Arcângela Mota, TV Press
Novelas costumam ditar moda. Seja em comportamento, vocabulário e, principalmente, em figurino. A cada produção que entra no ar, o visual dos personagens pode se transformar em uma atração à parte. Tanto que, todo mês, a Central de Atendimento ao Telespectador – CAT –, da Globo, recebe milhares de ligações de pessoas em busca de roupas, cosméticos e acessórios vistos em cena. E incluir um produto na lista dos mais procurados é ambição dos figurinistas, que passam meses no garimpo de itens que possam cair no gosto do público e virar tendências. “Sempre imagino o que pode virar moda antes de começar cada trabalho. Acho que é uma forma carinhosa de agradar ao telespectador. E acredito que já tenho um faro bem aguçado para isso”, afirma a figurinista Marília Carneiro, que trabalha na Globo desde 1973 e é a responsável pelo figurino de “Ti ti ti”, próxima novela das sete da emissora, que aborda, exatamente, o mundo da moda.
E a preocupação em emplacar modelos ou estilos começa junto com as pesquisas para compor os figurinos da trama. O diretor de figurino da Record, Cláudio Carpenter, conta que, antes de cada novela, faz questão de pesquisar as tendências que estão em maior evidência, de forma a criar o visual dos personagens em harmonia com elas. “Inevitavelmente algo sempre cai no gosto do público. Agora, com toda a facilidade proporcionada pela internet, chega a ser mais fácil prever algumas tendências”, considera o figurinista, destacando que muitas vezes o profissional tem de abrir mão do bom gosto em função de alguns personagens. “Você sempre tem de respeitar a criação do autor, fazendo algo condizente com o personagem. Às vezes tem de deixar o ego de lado e fazer algo mais cafona”, defende.
Para atrair os olhares dos telespectadores, as equipes de figurinistas costumam sair para garimpar cuidadosamente os produtos. E foi Marília Carneiro quem começou a fazer isso em 1973, quando passou a comprar peças prontas para a novela “Os ossos do Barão”, iniciativa que lhe rendeu na época o título de “sacoleira”. Tudo porque, até então, todo o figurino dos personagens era produzido pela Globo. Hoje em dia, a tática é usada por todos os figurinistas, que saem em busca de peças novas para se diferenciar em suas novelas. A equipe de “Passione”, por exemplo, – que atualmente lidera a lista da CAT com 16 entre os 30 produtos mais procurados – viajou por várias regiões do Brasil para trazer roupas e acessórios originais. “A gente faz uma novela atrás da outra e todo mundo acaba comprando nas mesmas lojas. Fica tudo com a mesma cara. Nós buscamos ver coisas novas, descobrir peças que ainda não chegaram à tevê”, explica Flávia Azevedo, integrante do núcleo de figurinistas de “Passione”.
O sucesso dos produtos nas novelas é tanto que muitos deles chegam a ser comercializados pela Globo Marcas, que oferece roupas, acessórios e objetos dos mais diversos tipos pela internet. Mas o figurinista Lessa de Lacerda, que trabalha há 30 anos na Globo e cuidou do visual de novelas como “Tieta”, “Vamp” e “Quatro por quatro”, afirma que o sucesso dos figurinos vale apenas como reconhecimento artístico. E ressalta que, com exceção dos casos de “merchandising”, o trabalho dos figurinistas é sempre independente do departamento comercial. “Não há cobrança para que os produtos sejam aceitos pelo telespectador, até porque eu não ganho nada quando isso acontece. Minha maior preocupação é vestir o personagem de acordo com o perfil dele. Mas é sempre bom ver seu trabalho reconhecido”, conta.
O interesse das empresas em ter sua marca nas novelas, por sua vez, acaba facilitando o trabalho dos figurinistas, que dispõem de uma oferta de produtos cada vez maior. “Não há mídia nenhuma que se compare a uma novela. A tevê tem uma amplitude que supera qualquer editorial de jornal ou revista”, analisa Sônia Soares, que fez sucesso na CAT com o visual da desbocada Copélia, de Arlete Salles, em “Toma lá, dá cá”. No entanto, em outras ocasiões, a repercussão da tevê tem um lado negativo, já que muitas empresas não querem ter sua imagem vinculada à alguns tipos de personagens. Foi o que aconteceu em “A lei e o crime” e “Bela, a feia”, ambas da Record, quando várias marcas não quiseram ser associadas a bandidos e a uma mulher feia. “Durante a pré-produção, sempre oferecemos parcerias para vestir os personagens. Nessas novelas foi mais difícil porque as empresas achavam que poderiam ofender os clientes”, explica Cláudio Carpenter.
Já em outras novelas, as empresas que têm suas marcas expostas em personagens dentro dos padrões de beleza comemoram o retorno financeiro. E a visibilidade proporcionada pela tevê não demora a fazer efeito nas lojas. Foi o que aconteceu com um colete de tricô roxo usado por Clara, personagem de Mariana Ximenes em “Passione”, que se tornou um dos itens mais procurados na Globo e rapidamente se esgotou nas vitrines da loja Anselmi. “Outros personagens já usaram nossas peças, mas na Mariana o retorno foi muito maior. Tivemos muita reposição na fábrica. Aparecer na novela funciona bastante”, vibra Kátia Boeni, integrante da equipe de criação da Anselmi.