A Justiça Federal suspendeu, em decisão liminar (provisória), o leilão de quatro usinas hidrelétricas em Minas Gerais que, até o primeiro semestre, eram geridas pela Companhia Energética de MG (Cemig) em regime de concessão.
A venda das usinas de Jaguara, São Simão, Miranda e Volta Grande estava prevista para o próximo dia 22 de setembro e, nas contas da União, poderia arrecadar R$ 11 bilhões aos cofres federais.
A decisão foi assinada na última sexta-feira (18) pelo desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) Souza Prudente, e divulgada nesta segunda (21). A Advocacia-Geral da União informou que vai recorrer da liminar.
O governo federal conta com esses R$ 11 bilhões para "fechar as contas" desse ano e, por isso, diz que não abrirá mão dos recursos. Caso a transação não seja concretizada – seja com a Cemig ou com uma nova licitação –, a União teme que a crise orçamentária fique ainda mais grave.
Em nota, a Cemig informou que recorre no à Justiça para renovar automaticamente, por mais 20 anos, a concessão das quatro usinas em disputa. A reportagem questionou, mas a empresa não detalhou os valores que pedirá à União, como indenização, se os contratos não forem renovados.
Segundo a companhia, caso o leilão aconteça, "quem pagará essa conta será o consumidor, pois, de acordo com as regras definidas pelo Governo Federal para o leilão, as distribuidoras seriam obrigadas a contratar 70% da energia gerada por essas usinas e repassar esse custo para os consumidores".
O que diz a ação
A ação judicial foi proposta pelo advogado Guilherme da Cunha Andrade, que mora em Belo Horizonte.
Segundo o documento, a União pode ter prejuízo de até R$ 7 bilhões se realizar o leilão nos moldes previstos. Isto porque, ao retirar as usinas das mãos da Cemig, o governo federal teria que "indenizar" a companhia energética em R$ 18 bilhões.
"O mais comum, nestes casos, é a pessoa entrar na Justiça por razões ideológicas, por ser contra as privatizações. Não é meu caso. A questão aqui é o preço que está sendo anunciado, o preço mínimo dos leilões. Por R$ 11 bilhões, necessariamente vai haver prejuízo", afirmou Cunha ao G1.
Divergência nos cálculos
Segundo o advogado, a lei determina que, ao fim de uma concessão, o concessionário seja indenizado pelos investimentos que fez e ainda não foram amortizados (ressarcidos). Cálculos feitos por um escritório de contabilidade de BH e anexados ao processo indicam que esse valor, com a devida atualização monetária, chegaria a R$ 18 bilhões.
O problema é que, nos cálculos da União, esse valor é bem menor – "cerca de um bilhão e meio", de acordo com o processo. Cunha explicou ao G1 que esse cálculo do governo federal se baseou no Valor Novo de Reposição (VNR) – ou seja, na seguinte pergunta: "quanto se gastaria, hoje, para fazer esses mesmos investimentos que devem ser ressarcidos?"
"O governo está pegando um valor da década de 1970, considerando o valor histórico disso, e dizendo que está amortizado. Na minha visão, isso é um completo absurdo. A União já mostrou ter esse entendimento em outros momentos, como na MP do Setor Elétrico", diz Cunha.
"Ou a União está planejando não pagar nada, e isso daria um prejuízo de R$ 18 bilhões aos mineiros, à Cemig. Ou vai pagar, e aí está vendendo bens públicos e ainda pagando R$ 7 bilhões."
Cemig quer 'recomprar'
Na última sexta, a Cemig informou que ofereceu R$ 11 bilhões ao governo federal para reassumir as concessões das quatro usinas. Segundo o diretor-presidente da companhia, Bernardo Alvarenga, a oferta está feita, mas a Cemig ainda precisa encontrar garantias no mercado de que conseguiria pagar esse montante.
"Temos que ver como vamos (pagar), precisamos urgentemente que o governo nos ajude com empréstimo bancário para honrar este compromisso, porque a Cemig não tem como fazer um levantamento da noite para o dia. Só agora que o governo aceitou essa questão...", afirmou ele.
Somadas, as usinas de São Simão, Jaguara, Miranda e Volta Grande têm 2,92 gigawatts de capacidade instalada – o que equivale a quase metade do parque gerador da Cemig.
Quatro dias antes da oferta da Cemig, em 17 de agosto, o ministro de Minas e Energia Fernando Coelho Filho afirmou à imprensa que o governo federal "não poderia abrir mão" dos R$ 11 bilhões do leilão, ainda neste ano, mas que também não tinha fechado as portas à Cemig.