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José Carlos de Oliveira Robaldo: "Miopia ou contradições da esquerda"

Procurador de Justiça aposentado. Advogado. Mestre em Direito Penal. Professor universitário.

Redação

02/08/2017 - 02h00
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As contradições, sobretudo da esquerda do nosso País, deixam qualquer um em parafuso.

Os partidos que se intitulam esquerdistas, com raríssimas exceções, seriam mesmo esquerdistas? Esquerda, na acepção da palavra, é a ideologia que defende as classes sociais mais necessitadas e mais carentes e que apregoa e defende a igualdade entre os seres humanos e o correspondente respeito aos seus direitos fundamentais, dentre eles, a liberdade, a alimentação, entre outros. Enfim, um direito a uma vida digna.

Não como contraponto, mas apenas como reflexão, vamos aos fatos. A imprensa divulgou recentemente que o PT e o PC do B subscreveram em Manágua, capital da Nicarágua, a resolução final do 23º Encontro do Foro de São Paulo, organização que reúne diversos partidos de esquerda da América Latina e do Caribe.

Nessa resolução, defende-se a elaboração de uma nova Constituição que amplia os poderes de Maduro e exalta o “triunfo das forças revolucionárias na Venezuela” e denuncia que a “revolução bolivariana é alvo de ataque do imperialismo e de seus lacaios”. Ampliar ainda mais os poderes!!!

Isso não seria um contrassenso?

Os noticiários, inclusive internacionais, são recorrentes em divulgar a situação caótica por que passa a população venezuelana.

A escalada de violência política, inclusive com muitas mortes, e a população passando fome e sem material primário de higiene pessoal, tal como papel higiênico, com migração de milhares de venezuelanos, dentre eles, índios, para o Brasil e Colômbia para fugir da miséria (pobreza extrema), tornaram-se matéria diária da imprensa e dos noticiários.

Não obstante, os mesmos veículos de comunicação têm dado destaque ao fato de que “Os três principais partidos de esquerda do Brasil — PT, PC do B e PDT — intensificaram o discurso em defesa do regime chavista de Nicolás Maduro na Venezuela” (revista Veja de 26.7.17).

A intensificação da miséria humana seria o papel da esquerda? Isso não seria retroagir aos primórdios da história, em especial ao absolutismo, quando prevalecia a vontade do Estado soberano sobre o homem? O homem como meio e não como fim.

As incoerências são muitas. Enquanto os principais partidos de esquerda, acima nominados, defendem a permanência de Maduro no comando da Venezuela, Guilherme Boulos, um dos expoentes teóricos dessa ideologia, daqui do Brasil, defende que “A esquerda precisa ser capaz de apresentar uma saída para a crise, que não seja a posição de fiadora de uma República que perdeu a credibilidade social” (Crise da República e o papel da esquerda).

Sim, sabemos que estava falando do Brasil, oposição ao governo Temer, que, diga-se de passagem, não anda nada bem. Mas por que não incluiu o governo Maduro nesse contexto? A resposta nos parece óbvia. Lá, a esquerda pode ser fiadora de um governo que perdeu a credibilidade social, aqui não! Salvo no governo anterior. Esse é o velho discurso da mão única ou da surrada separação entre “nós e eles”.

As contradições não param por aí. Como defender a igualdade quando muitos dos que a defendem e se dizem da esquerda residem e têm escritórios em bairros como Jardins de São Paulo, frequentam os melhores restaurantes do País, socorrem-se dos melhores advogados e dos melhores centros médicos, a exemplo do Sírio Libanês, Albert Einstein, com contas bancárias pomposas e ainda exibem automóveis dos mais caros do mundo e alguns deles residem em Paris!

Isso faz lembrar a expressão em francês Gauche caviar que significa “esquerda caviar”, conquanto pejorativa, é uma expressão utilizada para descrever um indivíduo que supostamente se diz socialista, mas que vive um estilo de vida luxuoso e capitalista.

Enfim, e o povo venezuelano passando fome. Não seria o momento de a esquerda se reinventar?