Naquele tempo, a disciplina na Marinha de Guerra do Brasil era extremamente rígida. A chibata infligia aos marujos infratores castigo cruel. Era só praticar qualquer ato de alguma gravidade, para a chibata vibrar no lombo do infrator! Contra tal punição, houve forte reação na tropa, como também muitos civis importantes na época fizeram acirrado protesto, até que o castigo foi proibido terminantemente no âmbito da Marinha de Guerra.
Um dos filhos de uma numerosa família nordestina do Bairro Amambaí, o Eustáquio, apresentara-se voluntário para o Serviço Militar na Marinha. Foi para Ladário, e depois de submeter-se a rigoroso estágio, passou a navegar pelos mares afora, dedicando-se às atividades peculiares a um bom marinheiro “embarcado”.
Eustáquio era um rapaz calmo e disciplinado em seus afazeres. Na escola sempre foi um bom aluno, e assim se dedicava aos estudos com muito interesse, pois tinha o ideal de ser oficial da Marinha de Guerra, e talvez pudesse até chegar ao posto de almirante, que era o seu sonho dourado. Conseguiu transferência para o Rio de Janeiro, onde poderia dispor de melhores condições pedagógicas para alcançar seus objetivos.
Entretanto, não teve sorte. Depois do primeiro ano na Marinha caiu no desagrado de um novo comandante, vindo de um distrito naval da Amazônia. A partir de então, teve início o martírio de Eustáquio. Por qualquer motivo, o comandante o castigava com punições arbitrárias. Chegou ao ponto de rebaixar o seu comportamento para “mau”, colocando o subordinado a um passo da expulsão da Marinha.
Não conformado com as injustas punições, o comandante foi além. Num ataque de fúria, chicoteou Eustáquio violentamente na presença da tropa em forma no pátio da unidade. Bastante ferido, o pobre Eustáquio foi mandado à enfermaria, onde se submeteu a intenso tratamento médico, por motivo da gravidade dos ferimentos.
Depois de curado, Eustáquio voltou aos trabalhos normais da caserna. Estava de sentinela no portão da guarda de entrada do quartel, quando viu o comandante aproximar-se da guarita, no término do expediente. Não pensou duas vezes. Engatilhou o fuzil e disparou vários tiros no oficial, que caiu para fora do jipe mortalmente fulminado.
Houve grande reboliço: os marinheiros movimentaram-se rapidamente para todos os lados, uns tentando infrutiferamente socorrer o comandante, e outros correndo em perseguição a Eustáquio, que pulou espetacularmente pelo penhasco abaixo, desaparecendo nas ondas do mar.
Eustáquio era exímio nadador. Nadou vários quilômetros em direção ao continente, conseguindo safar-se da tenaz perseguição contra sua pessoa. Confuso e sem qualquer auxílio, resolveu voltar para a casa do pai, seguindo a pé pelos trilhos do trem, do Rio de Janeiro até Campo Grande, levando mais de um ano de peregrinação, numa viagem cheia de adversidades, passando necessidade de todo tipo.
Finalmente, chegou à casa do pai. Este, ao vê-lo em andrajos, não o deixou entrar em casa, descrente que aquele farrapo fosse o seu filho Eustáquio.
Exibindo-lhe sua identidade, e narrando tudo o quanto acontecera na Marinha, Eustáquio conseguiu convencer o pai. O velho ficou revoltado! Deu ampla proteção ao filho, garantindo-lhe severa vigilância contra qualquer ameaça à sua segurança pessoal. Mandou reunir os filhos mais velhos e os armou fortemente, para que promovessem a segurança pessoal do irmão.
A partir de então, Eustáquio, mudo, sentado sobre uma pedra, ficava o dia inteiro debaixo de uma mangueira, vendo o tempo passar. Certa manhã, estranhamente desapareceu. Procurado pelas redondezas, não foi encontrado.
As buscas duraram vários meses sem qualquer informação do desaparecido. Finalmente, correu a notícia que estava no bando de Silvino Jacques, quando foi morto pela Captura, juntamente com o temido bandoleiro.