O Rio Paraguai, que ontem
rompeu os três metros na régua
de Ladário, cidade vizinha
a Corumbá, transbordou
no distrito Porto da Manga,
Pantanal da Nhecolândia.
Suas águas invadiram os
campos, ao lado da Estrada
Parque, e ameaçam a comunidade
ribeirinha, formada
por cerca de 60 famílias de
pescadores. A cheia na região
será uma das maiores da década.
“Moro aqui há 15 anos e
nunca vi nada igual. Os campos
estão alagados, daqui
(Manga) até a Fundação Bradesco.
São pelo menos 100
quilômetros”, relata Delson
Xavier Castelo, 46, que gerencia
uma pousada na beira
do rio. “Se continuar subindo
assim vamos ficar isolados.
O problema não é só a água,
mas as pontes, que estão sem
manutenção e comprometidas.”
A esperada cheia na Manga,
distante 60 km de Corumbá,
terá reflexos não apenas
no volume de água do Paraguai,
por conta das chuvas
nas cabeceiras, em Mato Grosso.
A subida repentina dos
níveis dos rios Aquidauana e
Miranda, em dezembro e janeiro,
antecipou a inundação
dos campos na região, onde a
declividade é a mais baixa da
planície pantaneira.
A maioria das casas do distrito
é de palafitas, contudo
o isolamento dificulta a vida
dos moradores por falta de
acesso à cidade por terra. No
pico da cheia, que este ano deve
ocorrer entre abril e junho,
a balsa que faz a travessia no
Paraguai paralisa o serviço
com o tráfego interrompido.
Muitas famílias já se preparam
para antecipar a compra
de alimentos básicos.
Cheia, uma bênção
Da balsa atracada na margem
do rio, onde as águas já
cobriram o aterro de atracamento,
o pescador Ramão Arruda,
40, observa o Paraguai
avançando pelos campos.
Morador há 23 anos no lugar,
ele conviveu com a enchente
recorde no Pantanal, em
1987, e, apesar dos prejuízos
que as águas trazem para a
comunidade, ele se diz feliz.
“A cheia é uma bênção”, comenta.
Trabalhando durante a
piracema de diarista da balsa,
ganhando R$ 20, Ramão
conta que a cheia traz a fartura
do peixe nos rios. “A
gente está pegando jiripoca,
pintado e mandi aqui da margem,
coisa que não ocorria há
cinco anos”, atesta. “A cheia
se antecipou, mas não é só
porque está chovendo muito.
É por causa do desequilíbrio
na natureza.”
Da varanda de pousada
de Delson Castelo se tem
uma noção exata do volume
de água do Rio Paraguai. Segundo
ele, o que está acontecendo
na região foi motivado
também pela subida simultânea
dos níveis dos afluentes
Miranda, Aquidauana, Negro
e Abobral. “Até meados de janeiro,
o Abobral estava seco,
poderia atravessá-lo a pé. A
água chegou muito rápido”,
diz.
BR-262
As águas provenientes de
chuvas que caem em toda a
região pantaneira também
romperam corixos e vazantes
e atingiram pequenas propriedades
rurais às margens
da rodovia BR-262, trecho
entre Miranda e Corumbá
(próximo ao Rio Paraguai).
Famílias estão deixando
os ranchos em busca de locais
mais altos para levar cabeças
de gado que ficaram praticamente
presas em currais alagados.
Maioria das famílias que
vivem às margens da rodovia
262 é composta por isqueiros
e sobrevivem da pesca extrativista
e turística.
Mas grandes fazendeiros
da região já deram sinal de
alerta aos sindicatos rurais
de Corumbá e Miranda e vão
começar a retirar o gado nos
próximos dias.