, outro aspecto importante e que muitas vezes é negligenciado pela análise do grande público é a parte do conhecimento não negociável e não-codificável em razão da dificuldade de compartilhá-lo entre longas distâncias.

Um desses elementos é o chamado conhecimento tácito. Com o perdão da simplificação do exemplo, seria como se nós recebemos uma receita da nossa bisavó e tentássemos replicar a distância, provavelmente a receita ficará boa, afinal, o pessoal de antigamente era muito bom na cozinha.

Todavia, tenho quase certeza de que se sua bisavó fizer a receita o resultado será melhor, isso porque ela adquiriu ao longo da vida conhecimento tácito inerente a ela e de difícil formalização (como colocar em um livro, por exemplo), como lidar com imprevistos, escolher melhor os ingredientes, etc.

Do mesmo modo ocorre com o processo de inovação. Nesse sentido, a proximidade espacial ganha destaque como fator de suma importância para explicar as diferenças da atividade inovadora entre regiões. A transmissão de conhecimento tácito necessita de uma linguagem comum e de convenções e normas que possam ser compreendidas pelos envolvidos na troca.

Essas propriedades ajudam a desenvolver confiança, destacam a importância da proximidade espacial e trazem à tona a importância da interação social, ou seja, do contato tête-à-tête.

A ideia de que o conhecimento tácito é o que faz a diferença entre regiões que se destacam por sua capacidade de inovação é de certa forma contra intuitiva. No entanto, considere, por exemplo, que para o surgimento de uma inovação é necessário uma série de testes e experimentos que, na maioria das vezes, acontecem por tentativas e erros.

Quando a inovação acontece, os resultados são documentados e divulgados. Mas note que apenas os resultados positivos geralmente são divulgados. Entretanto, os experimentos falhos e os testes errados foram, provavelmente, de grande importância para a equipe de cientistas que desenvolveu a inovação.

Suponha que a mesma equipe comece a trabalhar no desenvolvimento de uma inovação, essa equipe já possuirá uma bagagem de conhecimento em razão dos seus sucessos e erros, enquanto uma equipe de profissionais de uma região distante, que apenas leu sobre o sucesso da inovação desenvolvida pela primeira equipe, não terá o conhecimento de todas tentativas erradas e frustradas que levaram ao surgimento da inovação.

Isso faz com que a primeira equipe tenha mais experiência do que a segunda, mesmo que as duas tenham lido o mesmo relatório sobre o bem-sucedido desenvolvimento de uma inovação.

Portanto, um ponto essencial que surge no debate da inovação e do conhecimento é justamente a inserção da dimensão territorial nessa análise. Essa inserção ocorre, entre outros motivos, pela existência e importância do conhecimento tácito no processo inovador.

* Mateus Boldrine Abrita Professor, doutor, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul 
* Rafaella Stradiotto Professora, doutora, da Universidade Estadual de Maringá 
* Marcos Paulo da Silva Falleiro Doutorando da Universidade Federal do Rio Grande do Sul 

EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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