Decreto reconhece Banho de São João como patrimônio imaterial
21 JAN 10 - 05h:21SÍLVIO ANDRADE, CORUMBÁ
Festa única que cultua o
banho da imagem do santo
nas águas do Rio Paraguai, na
noite sempre fria do dia 23 de
junho, o São João de Corumbá,
trazido pelos árabes em 1882,
será reconhecido e perpetuado
como Patrimônio Imaterial
Histórico e Cultural de Mato
Grosso do Sul. O decreto será
assinado hoje pelo governador
André Puccinelli, em visita à
cidade. A iniciativa de tombar
uma das maiores manifestações
populares do Brasil foi
da Prefeitura de Corumbá,
cujo processo iniciou-se em
2007. Agora, o próximo passo
será obter esse reconhecimento
nacionalmente, por meio
do Iphan (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico
Nacional).
“O tombamento do Banho
de São João retrata a devoção
religiosa e a manifestação
cultural de mais de 100 anos
nas ladeiras e ruas de Corumbá.
Isso tem um significado
maior do que imaginamos, é
ter o Banho de São João como
elemento vivo da cultura”, disse
Carlos Porto, presidente da
Fundação de Cultura e Turismo
do Pantanal.
Resgatado pelos festeiros
e casas de rezas no final dos
anos 90, depois que a prefeitura
decidiu organizar a festa
sem respeitar sua tradição, o
São João pantaneiro cresceu,
cada vez mais reúne adeptos
e tornou-se um dos eventos de
forte apelo religioso e turístico,
atraindo milhares de pessoas
no porto da cidade. A festa
sempre ocorre entre os dias
20 e 24 de junho.
No ano passado, mesmo
com chuva, mais de 100 andores
desceram a Ladeira Cunha e
Cruz em procissão até o Rio Paraguai
para o ritual do banho,
que se reveste em um dos grandes
momentos de fé e crença.
Outro momento de emoção é
o içamento do mastro, no dia
23, que ocorre com o sapateado
e a cantoria dos cururueiros e
suas violas de cocho.
Promessa
Aos 88 anos de idade, dona
Albertina Cacilda Ferreira é
uma das festeiras mais antigas,
promovendo a festa há 60 anos
para cumprir uma promessa.
Ela conta que estava grávida e
começou a sentir dores do parto
no momento do foguetório
no porto, na noite do dia 23 de
junho. Colocou o nome do filho
de João e pediu proteção,
saúde e sabedoria ao santo.
“Enquanto eu estiver viva,
vou descer com o andor. São
João sempre me atendeu, dando
saúde para mim e estudo
para meus filhos e netos, diz
Albertina. Sua crença simboliza
o fervor do povo corumbaense
ao santo, no relato de
pedidos atendidos, geralmente
relacionados às doenças, e na
preparação da festa, enfeitando
as casas e realizando as novenas.
Sacro e profano
O ritmo carnavalesco que
sucede a ladainha, na descida
da imagem à beira do rio, não
foi muito bem compreendida
por um pároco, há algumas
décadas, que chegou a proibir
tal manifestação evocando os
princípios da Igreja. Mas, prevaleceria
o desejo popular de
festejar – com todo respeito e
devoção – a seu modo o São
João Pantaneiro.
A louvação tem dois momentos
marcantes. Ouve-se,
primeiro, a ladainha: “Deus te
salve João/Batista sagrado/O
teu nascimento/Nos tem alegrado”.
Logo, a banda imprime
um ritmo de frevo e o povo pula
de alegria, cantando: “Se São
João soubesse que hoje era o seu
dia/ Descia do céu à terra/Com
prazer e alegria”. O hino foi recolhido
pelo professor Valmir
Corrêa.