Como é de conhecimento geral, Lei publicada no Diário Oficial em 1º de julho último, de autoria do deputado estadual Marquinhos Trad (PMDB/MS), obriga revendedores de veículos a plantar uma árvore nativa por cada unidade vendida em Mato Grosso do Sul. De acordo com a proposta, as árvores deverão ser plantadas em áreas de preservação ambiental e a fiscalização deverá ser feita pelos órgãos ligados ao meio ambiente. A estimativa é de que, a partir de julho deste ano, mais de 14 mil árvores serão plantadas pelas concessionárias e revendedoras de veículos e maquinária motorizada no Estado, quer os veículos negociados sejam novos ou usados. O não cumprimento da Lei implica multa de duas mil Uferms, que corresponde a R$ 28 mil, e caso haja reincidência será aplicada em dobro. Os valores arrecadados serão revertidos ao Instituto do Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso do Sul (Imasul), para serem aplicados na preservação ambiental sul-mato-grossense (Vera Halfen/Correio do Estado,02/07/2010).
Embora a maioria dos que tomaram ciência da Lei elogie a iniciativa do parlamentar peemedebista, há aqueles que não acreditam na sua efetiva implantação. Roberto Gonçalves, diretor de Desenvolvimento do Imasul, por exemplo, diz que se trata de um projeto com boas intenções e que visa compensar a emissão de gás carbônico pelos veículos automotores, mas ele questiona:“O que é maquinário motorizado?” E quanto à inclusão do carro usado na Lei: “A concessionária já plantou uma árvore quando vendeu o veículo. Ao revender o usado, esse mesmo veículo que já gerou o plantio de uma árvore terá mais uma?” Ou ainda: “Que equivalência haveria entre um veículo flex,que polui menos, e um trator, por exemplo?” Ainda, segundo ele, “o Imasul fez várias sugestões de ajustes quando da avaliação do projeto, mas nada foi alterado”. E o deputado Márcio Fernandes (PTdoB), proprietário do grupo Enzo, questiona quem e de que forma será feita a fiscalização. Para ele, “seria bom, mas de difícil realização”. (Vera Halfen, idem acima).
Antes de discutir o mérito do projeto do deputado Marquinhos Trad, porém, vale dizer que a proposição dele não é de forma alguma original, mas reproduz em linhas gerais iniciativas similares de legislativos em diversos municípios brasileiros (virou moda!). Assim, em Barretos, interior de São Paulo,vigora, desde 09 de junho último, a Lei Municipal 4.342/10, que diz, entre outras coisas, que “para cada veículo novo vendido, a concessionária deve plantar uma árvore”. E em Natal, RN, desde 02/09/2009, as concessionárias têm que plantar uma árvore para cada dois carros vendidos (Lei 0289/2009). E na Câmara dos Deputados,em Brasília, circula o Projeto de Lei 2900/08, de autoria do deputado Manato (PDT-ES), que torna obrigatório o plantio de árvores e congêneres nos casos de divórcio (25 exemplares), casamento (10 unidades), construção de edifícios e compra de carro novo (20 mudas)! E o deputado Manato justifica assim o projeto: (...) “A preservação do planeta deve ser a prioridade maior de toda a sociedade, buscando a diminuição do tamanho das cidades (!? e aliviando o impacto da humanidade na Terra”.
Há ainda leis municipais que recomendam o plantio de árvores em outras atividades humanas. Em Martinópolis, cidade a 553 km de São Paulo, uma Lei Municipal, de 2007 obriga os pais a plantarem uma árvore para cada bebê nascido! Como na cidade nasce uma criança por dia, se todos os pais cumprirem a lei são 30 novas árvores por mês, o que, segundo o vereador André Luiz Crepaldi, autor do projeto, vai fazer muita diferença no futuro. Mas nenhuma punição está prevista para quem não cumprir a lei... E em Indaiatuba (SP), quando da comemoração dos 50 anos da Toyota no Brasil, em 22/112008, 10 mil voluntários quebraram o recorde mundial de plantio de árvores, ao plantarem 54 mil mudas de árvores de espécies nativas da região em 30 hectares da Fazenda Pimenta Indaiatuba em 17 minutos e 13 segundos e entraram pro Guiness!
Mas, conforme reportagem de Francisco Alves Filho, na revista Isto É –Tecnologia e Meio Ambiente – Edição No.1985,intitulada “Quantas árvores você está devendo?”,é preciso rever a antiga receita de realização pessoal que sugere a todo homem escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore. Segundo ele,os dois primeiros itens continuam valendo, mas para saldar nossa dívida ambiental com o planeta, semear apenas uma muda é atualmente quase nada! Isso leva pessoas e empresas à iniciativa de amenizar o problema – a chamada “neutralização” – que consiste em compensar a ação poluente do ser humano com o plantio de árvores, o mais equivalente possível à quantidade de gás carbônico lançado na atmosfera. Mas como diz David Lee, professor de meio ambiente da Universidade Estadual do Rio de Janeiro: “Contribuímos para o aquecimento global quando usamos, por exemplo, materiais degradáveis ou veículos movidos a combustível fóssil”.
E é justamente aí que reside o principal “furo” da Lei em vigor do deputado Marquinhos Trad. Embora louvável, sob o ponto de vista simbólico e de marketing (especialmente em ano eleitoral!), ela tem apenas função “neutralizadora” e “mitigatória”, mas não elimina de fato a poluição ambiental causada por veículos automotivos antes que ela aconteça!Para que isso ocorra, é fundamental, dentre outras medidas, reduzir significativamente, nos próximos anos, a frota de veículos nacionais movida a combustíveis fósseis e a troca por outros que utilizem fontes energéticas não-poluidoras, tais como energia elétrica, eólica, solar, hidrogênio, etc., além naturalmente do incentivo ao uso do transporte coletivo ao invés do individual. Dá pra encarar?
Hermano de Melo, Professor, pesquisador,
escritor e acadêmico de jornalismo da UFMS