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Antônio Carlos Siufi Hindo: "A liturgia do cargo"

Promotor de Justiça aposentado

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Ações comedidas, palavras ponderadas, gestos generosos e atos que congraçam as pessoas são circunstâncias peculiares que norteiam as ações dos titulares dos cargos públicos. Essa festejada liturgia precisa ser um indicativo precioso do servidor público. Mas não precisa estar obrigatoriamente na administração pública. Na iniciativa privada, essa liturgia tem também o seu lugar. Seus indicativos surgem na forma simples de trabalhar dos senhores empresários. Seus gestos, seus atos e suas ações discretas despertam a confiança dos seus empregados. Empurram a empresa para uma concorrência leal. Fomentam o nosso desenvolvimento. Todos ganham com essa ação. 

Na área pública, tem uma preciosidade maior em razão do seu alcance. As ações dos seus titulares têm reflexos diretos em todo o território nacional. Alcançam o conjunto da população. Nesse diapasão, cresce de importância as formas sempre comedidas e simples de se expressar. As palavras, quando surgidas no calor de um enfoque, não podem ser instrumentos para humilhar, desrespeitar, afrontar consciências. Precisam ser discretas. Existem outras formas inteligentes de sustentar as opiniões. Exteriorizadas de forma impensada e provocativa, não contribuem em nada para legitimar o exercício e a força da autoridade. 

A função pública exemplar não se coaduna com esses rompantes. Londres Machado, político de larga experiência, sempre sustentou que nem tudo o que o político pensa no seu íntimo pode ser traduzido em palavras. Precisa ter o cuidado de guardá-la consigo, sentenciava. Esse é um exemplo digno de registro. Uma receita preciosa para os detentores de cargos públicos. Não tem nenhum cunho de advertência. Apenas a experiência conquista nas batalhas políticas. Mas esses políticos não são culpados pelas suas ações. São vítimas de uma caminhada histórica de tropeços. A história não mente. Está tudo registrado nos seus anais. 

O período colonial foi de absoluta exploração das nossas riquezas. O Império seguiu a mesma marcha. Pedro I fechou a Assembleia Nacional Constituinte pela força e implantou o regime despótico. Pedro II subiu criança ao trono. O objetivo principal era evitar a fúria de liberais e conservadores. Deodoro, que proclamou a República, renunciou o mandato e abriu espaço precioso para as disputas ensandecidas pelo poder central que se arrastaram até o epílogo triste e dramático da Velha República. A República Nova nasceu doente. A tirania de Vargas foi o seu retrato. A Nova República segue o mesmo destino. O calvário de Tancredo Neves foi o prenúncio do seu desastre. Sua sequência dispensa comentários. Somos suas testemunhas presenciais. 

Nesse quadro inóspito, fica difícil ajustar o perfil dos nossos dirigentes à liturgia do cargo que ocupam. Seria exigir o que não tem o devido preparo para oferecer. O que não será cumprido. Questões insignificantes envenenam as ações de governo. O brasileiro não quer retrocesso. Suplica pelas soluções dos problemas do nosso dia a dia. Donald Trump ofereceu o desejo de estabelecer uma parceria comercial com o nosso País. Algo importante para o nosso desenvolvimento. Noticia alvissareira para um punhado de desempregados. Esse é um tema precioso. Discussões estéreis não resolvem nada. Não queremos transformar o nosso sagrado território legado pelos nossos heróis; pelos nossos desbravadores; pelos nossos educadores; pelos nossos homens de letras; pelos nossos artistas; enfim, pelo labor do nosso povo em uma vergonhosa rinha de galo. Espetáculo nojento. 

As torcidas com as suas cores, torcendo de forma ensandecida pelo sangue dos animais na arena. A vitória das ideologias, dos princípios morais, éticos e democráticos não precisam ser retratados nesse episódio de desamor. É a luta implacável pelo poder. Mas isso tudo não lhes bastam. Fazem aflorar os vitupérios. Saltam as ofensas. Surgem os insultos. Levam a nação à beira de uma revolução sangrenta. Esse retrato não guarda nenhuma consonância com a nossa grandeza territorial, com o nosso precioso parque industrial, as nossas reservas petrolíferas, as nossas matas preservadas, a condição de celeiro do mundo. Esses são os temas para os grandes debates, aliados às reformas imprescindíveis para o nosso desenvolvimento integrado. O resto é estupidez pura. Sintoma explícito de uma morbidade que pode ser diagnosticada e curada. A receita foi dada. Para o bom entendedor não há necessidade de mais linhas. 

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Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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