REQUIEN é um ritual católico, normalmente uma Missa, oferecido para o descanso da alma dos falecidos... ordinariamente também pode significar uma homenagem póstuma a alguém.
Corria o ano de 1962, ano de Copa, quando o Brasil sagrou-se bi campeão do mundo em gramados chilenos, sem Pelé, lesionado, e com Garrincha, endiabrado, entortando, com suas pernas tortas, quantos “Joões” lhe apareciam pela frente (“João”, no caso, era o apelido que Garrincha dava aos seus marcadores). Obcecado por esportes, em especial por futebol, eu economizava dinheiro para o ônibus, para as matinês, ou para o que fosse, para comprar a “Gazeta Esportiva” ou o “Jornal dos Esportes”, ali na banca do velho Passarelli, na Barão, ao lado do “Bar do Zé”. De posse do jornal, ainda pelas ruas, já ia devorando as notícias e as reportagens.
Hércules ARCE FILHO, então colega de turma no Colégio Estadual Campograndense (hoje Maria Constança de Barros Machado), na época também locutor na Rádio Cultura, percebendo a minha “vocação”, levou-me até o Nassura (Nasrala Siufi), diretor da emissora, que me integrou na Equipe de Esportes.
Em 1963, ano em que o Asas EC, time da Base Aérea, com Atanásio; Galvão, Pedro Cesar, Miraglia e Almeida (Jacaré): Ico e Edson Cuiabano: Zé Leite, Pafúncio, Gabriel e Décio (ou Menezes), sob a batuta do Técnico Sgtº Martins, sagrou-se, no velho e saudoso Belmar Fidalgo de arquibancadas de madeira, campeão da Cidade, vencendo o Campeonato da LEMC (Liga Esportiva Municipal Campograndense), naquela época presidida pelo inesquecível Juiz de Paz da Cidade, o sempre solícito e bem-humorado Nagib Ourives, convivi com Mário Mendonça e Sabino Preza (a dupla da Rádio Educação Rural) e (na Rádio Cultura) com Leite Neto, Kamyia Jr, Caiado Neto, Ramão Achucarro, Carlos Achucarro (Juca Ganso) e Onésimo Filho, todos já no “andar de cima”, naquela que foi, sem nenhuma dúvida, a maior plêiade de repórteres, locutores e comentaristas esportivos que esta Cidade Morena já viu e ouviu. Nosso comentarista era RIBEIRO JR.
Ribeiro Jr. (nome artístico), o Penúltimo dos Mohicanos, ou dos Samurais, ou dos Dinossauros, nos deixou recentemente. Seu nome real: RUI FERREIRA. Relojoeiro, ourives e gravador, trabalhava na antiga Relojoaria Korndorffer, de onde saiu para abrir sua própria loja e oficina, a “RJ Jóias”, na Barão do Rio Branco, logo abaixo da 14 de Julho. Mão firme, caligrafia bonita, era responsável pela gravação de todas as frases em troféus, placas comemorativas ou de homenagens em Campo Grande e no Estado (então, o uno Mato Grosso).
Em geral, as peças já saíam direto das lojas, normalmente da “Avelino dos Reis”, para a oficina do Rui. Quando me casei (ele foi meu padrinho) ele confeccionou minhas alianças e ainda trago no dedo, com orgulho e saudade dele, a minha com a inscrição “Jane 15-07-68” que ele gravou. Quando de passagem por Poxoréu, zona de garimpo, em minhas andanças bancárias, adquiri duas dezenas de diamantes brutos, que ele, Joalheiro talentoso e criativo, lapidou e montou em uma aliança de brilhantes que minha mulher usa, sem nenhum constrangimento, em qualquer salão de eventos.
Como comentarista de futebol, ele era único. Não possuía um linguajar rebuscado nem proferia expressões ou frases de efeito, mas era sintético e objetivo em suas observações e direto em seu pronunciamento, nunca fazendo alusão pessoal ao indivíduo na ação, mas, sim, ao ator que estava ali representando o jogador, o técnico, o dirigente ou quem quer que fosse. Tinha devoção absoluta por um torneio de futebol peculiar, de sua criação, que visava dar visibilidade a futuros atletas, o “Torneio Metro e Meio”. Era colocada uma pequena trave, com 1,50 metro de altura, e o candidato tinha de passar ereto sob o travessão, sem tocar nele. Quem passava, independentemente da idade (aí o detalhe), podia participar dos jogos. Era uma festa para os nanicos.
Sinto-me um órfão em relação àquele grupo, e só não me acho sozinho porque o pessoal da técnica, o José Carlos de Carvalho , o Pereira Jr. (Epaminondas) e o Amilton Ferreira, desfalcados do Luiz Landes Reinoso de Farias, ainda está por aí. Mas me preocupa quem fará o requien para o Último dos Mohicanos. Talvez o Barsanulfo Pereira (Eurípedes), com quem eu paguei a dívida contraída com o Arce Filho.