Márcio Maio, TV Press
“A diferença de forças entre as emissoras abertas e fechadas no segmento infantil diminui cada vez mais”. A opinião é do desenhista Maurício de Souza, o criador da “Turma da Mônica”, exibida atualmente pela Globo. Mas é compartilhada com outros colegas que também têm seus produtos exibidos na tevê nacional. Com a oferta crescente de canais voltados exclusivamente para os públicos jovem e infantil, aumenta o espaço para subsegmentos entre eles e, consequentemente, para novas produções brasileiras. O que resulta em lucro para as empresas que exibem, maior campo de trabalho para quem produz e mais opções para quem assiste. “As três séries nacionais que estão na nossa grade são universais, agradam a crianças do mundo inteiro. Isso é fundamental para nós. Não buscamos produtos porque são brasileiros, mas sim porque são bons”, garante André Rossi, diretor de programação do Discovery Kids, que exibe “Princesas do mar”, “Amigãozão” e “Peixonauta”.
Mesmo com o mercado aberto, um fato chama a atenção: é cada vez maior o espaço cedido aos produtos voltados para o público pré-escolar. Por isso, não é à toa que esteja nesse público o foco de quase todas as animações nacionais exibidas atualmente. Séries que, em teoria, são consideradas mais simples no que diz respeito ao design e efeitos especiais. Mas que demandam cuidado especial por um detalhe: a participação mais ativa dos pais das crianças. “O público-alvo não tem muito como opinar, mas seus responsáveis assistem junto esporadicamente e são até mais exigentes”, justifica Fábio Yabu, criador da bem-sucedida série “Princesas do mar”.
Para Tiago Mello, sócio da Mixer e produtor executivo da série “Escola pra cachorro”, exibido no Nickelodeon e na TV Cultura, o foco em idades menores não limita a criatividade. Mas cria a exigência de cautela na produção de conteúdo, já que cenas de violência ou mesmo que possam assustar as crianças são vetadas. Desde mostrar uma briga a uma sequência em que um cachorro fica preso em uma árvore. Para evitar problemas, a “tia” do curso fica ao lado do bicho, confortando-o. “Nossos desenhos deixam os pais tranquilos para deixarem seus filhos assistirem. Criamos situações que facilitam papos entre eles, como episódios sobre bagunça ou reciclagem”, exemplifica.
Há quem não arrisque esse tipo de limitação. Mariana Caltabiano, por exemplo, prefere se distanciar do gênero pré-escolar. Mesmo assim, encontrou mercado para a série de animação “Gui & estopa”, exibida no Cartoon Network, canal que agrada crianças mais próximas da idade pré-adolescente e até adolescente. E assume que não foi só esse detalhe que a afastou de públicos menores. “Existe a questão de afinidade, é claro, mas comercialmente não achei tão interessante. Canal aberto, por exemplo, não tem grande interesse em desenhos pré-escolares porque precisam se comunicar com a família inteira”, aponta.
As emissoras estão cada vez mais cuidadosas na seleção dos programas a serem exibidos. No Discovery Kids, por exemplo, André Rossi garante que existe um critério rigoroso para definir que programas serão comprados ou co-produzidos. “Analisamos as propostas a partir de respostas a cerca de 60 perguntas. Entre elas, se contribui para o desenvolvimento social, cognitivo e emocional da criança e se atiça sua curiosidade para que elas aprendam por elas mesmas. São várias preocupações. E sempre 100% livre de violência”, atesta. Roberto Martha, diretor de produção executiva da Viacom Networks no Brasil, proprietária do Nickelodeon, faz coro. “Muitos fatores são levados em consideração. Tudo que contém violência, linguagem forte e o que mais possa ser considerado impróprio para crianças não é aceito de maneira nenhuma”, frisa.
Trabalhar o público pré-escolar também pode se reverter em lucro extra para os produtores com os licenciamentos de produtos. Mas essa atividade é, segundo o Kiko Mistrorigo, um dos criadores do “Peixonauta”, exibido pelo Discovery Kids, “uma caixinha de surpresas”. Segundo ele, um grande sucesso de público pode ser um fracasso em linhas de produtos e vice-versa. “’Carros’ não teve muito sucesso de público, mas faturou bem no licenciamento. Já ‘Os Padrinhos Mágicos’ passava em cinco canais de tevê e não se saiu bem no licenciamento. Não existe uma regra, é aposta”, explica.