Flávio Paes
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou a suspensão da quitação de parcelas remanescentes de um precatório milionário de R$ 18 milhões que a Prefeitura de Campo Grande, desde agosto do ano passado, vinha pagando ao pecuarista Jamil Name com base num acordo fechado no dia 14 de julho. Três dias depois de o vice-presidente do Tribunal de Justiça, Paulo Alfeu Puccinelli, determinar o pagamento de R$ 25 milhões a Jamil, embora houvesse 74 credores há mais tempo na fila de espera.
Além de suspender o pagamento do precatório, em sua reunião da última terça-feira, o CNJ determinou que o Tribunal de Justiça instaure processo administrativo para averiguar eventual infração disciplinar cometida pelo vice-presidente do TJ, Paulo Alfeu Puccinelli
Nesta mesma reunião, o CNJ, por unanimidade, manteve a liminar do relator Gilson Dipp, que suspendeu o pagamento no dia 14 de abril, véspera da data em que venceria o prazo para o pagamento da 9ª parcela.
Até agora o município já pagou oito parcelas no valor total de R$ 11 milhões. Há um saldo de R$ 6,9 milhões referente a cinco parcelas de R$ 1,3 milhão. Jamil transferiu o crédito para o empresário Jorge Haddad, depois de receber a segunda. Esta operação também foi autorizada pelo desembargador Puccinelli. O acordo de cessão de crédito, na opinião do advogado Marcelo Barbosa Martins, embora legal, descaracterizou o argumento apresentado e que serviu de base para a decisão do magistrado de antecipar o pagamento em favor de Jamil: razões humanitárias, já que o pecuarista precisaria de recursos para tratamento de saúde fora do País. “Parece-me que ficou evidente tratar-se de uma negociação entre empresários”, observa.
O desembargador determinou o pagamento do precatório no valor de R$ 25 milhões, numa sexta-feira à noite, dia 10 de julho. Ele aceitou os argumentos do advogado do pecuarista, que, com base em laudos médicos, pediu antecipação do pagamento alegando que enfrentava problemas de saúde e precisava de R$ 8 milhões para um tratamento nos Estados Unidos.
Na segunda-feira, três dias depois da decisão do desembargador, a prefeitura fechou acordo em que o pecuarista concordou não só reduzir em 30% seu crédito, mas recebê-lo em 18 parcelas de R$ 1,3 milhão.
O prefeito Nelsinho Trad alegou que aceitou o entendimento para escapar do risco de a Justiça bloquear os R$ 25 milhões das contas do município. O acordo foi fechado antes mesmo de o TJ analisar o recurso que a Procuradoria Jurídica impetrou ainda no sábado.
Decisão
A decisão do CNJ de suspender o pagamento do precatório foi tomada a partir de denúncia encaminhada pelo advogado Erlio Fretis, que anexou a cópia do artigo do advogado Marcelo Barbosa Martins, publicado no Correio do Estado, em que critica a decisão do desembargador e o acordo firmado pela prefeitura. Antes disso, Marcelo pediu, sem sucesso, providências do Ministério Público e do próprio Tribunal.
Os conselheiros do CNJ seguiram o posicionamento do relator, ministro Gilson Dipp, que, no último dia 15 de abril, determinou liminarmente a suspensão imediata dos pagamentos.
No entendimento do conselheiro e corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp, a quebra da ordem cronológica no pagamento do precatório, a expressividade dos valores e o fato de a dívida executável ter sido transformada em acordo de parcelamento para depósitos diretos ao credor, “à margem do regime constitucional do precatório”, justificam a apuração de eventual infração disciplinar por parte do desembargador Paulo Alfeu Puccinelli, vice-presidente do TJMS.
Ao acompanhar o voto do relator, o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, reforçou a necessidade de o Conselho sempre garantir o direito de ampla defesa pelas partes. “A presunção de inocência é um princípio constitucional”, destacou.