Sílvio Andrade, Corumbá
Ameaçada em outras regiões do país e na Europa, a onça-pintada (Panthera onça), um dos maiores predadores do mundo, aumentou consideravelmente sua população no Pantanal, na última década. Não é possível determinar números, segundo o pesquisador Peter Crawshaw, que atua há mais de 30 anos na área para o Ibama, Embrapa e ONGs ambientais, contudo registros comprovam a recuperação da espécie.
Crawshaw, considerado um dos maiores especialistas em felino, iniciou seus estudos no Pantanal em 1977 e aponta que o crescimento populacional se deve não apenas à Lei de Proteção à Fauna e à proibição do comércio internacional de peles, mas às condições dinâmicas da planície, a partir da grande e catastrófica cheia de 1974. A inundação despovoou extensa área central do bioma, onde a onça tinha sido localmente extinta.
“Juntamente com uma pressão muito menor da caça, mesmo acidental ou de subsistência, as onças puderam se recuperar, predando principalmente jacarés e capivaras, cujas populações também aumentaram”, citou o pesquisador em recente artigo sobre o assunto. Mesmo assim, o animal figura na lista do Ibama e da União para Conservação da Natureza (IUNC, em inglês) como espécie vulnerável.
Para o pesquisador Walfrido Moraes Tomás, da Embrapa Pantanal, a região tornou-se um notório refúgio de espécies ameaçadas, como a arara azul, a ariranha, o cervo e a onça-pintada, considerados em perigo em uma vasta área de sua distribuição. “Populações vigorosas destas espécies sobrevivem no Pantanal. Este serviço ambiental, difícil de ser avaliado, só é possível pelo estado de conservação do Pantanal”, explicou.
Já foi pior
Apesar da importância da espécie no ambiente, existe uma carência de estudos e informações a respeito do felino, especialmente na área de ecologia populacional, que forma a base para a elaboração de qualquer estratégia de manejo e conservação. Para a bióloga Grasiela Porfírio, da ONG IHP (Instituto Homem Pantaneiro), onças-pintadas e pardas continuam sob ameaça de extinção na planície.
“Estudos devem continuar sendo feitos para se conhecer a ecologia desses felinos de grande porte, até para se saber exatamente se a população está crescendo ou reduzindo”, observou ela. A perspectiva de um possível crescimento populacional da onça se baseia em relatos de encontros com o grande predador por moradores e turistas, armadilhas fotográficas, fezes, visualizações e pegadas, explica Crawshaw.
“Em 1977, a situação era bem preocupante. Ficamos dois anos procurando um lugar onde houvesse animais que justificassem o estudo”, contou. A pesquisa, agora, foi retomada com financiamento da Fundação Boticário, e outros projetos estão sendo desenvolvidos nos pantanais de Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. A ecologia alimentar da onça-pintada rendeu tese de mestrado a Grasiela Porfírio, em 2009.
Ataque ao gado
Os maiores motivadores da morte de onças ainda são conflitos com fazendeiros e a busca por troféus típicos das Américas tropicais, grande parte por caçadores estrangeiros. “Muita gente sabe (da caça ilegal), mas nunca se pega ninguém”, comentou Leandro Silveira, presidente do Instituto Onça Pintada (IOP). No Pantanal, a convivência é mais pacífica, apesar dos prejuízos com ataques ao gado.
Isso foi comprovado na prática entre 2004 e 2006, quando o IOP desenvolveu um programa de compensação por gado abatido por onças a 13 fazendas. Cada boi abatido por onça era compensado com 150 dólares. Foi comprovado que as cabeças devoradas pelo felino não eram tantas quanto as relatadas pelos produtores. O resultado foi um gasto de dinheiro bem menor (20%) que o projetado.