Um jovem de 18 anos foi morto com quatro tiros no começo da noite de segunda-feira no Bairro Parque do Lageado, em Campo Grande. Ele tinha inúmeras passagens pela polícia e chegou a ficar internado numa Unidade de Internação. Mais recentemente, era acusado de participar de assaltos e fazia questão de evidenciar que participava de uma gangue na região, inclusive ostentando fotos na internet nas quais aparecia armado. Logo depois de seu assassinato, fogos de artifício foram ouvidos nas imediações. Moradores garantiram à polícia que eram em comemoração à morte do rapaz, que vivia em atrito com grupos do bairro vizinho e que também atormentava comerciantes. Se foram seus inimigos ou comerciantes que festejaram, não ficou claro. O fato é que até os policiais não disfarçaram certa satisfação ao saber que estavam com um problema a menos naquela região da cidade, pois até alguns deles já haviam sido alvo de disparos feitos pelo jovem.
Rojões para comemorar a morte de algum desafeto não são raridade em morros cariocas, principalmente naqueles dominados pelo narcotráfico e nos quais nem mesmo a polícia se atreve a subir. Em Campo Grande, porém, é a primeira vez que se tem notícias sobre algo semelhante. E, se até a polícia comemorou a morte, embora de forma contida, é sinal de que a situação em determinadas regiões da cidade não está muito distante daquela enfrentada pelas forças de segurança do Rio, por exemplo. Sabia-se que o rapaz havia participado de recente assalto numa fazenda, mas continuava solto. Isto, possivelmente, porque os policiais sabiam que correriam perigo caso tentassem prendê-lo, pois já havia dado provas daquilo que ele e seus comparsas eram capazes.
O foguetório que se seguiu ao assassinato pode até ser fato isolado. A morte de um jovem, porém, certamente não o é. Este rapaz somente engrossa as estatísticas relativas aos homicídios envolvendo vítimas com até 19 anos. Segundo levantamento do Instituto Zangari, que utilizou dados do Departamento de Estatísticas do Sistema Único de Saúde (Datasus), o mais confiável do País, revela que Mato Grosso do Sul é o sétimo colocado no ranking nacional da violência contra crianças e adolescentes. Em 1997, 98 jovens foram assassinados no Estado. Dez anos depois, este número havia aumentado 31,3%, saltando para 129. Quase a metade, 57, destes crimes aconteceu em Campo Grande, onde também verificou-se aumento superior a 30% no número de casos em uma década.
Quer dizer, embora pareça um certo despropósito comparar a situação de certos bairros de Campo Grande com a de morros cariocas, a situação não é tão distante assim. Em Mato Grosso do Sul, são 15,2 assassinatos de jovens para cada grupo de cem mil habitantes. No Rio de Janeiro, são 21,2 .
É evidente que o combate a esta situação não cabe exclusivamente à polícia. Melhor, ela é a última que deveria ser acionada. As escolas públicas, que deveriam ser as primeiras a acolher determinados “garotos-problema” são as primeiras a falhar, pois são superlotadas e não dispõem de gente capacitada para dar a devida atenção aos milhares que carecem de cuidado redobrado. Centros especializados para tratamento de dependentes químicos, então, nem pensar. Conselheiros tutelares em número adequado para o tamanho de uma cidade como Campo Grande, só a promessa. Uneis equipadas, com profissionais e equipamentos, para “recuperar” certos adolescentes, só no sonho dos mais otimistas. Por estas e outras, não chega a ser surpresa ver o Estado figurando no topo do ranking da violência juvenil e por isso também autoridade alguma tem condições morais de recriminar algum comerciante (se é que foi algum deles) que tenha soltado rojões ao saber que o bairro estava com um “problema” a menos.