Artigos e Opinião

OPINIÃO

A+ A-

Antonio Alcione Ferreira Gonçalves: "Requien para o penúltimo dos mohicanos"

Economista, administrador, matemático, rotariano e professor de Português

Redação

16/09/2017 - 01h00
Continue lendo...

REQUIEN é um ritual católico, normalmente uma Missa, oferecido para o descanso da alma dos falecidos... ordinariamente também pode significar uma homenagem póstuma a alguém.

Corria o ano de 1962, ano de Copa, quando o Brasil sagrou-se bi campeão do mundo em gramados chilenos, sem Pelé, lesionado, e com Garrincha, endiabrado, entortando, com suas pernas tortas, quantos “Joões” lhe apareciam pela frente (“João”, no caso, era o apelido que Garrincha dava aos seus marcadores). Obcecado por esportes, em especial por futebol, eu economizava dinheiro para o ônibus, para as matinês, ou para o que fosse, para comprar a “Gazeta Esportiva” ou o “Jornal dos Esportes”, ali na banca do velho Passarelli, na Barão, ao lado do “Bar do Zé”. De posse do jornal, ainda pelas ruas, já ia devorando as notícias e as reportagens.

Hércules ARCE FILHO, então colega de turma no Colégio Estadual Campograndense (hoje Maria Constança de Barros Machado), na época também locutor na Rádio Cultura, percebendo a minha “vocação”, levou-me até o Nassura (Nasrala Siufi), diretor da emissora, que me integrou na Equipe de Esportes.

Em 1963, ano em que o Asas EC, time da Base Aérea, com Atanásio; Galvão, Pedro Cesar, Miraglia e Almeida (Jacaré): Ico e Edson Cuiabano: Zé Leite, Pafúncio, Gabriel e Décio (ou Menezes), sob a batuta do Técnico Sgtº Martins, sagrou-se, no velho e saudoso Belmar Fidalgo de arquibancadas de madeira, campeão da Cidade, vencendo o Campeonato da LEMC (Liga Esportiva Municipal Campograndense), naquela época presidida pelo inesquecível Juiz de Paz da Cidade, o sempre solícito e bem-humorado Nagib Ourives, convivi com Mário Mendonça e Sabino Preza (a dupla da Rádio Educação Rural) e (na Rádio Cultura) com Leite Neto, Kamyia Jr, Caiado Neto, Ramão Achucarro, Carlos Achucarro (Juca Ganso) e Onésimo Filho, todos já no “andar de cima”, naquela que foi, sem nenhuma dúvida, a maior plêiade de repórteres, locutores e comentaristas esportivos que esta Cidade Morena já viu e ouviu. Nosso comentarista era RIBEIRO JR.

Ribeiro Jr. (nome artístico), o Penúltimo dos Mohicanos, ou dos Samurais, ou dos Dinossauros, nos deixou recentemente. Seu nome real: RUI FERREIRA. Relojoeiro, ourives e gravador, trabalhava na antiga Relojoaria Korndorffer, de onde saiu para abrir sua própria loja e oficina, a “RJ Jóias”, na Barão do Rio Branco, logo abaixo da 14 de Julho. Mão firme, caligrafia bonita, era responsável pela gravação de todas as frases em troféus, placas comemorativas ou de homenagens em Campo Grande e no Estado (então, o uno Mato Grosso). 

Em geral, as peças já saíam direto das lojas, normalmente da “Avelino dos Reis”, para a oficina do Rui. Quando me casei (ele foi meu padrinho) ele confeccionou minhas alianças e ainda trago no dedo, com orgulho e saudade dele, a minha com a inscrição “Jane 15-07-68” que ele gravou. Quando de passagem por Poxoréu, zona de garimpo, em minhas andanças bancárias, adquiri duas dezenas de diamantes brutos, que ele, Joalheiro talentoso e criativo, lapidou e montou em uma aliança de brilhantes que minha mulher usa, sem nenhum constrangimento, em qualquer salão de eventos.

Como comentarista de futebol, ele era único. Não possuía um linguajar rebuscado nem proferia expressões ou frases de efeito, mas era sintético e objetivo em suas observações e direto em seu pronunciamento, nunca fazendo alusão pessoal ao indivíduo na ação, mas, sim, ao ator que estava ali representando o jogador, o técnico, o dirigente ou quem quer que fosse. Tinha devoção absoluta por um torneio de futebol peculiar, de sua criação, que visava dar visibilidade a futuros atletas, o “Torneio Metro e Meio”. Era colocada uma pequena trave, com 1,50 metro de altura, e o candidato tinha de passar ereto sob o travessão, sem tocar nele. Quem passava, independentemente da idade (aí o detalhe), podia participar dos jogos. Era uma festa para os nanicos.

Sinto-me um órfão em relação àquele grupo, e só não me acho sozinho porque o pessoal da técnica, o José Carlos de Carvalho , o Pereira Jr. (Epaminondas) e o Amilton Ferreira, desfalcados do Luiz Landes Reinoso de Farias, ainda está por aí. Mas me preocupa quem fará o requien para o Último dos Mohicanos. Talvez o Barsanulfo Pereira (Eurípedes), com quem eu paguei a dívida contraída com o Arce Filho.

ARTIGO

Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

Continue Lendo...

O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

Assine o Correio do Estado

ARTIGO

Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

Continue Lendo...

Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

ASSINE O CORREIO DO ESTADO 

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).