Artigos e Opinião

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Glauberth Holosbach: 'Relações socioafetivas da família brasileira'

Advogado

Redação

02/03/2018 - 01h00
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Não é segredo para ninguém que a legislação brasileira evolui e é criada de acordo com o desenvolvimento, novas formas de relacionamentos e clamores sociais da nossa sociedade.

Todavia, quando estes anseios regulamentários não são atendidos pelo Poder Legislativo, ao menos no tempo em que as modificações culturais e sociais vão acontecendo, cabe ao Poder Judiciário exercer tal função, seja por meio da sua jurisprudência, que nada mais é do que a interpretação da legislação existente por parte de nossos magistrados, seja por meio dos provimentos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Nesse passo, ainda que em nossa codificação não haja expressamente o reconhecimento da filiação socioafetiva, a jurisprudência vem prestigiando a chamada posse de estado de filho, sustentada no amor e no desejo de ser pai ou mãe.

A filiação socioafetiva é pautada na afetividade e convivência, originada de um vínculo que nasceu do coração, e não na ascendência genética, que após alguns debates em nossas instâncias superiores deixou de ter posição hierárquica superior àquela, ou seja, o aspecto biológico cedeu espaço ao comportamento social e afetivo.

Assim, até a edição do provimento n° 63 do CNJ de 14/11/2017, para que alguém, seja homem ou mulher, quisesse registrar afetivamente algum descendente, a única opção era por meio da propositura de uma demanda judicial, o que agora já não é mais necessário, vez que tal possibilidade registral foi estendida aos Cartórios de Registros de pessoas naturais, existentes em todos os municípios do País.

Portanto, com esta simplificação, basta que os pais registrais, munidos de seus documentos pessoais e da certidão de nascimento do filho, dirijam-se até um dos referidos cartórios para que, administrativamente, efetivem o registro da paternidade ou maternidade socioafetiva, respeitados alguns pré-requisitos.

Tal provimento vai além quando autoriza, também, a possibilidade de registro de multiparentalidade, que ocorre quando um filho estabelece uma relação de paternidade/maternidade com mais de um pai ou mãe. Cita-se como maior exemplo os casos em que padrastos e madrastas também se tornam pais e mães de seus enteados.

Não se pode esquecer que o vínculo recém-criado se estende aos demais graus e linhas de parentesco, passando a produzir todos os efeitos patrimoniais e jurídicos pertinentes, englobando, assim, toda cadeia familiar, inclusive o Direito Sucessório.

EDITORIAL

As bolhas que nos afastam da realidade

Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis

17/12/2025 07h15

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A expressão “estar em uma bolha” deixou de ser apenas uma gíria de internet para se transformar em um retrato cada vez mais fiel da forma como a sociedade vem se organizando. Nas redes sociais, algoritmos direcionam conteúdos, opiniões e notícias de acordo com preferências previamente identificadas.

O resultado é um ambiente confortável em que quase tudo confirma aquilo que o indivíduo já pensa. Divergir passa a ser exceção e confrontar ideias, um incômodo evitado.

Fora do ambiente digital, a lógica das bolhas também se impõe. O isolamento crescente em condomínios fechados, verticais ou horizontais, reduz o contato cotidiano com o diferente. Ao limitar o convívio, o indivíduo perde a oportunidade de compreender realidades distintas da sua própria.

Torna-se, ao mesmo tempo, mais desconfiado e mais desinformado, conhecendo o mundo mais pelo “ouvir dizer” do que pela experiência direta. A realidade passa a ser filtrada, editada e, muitas vezes, distorcida.

As bolhas criam falsas impressões. Quando se consolidam em grupos, reforçadas pelo sentimento de pertencimento, geram uma perigosa falta de sintonia com o restante da sociedade. Problemas coletivos passam a ser relativizados, minimizados ou simplesmente ignorados.

A empatia dá lugar à autoproteção e o interesse público acaba substituído pela preservação de privilégios.

Nesta edição, mostramos um exemplo concreto dessa desconexão: o aumento do duodécimo para quase todas as instituições de Mato Grosso do Sul, mesmo após um ano marcado por crise financeira, enquanto cresce a sobrecarga sobre o Poder Executivo.

É sobre ele que recai, de forma quase exclusiva, o peso de enfrentar as dores reais da sociedade: da falta de recursos para serviços essenciais às demandas crescentes por saúde, educação, transporte e assistência social.

Essa discrepância orçamentária não é apenas um dado técnico. Ela reforça as bolhas institucionais. Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis.

Trata-se de um desequilíbrio que aprofunda a sensação de injustiça e distancia ainda mais as instituições da realidade vivida pela população.

Seria desejável que integrantes das instituições que recebem repasses de duodécimo saíssem de suas bolhas. Que vivessem mais intensamente a realidade fora de gabinetes, relatórios e planilhas.

Que entendessem que, em tempos de dificuldades financeiras, reforçar privilégios e ampliar confortos institucionais não é apenas insensível, é socialmente injusto.

Romper bolhas não é simples, mas é necessário. Para indivíduos, para grupos e, sobretudo, para instituições públicas. A democracia e a justiça social exigem mais contato com a realidade concreta e menos acomodação em mundos protegidos. Caso contrário, seguiremos administrando percepções, e não problemas reais.

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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