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OPINIÃO

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Carlos Lopes dos Santos:
"Desejo de não matar"

Advogado

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Parece que pela celeuma e alarde que estão sendo dados no País, o decreto presidencial de autoria de Jair Bolsonaro, que dispõe sobre a posse de armas de fogo à população, deu largada a uma grande corrida armamentista no Brasil. No velho oeste americano, era a corrida pela febre do ouro e aqui, agora, a corrida para comprar armas. Claro que isso é uma grande firula, pois não existe nenhuma epidemia na busca pelas armas de fogo, com o advento do decreto governamental. O povo não saiu como louco às ruas correndo para comprar armas.

O decreto é uma promessa de campanha cumprida e nem por isso se tornou como uma varinha mágica, em que todos, de repente, estão autorizados a ter arma e sair por aí, mandando balas a torto e a direito em quem quer que seja. Os defensores da proibição, em que pese, todas as argumentações corretas quanto ao uso e posse de arma de fogo, exageram e, com isso, vulnerabilizam suas teses, quando insistem que a arma de fogo serve somente para matar, nada mais. Isso não é inteiramente verídico. A arma serve para matar, é evidente. E mata, se for bem ou mal utilizada. Nesse intervalo, entre o bem e o mal, pode haver uma grande diferença, que é a utilização da arma de fogo para salvar uma vida, duas vidas ou mais vidas. Nesse caso, é claro, quando bem utilizada. Entretanto, vidas podem ser salvas por uma arma, até quando não for utilizada, e os – muitos – exemplos de pessoas, que ao se depararem com bandidos dentro de seu quintal e apenas por gritarem de dentro de casa que tinham uma arma, os meliantes embrenharam fuga imediata. Às vezes, acontecem situações diferentes e, em muitos casos, raros, os criminosos, em vez de fugirem, podem encarar o enfrentamento. Nesses casos, somente a força policial pode resolver a situação ou, dependendo da perícia do morador, ele mesmo dá cabo da situação agindo em sua legítima defesa.

A grande questão que pesa realmente em momentos assim, de muita tensão e violência, é o fato de que o agressor que invade seu domicílio nunca o faz sem portar uma arma e, sabedor que o residente não pode ter uma, legalmente, se sente bem mais à vontade para cometer o crime. A partir do momento em que se permite ao cidadão de bem ter posse de, pelo menos, uma arma de fogo em sua casa, uma nova situação se sobrepõe às evidências. Se eu sou um bandido e sei que posso ser recebido a balas quando invado uma residência, obviamente, vou repensar sobre o assunto. Não me reporto às pessoas drogadas, que não medem consequências em seus atos criminosos, contudo, esses, em sua maioria, se contentam apenas com um reles botijão de gás e/ou coisas ínfimas, quando cometem seus crimes, visando sustentar o maldito vício e aí a situação é de extrema exceção e pesar, se a morte lhes afrontar após uma invasão criminosa de um domicílio qualquer.

A arma não foi feita só para matar. A arma foi desenvolvida, primeiramente, no período paleolítico, para auxiliar na caça e autodefesa. O ser humano não vive sem a arma, que pode ser desde o seu guarda-chuvas até a mais letal das armas de fogos que existem nos tempos modernos. O desenvolvimento, o aperfeiçoamento das armas e seu poder de destruição são itens plenamente discutíveis, inclusive quanto a sua utilização e benefício que, porventura, possa trazer ou não à humanidade.

Para ter a posse de uma arma de fogo, conforme o decreto governamental, é preciso, entre outras coisas, aptidão psicológica, emprego lícito, residência fixa, prática de tiro, bons antecedentes criminais, idade mínima de 25 anos, além de comprovar a necessidade, conforme o caso. Isso não é pouco. Quem tiver uma arma autorizada vai ter toda responsabilidade por ela em seus ombros. Além de tudo, ainda existe o preço para a aquisição da arma. Arma de fogo, assim como uma faca, como um bastão de beisebol, uma corda, um canivete, uma garrafa quebrada, pode matar. O problema não é a arma. É a cultura, a educação de um povo, sua ignorância e estupidez que matam. Muitas vezes, até sem arma o ser humano mata.

Então, armas pra te quero? Somente para ser mais um instrumento para me defender. Não desejo matar.