Ela também é loura e tem olhos claros. Mas, na sua avaliação, param aí as semelhanças com a estrela de Hollywood e ex-princesa de Mônaco Grace Kelly (1929-1982). A razão da comparação é que, por causa de Grace Kelly, a senadora paranaense se chama Gleisi. Seu pai queria fazer uma homenagem à mãe de Albert, Caroline e Stephanie, mas achava que o nome dela era grafado com "l", e não com "r". Daí, Gleisi, e não Grace. A mulher do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, porém, rejeita semelhanças e pompas de princesa. Gleisi foi a primeira mulher em 30 anos a exercer uma diretoria em Itaipu, a poderosa empresa binacional do setor elétrico. E é também a primeira mulher a eleger-se para um mandato no Senado pelo Paraná. É com esse espírito pioneiro que essa paranaense de 46 anos dispõe-se a trabalhar no Congresso.
“Graças a Deus, as mulheres estão mudando muito, estão mostrando o seu valor. Acho que temos de mostrar o que viemos fazer aqui, que é trabalhar bastante e mostrar resultado”, enfatiza a senadora petista. Especialista em orçamento, Gleisi foi chefe de gabinete de Paulo Bernardo antes de os dois se casarem. Ali, montou uma das primeiras estruturas de fiscalização no Congresso das contas do governo através do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi). Foi essa experiência de Gleisi com a análise das contas públicas que levou o ex-presidente Lula a convidá-la, em 2003, para exercer a Diretoria Executiva Financeira de Itaipu.
Para Gleisi, a Hidrelétrica de Itaipu é um empreendimento “maravilhoso”. E é por conta da experiência na hidrelétrica que ela defende um ponto que gera polêmica: a revisão do tratado de Itaipu para conferir vantagens ao parceiro brasileiro, o Paraguai. Para ela, o Brasil, com um Produto Interno Bruto (PIB) muito maior do que o Paraguai, deve ajudar o país vizinho com “sensibilidade”.
“Eu defendo ardorosamente a aprovação das notas reversais [mecanismo que, com cálculo alterado em eventual aprovação no Congresso, triplicará os valores recebidos pelo Paraguai referentes à energia de Itaipu] pelo Congresso Nacional. Temos quase 300 mil brasileiros que plantam naquele país e criam suas famílias lá. Então, nós temos muita responsabilidade de ajudar o país a dar certo, porque uma parcela expressiva do povo brasileiro também vai dar certo”, disse a senadora, lembrando que o tratado, assinado em 1973, precisava de uma readequação.
“Temos de lembrar que o Paraguai fica privado de vender sua energia para outros países até 2023. Então, é ser algoz demais fazer um tratado em que um país é obrigado a comprar a nossa energia até 2023 pelo preço que nós queremos, sem poder negociar com outros países. Acho que é de bom tom a gente ter um pouco de sensibilidade”, acrescentou, rebatendo as críticas de que os contribuintes brasileiros acabariam pagando o preço. Ela diz que o valor renegociado é tão “residual” para o Brasil que não reflete nas contas ao consumidor, enquanto que no país vizinho, com PIB muito menor, o “impacto significativo” permitiria investimentos diversos.
Gleisi iniciou a trajetória no movimento estudantil, em Curitiba. No currículo, reúne funções como ex-presidente do PT paranaense, secretária extraordinária de Reestruturação Administrativa (Mato Grosso do Sul, 1999) e secretária de Gestão Pública da Prefeitura de Londrina (2001). Participou também da equipe de transição para o primeiro mandato do presidente Lula, quando conheceu a presidenta Dilma Rousseff – vista por ela como “uma das profissionais mais competentes na área de gestão”. “Eu dizia isso durante a campanha [em 2010]. Muitas pessoas não acreditavam, achavam que ela era apenas uma criação do presidente Lula, e que não ia ter força nem condições de fazer um bom governo. Ela está surpreendendo muito bem todo mundo – é firme, determinada, sabe aonde quer chegar. Conduz as coisas de maneira a ter resultados, mas também tem muita sensibilidade”, considera.
Especializada em Gestão de Organizações Públicas e Finanças Públicas, com cursos em entidades como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Gleisi defende também a postura da equipe econômica no recente corte de gastos em R$ 50 bilhões. “Eu vi como uma responsabilidade grande de governo. Depois de um ciclo expansionista que nós tivemos na economia, de grandes investimentos e de estímulo ao consumo, nós temos de, agora, ter um contra-ciclo. Porque nós temos uma inflação que foi estimulada, por conta de todos os investimentos feitos, e que foram necessários e corretos. Agora nós temos uma crise de outra ordem, e devemos ter mecanismos de outra ordem para enfrentar a crise”, avalia.
Com tom de voz baixo, e de maneira atenciosa, Gleisi falou por quase 20 minutos à reportagem. Ela acabava de deixar a sala da Presidência do Senado, onde se reuniu com José Sarney (PMDB-AP), depois de reuniões na Esplanada dos Ministérios. Acabada a entrevista e feitos os devidos cumprimentos, voltou-se para os servidores de seu gabinete e exclamou, em bem-humorada convocação: “Equipe econômica!”. Era uma esvaziada quinta-feira pré-carnavalesca no Senado, sem sessões deliberativas e número diminuto de senadores na Casa.