A recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 363.352, cujo relator é o Ministro Marco Aurélio Mello, considerou inconstitucional o artigo 1º da Lei nº 8.540/92. Com isso, foi conferido a um frigorífico o direito de não reter e recolher a contribuição social incidente sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de empregadores, pessoas físicas, fornecedores de bovinos para abate, popularmente denominada de contribuição para o FUNRURAL.
Trata-se de uma ação individual que tem seus efeitos limitados apenas às partes. Porém, por se tratar de uma decisão tomada em última instância pela mais alta Corte da Justiça brasileira, terá consequências para todos os demais contribuintes que se encontram na mesma situação.
A decisão STF acabou por ser propalada como uma grande vitória da classe produtora rurícola. Pareceu – e é vendida essa idéia – que todos os produtores rurais empregadores, pessoais físicas, ficarão dispensados do pagamento de qualquer contribuição social para custear os benefícios concedidos e mantidos pela Previdência Social de seus empregados, o que não é verdadeiro.
A discussão tem como ponto central a possibilidade jurídica de substituição/troca da contribuição social incidente sobre a folha de salários, paga por todos os demais empregadores sobre a remuneração devida aos seus empregados, para que a incidência recaia sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de todos os produtores rurais empregadores, pessoas físicas, de todos os ramos da produção agropecuária. O STF, no caso individual apontado, apenas limitou-se a dizer que a lei vigente, editada em 1992, não poderia substituir/trocar o pagamento da contribuição incidente sobre a folha de salários para uma contribuição incidente sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de todos os produtores rurais empregadores pessoas físicas.
Até agora os produtores rurais empregadores, pessoas físicas, não são obrigados a recolher a contribuição social incidente sobre a folha de salários de seus empregados, cuja alíquota é de 20% sobre a remuneração devida, sem considerar o Risco de Acidente de Trabalho (RAT), que pode variar de 1% até 3%, conforme o grau de risco da atividade desenvolvida, mas sim um percentual de 2,1% sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural”. Aos adquirentes da produção rural, seja do segurado especial ou do empregador rural pessoa física, como é o caso dos frigoríficos adquirentes de gado para abate, cabe a obrigação de reter a contribuição incidente sobre o resultado da comercialização da produção e repassar aos cofres da Previdência Social, apesar de, em certos casos, não repassarem os recursos ao Erário.
Há, portanto, apenas uma substituição da contribuição incidente sobre a folha de salários dos empregados pela contribuição que recai sobre o resultado da comercialização da produção dos empregadores rurais, pessoas físicas, que foi julgada inconstitucional pelo STF. Cabe alertar que a decisão do STF não atinge a contribuição social do segurado especial, aquele produtor rural que explora a atividade agropecuária individualmente ou com o auxílio de sua família em regime de economia familiar, sem o auxílio de empregados, em propriedade rural de até quatro módulos fiscais. Esses continuaram a efetuar o pagamento da contribuição social incidente sobre o resultado da comercialização da produção.
A substituição da contribuição social incidente sobre a folha de salários por uma alíquota incidente sobre a receita bruta da comercialização da produção dos empregadores rurais pessoas físicas, sem dúvida, tem o mérito de fomentar a formalização do contrato de trabalho do empregado rural, a fixação da moradia no campo e, também, imprimir uma carga tributária menor à grande parte dos produtores rurais pessoas físicas que se valem de grande força de trabalho e contribuem substancialmente para o desenvolvimento nacional. É uma pena que nossa Corte Maior tenha se enveredado por caminho diverso.
A decisão proferida pelo STF apesar de ser propalada como uma grande vitória de todos os produtores rurais, em verdade, acaba por colocar em alerta a grande maioria do setor produtivo ruralista em virtude de seus efeitos maléficos.
Isso porque, sendo reafirmado o entendimento exarado pelo STF no processo acima citado em ação direta de inconstitucionalidade que já tramita naquela Corte (ADin 4395), que tem efeitos declaratórios (tornando o dispositivo que institui a substituição como se jamais tivesse existido) e abrangentes para incluir totalidade dos contribuintes – erga omnes –, invariavelmente, todos os produtores rurais pessoas físicas seriam imediatamente intimados para retomar o pagamento da contribuição social incidente sobre a folha de salários e, também, efetuar o pagamento do período não prescrito devidamente corrigido, o que lhes trará muito mais ônus do que bônus.
Aécio Pereira Junior, Procurador federal e assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Previdência Social