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Ãngela Maria Costa: "Espaço democrático? Nem tanto"

Professora e doutora da UFMS

Redação

10/10/2019 - 01h00
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O Conselho Tutelar foi criado no dia 13/07/1990, como resultado da Lei 8.069, que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, integrado ao Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGD), composto por cinco membros eleitos pela comunidade para um mandato de 4 anos. É um órgão público municipal que tem como missão representar a sociedade na proteção e na garantia dos direitos de crianças e adolescentes, contra qualquer ação ou omissão do Estado ou dos responsáveis legais que resulte na violação ou ameaça de violação dos direitos estabelecidos pelo ECA.

É um órgão autônomo - não recebe interferência da prefeitura, do poder legislativo municipal, do sistema judiciário ou do ministério público.

No primeiro domingo do mês de outubro - 06/10/2019 aconteceu, em todo país, a eleição unificada para Conselheiros Tutelares, (Lei Federal nº 12.696/12), por meio de votação popular, com voto facultativo. Em Campo Grande, os organizadores se prepararam para atender o dobro do número de eleitores de 2015, em que menos de 1% da população (sete mil pessoas) participou. Isto é, atender até 15 mil votantes já que a campanha tinha sido mais disputada. No entanto, surpreendentemente, o número de eleitores foi de mais de 30 mil pessoas nas 60 escolas cadastradas. Esse aumento foi motivado pela disputa ideológica que permeou a campanha eleitoral, com representantes de igrejas católicas e evangélicas, e de postulantes progressistas. Esse fato comprova a tese de que “Participação é disputa de espaço de poder. Não se ocupa espaço de poder, sem tirá-lo de algum outro poder. O pleito foi marcado por confusão, erros nos locais de votação, falta de cédulas, urnas de lona insuficientes, filas enormes e demora na votação. A organização e a condução desse processo eleitoral é de responsabilidade dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações relacionadas à criança e ao adolescente, formados paritariamente por representantes da sociedade civil e do Poder Público municipal.

Na tentativa de corrigir erros do passado e garantir que o pleito eleitoral transcorresse dentro das regras do estado democrático de direito, a Comissão de Promotores da Infância e Juventude, enviou. Em 28/11/2018, expediente à Comissão da Infância e Juventude do Conselho Nacional do Ministério Público requerendo a sua interlocução junto ao Tribunal Superior Eleitoral – TSE, solicitando “maior atenção e efetivo auxílio na realização do pleito, disponibilizando as urnas eletrônicas e cadernos de votação, além de suporte técnico”, de modo a coibir a prática de atos abusivos, assegurar a igualdade de participação de todos os pretendentes ao cargo, e evitar situações de fraude ou desequilíbrio no dia das eleições. O que mais uma vez não ocorreu!

O que se conclui é que mesmo após 29 anos da criação dos Conselhos Tutelares, não temos uma participação mais efetiva da Justiça eleitoral, na definição de parâmetros de atuação para todos os Tribunais Regionais Eleitorais do País, disponibilizando: cadernos de eleitores cadastrados junto à Justiça eleitoral; urnas eletrônicas já programadas, de acordo com as necessidades de cada município; disponibilidade de técnicos para acompanharem as urnas eletrônicas, normatização das condutas a serem adotadas. Assim sendo, o que se viu foi o descaso da Justiça Eleitoral – TSE/ TRE, que mais uma vez, não reconheceu esse espaço democrático e o alcance dessa política de atendimento à criança e ao adolescente, que é amparada pelo princípio constitucional da “prioridade absoluta” (art. 227, da CF/88).

Necessário que depois de sanados todos os problemas dessa eleição, possamos avançar e refletir sobre outros aspectos, tais como: o aumento do número de Conselhos Tutelares em Campo Grande, pois na Redação alterada pela Lei nº 12.696, de 25/07/2012, em seu art. 3º, §1º, da Resolução nº 139/2011, do CONANDA, recomenda-se no mínimo 01 (um) Conselho Tutelar para cada grupo de 100.000 (cem mil) habitantes no município (Campo Grande tem apenas a metade, cinco); os recursos básicos para a estruturação destes órgãos que geralmente enfrentam no seu cotidiano a falta de carros, de gasolina e de computadores.

Temos sim, o DIREITO DE PARTICIPAR, mas principalmente de não ser usados para referendar uma determina legislação. Faltou tudo! Principalmente  de seriedade nesse processo, dito democrático. A pergunta é: Qual é na verdade o tamanho desse espaço democrático?! Estamos brincando de democracia! Atraso.

ARTIGO

Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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ARTIGO

Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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