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Gilson Cavalcanti Ricci: "Luzes de Paris em Campo Grande"

Advogado

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Surge a nova Rua 14 de Julho em sua roupagem de gala, a encantar os transeuntes com seus adereços e luzes feéricas, tal como um sublime cartão-postal de Champs-Elysées ou do Quartier Latin. Sua história é rica de acontecimentos marcantes na vida social e política de Campo Grande. Ali começou a existir a pujante efervescência comercial da cidade, com a chegada do trem no distante ano de 1914, quando os forasteiros chegados de longe passaram a desbravar a região em torno da estação ferroviária, então envolvida por espesso matagal: brasileiros de todos os recantos do Brasil e estrangeiros oriundos de várias partes do mundo, notadamente europeus, árabes e japoneses.  Os bravos pioneiros chegavam à cidade e, paulatinamente, iam formando os primeiros núcleos comerciais de Campo Grande. Entre eles sírios e libaneses foram os primeiros comerciantes da Rua 14, os quais utilizavam suas carroças na trilha aberta entre a ferrovia e o início daquela artéria, no transporte de mercadorias para abastecimento de suas rústicas casas comerciais, que começavam a dar à região um embrionário entreposto de vendas.

O nome 14 de Julho foi dado em homenagem ao episódio ocorrido anteriormente à Revolução Francesa, no dia 14 de julho de 1789, denominado Queda da Bastilha, na França pré-napoleônica. Em Campo Grande, o vereador Miguel Garcia Martins sugeriu homenagear a Queda da Bastilha, dando à rua o nome de 14 de Julho, o que foi aprovado pela Câmara de então. Pouco tempo depois, passou a denominar-se Rua João Pessoa, face à morte heroica do presidente do estado da Paraíba, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, no duelo à bala com o advogado João Duarte Dantas, motivado  por ciúme da bela professora e poetisa Anayde Beiriz, episódio ocorrido no período pré-revolucionário de 1930, razão pela qual a edilidade homenageou o valente governador paraibano, outorgando seu nome àquela ruazinha de Campo Grande. Todavia, ainda por deliberação da Câmara – e por questão meramente político-partidária –, a via voltou a ter o nome de Rua Catorze de Julho. Ou seja, a edilidade preferiu homenagear a distante França, preterindo o nome do nosso destemido compatriota nordestino.

Muitos fatos importantes e curiosos giram em torno da tradicional Rua 14. Tanto por seu atrativo comercial, como por sua situação no centro da cidade. Notadamente, por seu carisma no seio da população campo-grandense, como local de compras e encontro. Lembro-me quando jovem que me divertia nos domingos à noite no meio da rapaziada a flertar as donzelas casadoiras no vaivém no meio da rua, no trecho entre a Rua D. Aquino e a Avenida Afonso Pena – muitos casamentos surgiram graças ao “footing” da 14. Na esquina, um pitoresco relógio dominava o cruzamento das ruas, onde se aglomerava a rapaziada até às onze horas da noite, quando se dispersava e pegava a jardineira do Sobral para ir pra casa.

No tempo das campanhas eleitorais, o local servia de palanque nos comícios, ocasião em que os políticos se utilizavam da mureta em torno do relógio para esbravejarem suas “plataformas políticas”, enquanto a multidão se aglomerava ao redor. Muita pândega surgia nessas reuniões políticas e as piadas corriam soltas no meio do “eleitorado” – era muito divertido! Com o soberbo crescimento de Campo Grande tudo foi se modificando, quando as grandes empresas comerciais iam se instalando nas periferias da cidade, desviando assim o fluxo de compradores da Rua 14 para os bairros periféricos, notadamente quando se instalou o shopping center no Jardim dos Estados. A partir de então, a tradicional artéria central perdeu o atrativo, quedando-se praticamente às moscas.

Não tardou a Rua 14 cair no esquecimento das autoridades municipais, notadamente dos políticos, e assim o comércio somente não desapareceu dali graças à teimosia e coragem de alguns antigos comerciantes, que teimaram em continuar a trabalhar naquela rua. Após mais de cinco décadas de abandono, surge um prefeito dotado de tino administrativo, o qual, tão logo empossado como alcaide da Cidade Morena, dedicou-se à missão de zelar pela cidade. Entre suas obras de grande utilidade para os cidadãos campo-grandenses, o projeto de revigoramento do Centro tornou-se uma gratificante realidade. Agora, passeando pela nova Rua 14 de Julho, nossos olhos se deslumbram com o modernismo e a beleza, especialmente à noite, com a feérica iluminação, como se o dinâmico prefeito trouxesse as luzes de Paris para o centro de Campo Grande.

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Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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