Artigos e Opinião

ARTIGO

A+ A-

Luiz Fernando Mirault Pinto: "Além das obras físicas"

Físico e administrador

Redação

14/09/2017 - 02h00
Continue lendo...

Com a função de fiscalizar, aferir balanças e pesos comerciais, bombas de gasolina e alguns taxímetros no Estado, uma agência de pesos e medidas, pertencente à Representação de Pesos e Medidas de Goiás (INPM-GO), exercia as atividades de metrologia desde meados de 1972, até agosto 1982, em Mato Grosso do Sul, quando o governador Pedro Pedrossian, por decreto, resolveu criar o Departamento de Pesos e Medidas de Mato Grosso do Sul, (Decreto nº 1.736, de 2 de agosto de 1982), como órgão de atividade específica na estrutura da Secretaria de Indústria e Comércio de Mato Grosso do Sul (Setic), para executar as atividades metrológicas no âmbito e jurisdição do Estado.

Bem antes, tive a oportunidade de conhecer o engenheiro e constatar seu interesse pela metrologia, designado que fui pelo Inmetro para estudar e estabelecer junto da administração estadual de sua gestão, as bases para implantação e o desenvolvimento da metrologia no estado visando à criação desse órgão técnico específico. 

Pedrossian, pelas suas palavras, dizia-se criado às margens de uma ferrovia, apaixonado que era pelos trens que o levaram a fazer carreira como engenheiro da Noroeste do Brasil, conhecia os problemas técnicos ferroviários tais como o dimensionamento das bitolas, as propriedades físicas sofridas pelos trilhos em suas vidas úteis (alinhamento, nivelamento), a largura do comboio e das plataformas, o tamanho dos dormentes, a granulação adequada da brita e todos demais equipamentos ferroviários que envolviam a metrologia.

À época, comentara particularmente sobre a Estrada de Ferro Jari, construída para transportar a madeira para fábrica de celulose e a usina termoelétrica do projeto Jari – Ludwig (Amazônia), e ressaltava a importância da metrologia aplicada nas instalações que haviam sido construídas no Japão, ao mesmo tempo em que as fundações (quatro mil palanques de maçarandubas) estavam sendo dimensionadas para receber o complexo, no Brasil, e que isso importava um alto grau de precisão de medida.

Dizia ele da importância da verificação necessária nos vagões tanque ferroviários de combustíveis, que dependiam da aferição em outros estados e que circulavam nas ferrovias estaduais sem o controle metrológico volumétrico e da capacidade máxima de peso bruto em circulação pondo em risco a continuidade do abastecimento, a manutenção das vias férreas, à lisura das operações; por outro lado ressaltava que tal controle deveria ser estendido aos caminhões tanque rodoviários assunto que daria sua atenção especial na construção de uma base de aferição localizada na saída de Campo Grande a partir da doação de terreno (Lei nº 294, de 7 de dezembro de 1981) para essa finalidade específica. 

E assim, com a intenção de dotar o Estado de uma estrutura capaz de desenvolver a metrologia até sua consolidação, solicitou a seu secretário de Indústria e Comércio (1982) que oficiasse ao Inmetro pedindo minha permanência no acompanhamento técnico de implantação e acompanhamento dos serviços metrológicos no Estado. 

Lembrado por expoentes de opinião sul-mato-grossense, “... foi o governador mais genial que este estado já teve. Pedrossian foi um visionário. Via o que, geralmente, os outros não enxergavam...” (J. A. H. Rodrigues), ou ainda “... tinha consciência crítica da realidade que via e a que poderia ser construída, estava sempre um passo ou mais à frente...” (G.Takimoto), como um homem de visão política e social, além das obras que marcaram com uma assinatura o desenvolvimento do Estado, sabia que a criação de um órgão com essa atribuição daria apoio técnico necessário à implantação das indústrias que aqui se instalariam com o controle de metrologia e qualidade dos produtos comercializados, estabelecendo uma concorrência justa e leal em favor dos consumidores.

Sua expectativa ainda longe da realidade ia além da atividade de fiscalização compulsória de pesos e medidas e idealizava que futuramente a semelhança de outros países o órgão viria a ser uma extensão necessária ao ensino de engenharia, com a disposição de laboratórios, a prestação de serviços técnicos, e a formação de metrologistas.

O mérito da criação do DPM/MS estava além das obras físicas da administração Pedrossian, ou seja, a institucionalização e uniformização da metrologia e da qualidade no Mato Grosso do Sul ao nível dos demais estados, hoje uma atribuição da Agência Estadual de Metrologia do Estado de Mato Grosso do Sul.

ARTIGO

Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

Continue Lendo...

O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

Assine o Correio do Estado

ARTIGO

Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

Continue Lendo...

Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

ASSINE O CORREIO DO ESTADO 

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).