Levou o prêmio máximo da academia cinematográfica americana o filme “A Forma da Água”, apesar da ausência de ineditismo no enredo, já que a história se viu envolvida em, pelo menos, três plágios que, embora desmentidos, deixem dúvidas sobre a obra. Um deles é “The Space Between Us”, um curta holandês com semelhanças em cenas e personagens, como o desenrolar das ações de uma faxineira, para salvar das mãos de cientistas reacionários um humanoide aquático, levando-o a seu habitat.
No filme “Uma Sereia em Minha Vida” (1984), a história se repete quando T.Hanks, apaixonado, mantém na banheira de sua casa uma “big” sereia, Daryl Hannah, sob a perseguição de um cientista malvado.
Poderíamos dizer que o cenário da película ganhadora é um misto de base subterrânea dos vingadores, na época do nazismo envolvendo a espionagem da Guerra Fria Sovietes-Tio Sam, com cenas estereotipadas da atualidade, embora fazendo alusão ao retorno daquilo que se vivia nos anos 60.
Um vigilante que justifica sua retidão num caráter inexistente como marido dominador de esposa subserviente; uma faxineira, solitária, muda e sistemática; um vizinho idoso, desempregado que tem preferências sexuais por uma torta de limão, vendida por um barman que o atrai; um pesquisador que tem uma ética estranha quanto à manutenção de um ser aquático capturado na América do Sul, com interesses de governos antagônicos.
As cenas nos mostram exatamente o período de 1960, em meio aos conflitos políticos e as transformações sociais da época nos Estados Unidos, onde um casal de negros é escorraçado de um bar, uma investida de admiração rechaçada com desgosto pelo barman homofóbico, o tratamento de superioridade do segurança sobre os empregados subalternos e o cientista e sua relação de subordinação a um comando militar.
Nada disso é novidade ou tão espantoso, já que “o velho guerreiro Chacrinha” repetia o bordão adaptado: “Na TV, nada se cria, tudo se copia” – lema seguido atualmente pelos novelistas que escrevem suas peças após serem influenciados pelos seriados de uma provedora global de filmes e séries de televisão via plataforma digital de desconhecimento do público-alvo.
O interessante é que as ocorrências vividas no filme estão se repetindo na atualidade e talvez, por essa forma de denúncia, a película tenha recebido laureada, ou não!
Preconceitos racistas, de gênero, de classe social, inversão de valores, em que subalternos se julgam superiores ocupando a capatazia sob o comando de categorias elitizadas. Vida familiar harmoniosamente falsa do “Wellfare” e “Way of Life” americano dos anos 60, em que a sociedade está alheia aos desmandos governamentais e a família está preservada das obrigações sociais enquanto os empregados da empresa se “emudecem” frente a determinações impostas e o receio de demissão.
Nada disso é novidade para nós, já que estamos revisitando no País todo esse clima ingênuo como no filme “La Vitta è Bella” (1999) para aqueles, que, como o protagonista, usa a imaginação para se proteger da violência que precisam enfrentar, com alarmes, cercas, blindados, dividindo espaços fechados (shoppings), fazendo com que tudo pareça uma brincadeira de soldadinho ou um joguinho dos vingadores, que teimam em atribuir a pessoas, partidos ou governo este cenário de mazelas, esquecendo-se de que tudo isso é resultado de uma escolha.
Lembremo-nos que a forma da água é a forma do recipiente que a contém e que esse enredo da atualidade molda-se perfeitamente às cabeças coroadas que, ingenuamente, ainda acreditam nos noticiários globais, que caixa-dois, propinas, esquemas e lobbies são ilicitudes recentes e que ações punitivas, persecutórias e vingativas têm o condão de eliminá-las.
A completar, o filme é embalado por melodias “cucarachas” de 1939/43, “Babalu” e “Chica Chica Boom Chic”, dois clássicos latinos dos horrores que ninguém merece, lembrando que o ser estranho capturado pelos americanos origina-se da América do Sul, numa republiqueta das bananas.
Para muitos amantes e críticos de cinema, o Oscar escolheu uma poesia romântica, uma aventura de ficção, mas o pano de fundo é o retrato da atualidade.