Enquanto para alguns permanecer em casa por causa do isolamento social parece uma ideia absurda, muitas famílias se esforçam para cumprir as orientações do Ministério da Saúde, mesmo com crianças e adolescentes que sofrem extremamente com mudanças de rotina.
Rosimeire da Silva, mãe dos adolescentes Mateus e Tiago, 13 anos, diagnosticados com autismo, evita ao máximo sair de casa desde que o isolamento social foi indicado. Hiperativos, os dois sofreram com as alterações na rotina – desde a paralisação das aulas até a presença do irmão mais velho em casa. “Meu marido é enfermeiro no Hospital Universitário, então, pela manhã está em casa. Nós nos dividimos. Eu faço atividades acadêmicas, terapêuticas e joguinhos com eles, para ocuparmos a manhã, enquanto meu marido faz o almoço”, explica Meire.
Desde o ano passado, Meire tem um espaço de acolhimento para autistas (em reforma para adequações). Para distrair os meninos, ela vai todas as tardes até o local, que antes era reservado para os fins de semana. “Lá no espaço tem o parque, o balanço, a caixa de areia e a cama elástica. Meu marido dorme no período da tarde para trabalhar à noite, e eu os levo. É uma dedicação bem grande mesmo, para conseguir que eles superem esse tempo sem muito estresse e sem muitas sensações ruins para os dois”, aponta.
Na hora de distrair os meninos, a tecnologia ajuda. “Eles têm aquele skate elétrico, que eu disponibilizo bastante na área da minha casa. Deixo ligarem o computador, o celular. Mas, mesmo assim, chega uma hora em que eles querem sair, sentem a dificuldade de permanecer só dentro de casa”, frisa.
Quando os adolescentes ficam muito ansiosos, o jeito é dar uma volta de carro. “Saímos com eles no carro para dar uma volta, mas ninguém desce. Damos um passeio por onde eles mais gostam de sair, mostramos que o lugar está fechado ou que o supermercado está cheio. Os dois conseguem compreender e vamos embora. Esse é o único passeio que eles fazem”, frisa.
A rotina é um dos pontos mais importantes dos autistas, eles não gostam de mudanças, mesmo as pequenas. “Meu filho mais velho parou de ir para a faculdade e foi dispensado do trabalho por 15 dias. Só de ele ficar em casa, o Mateus e o Tiago ficaram nervosos. Simplesmente porque ele estava em casa, e não era para estar, não era o momento, a rotina familiar mudou. Mesmo gostando do irmão, isso atinge e causa muito sofrimento para eles”, indica.
A confeiteira autônoma Helenice Duarte, mãe de Pedro Henrique Duarte Furtado, 10 anos, sentiu o baque da falta de rotina no cotidiano do filho, diagnosticado com autismo severo. “Foi um tanto difícil. A maioria dos autistas precisa de rotinas. Eles se equilibram com as rotinas e quando elas são quebradas ou interrompidas eles se desestabilizam. É necessário que a família os tire do foco, ofertem outras coisas para que eles se concentrem e estabilizem”, esclarece.
Pedro é um desses garotos cheios de vida que adoram bater perna e aproveitar a escola. “Ele gosta de ir à escola, de ir à casa dos avós, sair aos sábados à tarde. Essa era uma rotina nossa, então essa mudança de hábito, de rotina, alterou, sim, o comportamento. Inicialmente ele se mostrou ansioso. Demonstrou desejo de ir para aula – quando chegava o horário costumeiro dele ir para escola, ele pegava a mochila e enchia a garrafa dele com água”, explica.
Helenice acredita que tudo em excesso cansa, não só para os autistas. Porém, mesmo com a dificuldade dos últimos dias, ela se mantém em casa, com o isolamento social recomendado para frear a transmissão do coronavírus. “Todos os dias exigem de nós uma criatividade a mais para não deixarmos os dias enfadonhos e cansativos. Por exemplo, em um determinado horário do dia ele sai com o pai para dar uma voltinha, volta mesmo, sem descer do carro, para distrair um pouco e dar a sensação de que passeou”, indica.
Pedro conta com o companheirismo da irmã, Ana Paula. “A rotina de Pedro Henrique está assim, pela manhã, ele assiste alguns desenhos pelo tablet revezando com o celular do pai. Após o almoço, no qual estaria na escola, pois estuda no período vespertino, nós fazemos atividades com ele: usamos papel, canetinhas, trabalhamos com desenhos dando-lhes nomes e praticamos a escrita. Depois a maninha pula um pouco na cama elástica com ele e finaliza o dia, ora usando computador, ora usando o tablet”, conta.
Sempre sobra um tempo para o banho de mangueira e uma ajuda extra nas atividades domésticas. “Eu lavo a louça e ele a enxágua, eu seco e ele guarda”, diz.