As mudanças nas relações econômicas e de previdência também irão alterar o padrão de consumo no Brasil nos próximos anos.
Nos últimos dois anos, o Brasil passou por grandes transformações econômicas que ainda irão gerar efeitos por um bom tempo. E olha que não estamos falando (somente) da crise. Claro, a recessão que teve início em 2016 acelerou as mudanças na forma com que o país regula as relações de trabalho, de capitais e, mais recentemente, as de previdência. E muito das decisões tomadas recentemente estão influenciando, para o bem ou não, na tentativa de se retomar o consumo, e de fazer com que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro volte a crescer consistentemente.
A grande questão é que algumas regras foram mudadas durante a crise, e a expectativa daqueles que atuam (e também os que torcem) pela recuperação, ainda segue o padrão com as regras antigas. Vejamos o caso de duas reportagens publicadas nesta edição, ambas na editoria de Economia. A Boa Vista SCPC, empresa que concentra grande parte dos registros de proteção ao crédito do Brasil, informou ao Correio do Estado que o índice de recuperação de crédito está em queda, assim como a inadimplência. A causa do primeiro, conforme será detalhado adiante, é que os endividados tem enfrentado dificuldades para pagar seus compromissos, e o motivo do segundo, é o reflexo da outra: quem não tem dívida, está pensando duas vezes antes de consumir - sobretudo à prazo - e ficar endividado novamente.
A segunda reportagem, mostra que tem aumentado a demanda de trabalhos executados por hora ou por dia, o que na nova legislação trabalhista é chamado de contrato de trabalho intermitente. Em um universo de grande desemprego, ainda que a remuneração desta modalidade de trabalho possa não alcançar a mesma do trabalho fixo, ela é importante porque trata-se de uma ocupação.
A mais recente das mudanças, que ainda precisa ser aprovada pelo Senado para ser promulgada, é a Proposta de Emenda Constitucional da Reforma da Previdência. Ela acompanha este mesmo dinamismo que passou a vigorar com a alteração em outras estruturas legislativas, e em sua essência, alivia a carga do governo sobre o pagamento de alguns benefícios sociais, e por outro, abre espaço para se repensar muitas contribuições previdenciárias que oneram a folha de pagamento dos trabalhos formais.
Por isso, com um compartilhamento maior dos riscos das atividades econômicas entre todos os setores e relações menos duradouras e perenes, como no trabalho intermitente, é natural que, aos poucos, o padrão de consumo no Brasil fique similar ao de outros países, como alguns europeus, Estados Unidos e México, por exemplo. Por lá, muitos trabalham por dia, por hora ou por ano, e costumam consumir - sobretudo no pequeno varejo - à vista, e não por meio de crediário ou compras parceladas. O termômetro do SCPC certamente, está captando esta mudança por aqui.