A interpretação da 42ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente de Campo Grande quanto à obrigatoriedade de coeficiente de aproveitamento (é a relação entre a área edificável e a área de um terreno) único para Campo Grande está equivocada, segundo juristas e arquiteto ouvidos pelo Correio do Estado.
Baseada na Resolução Recomendada Nº 148, de 7 de Junho de 2013, a promotora Andréia Cristina Peres da Silva, tenta forçar vereadores e também a prefeitura a acatarem tal coeficiente no Plano Diretor sob risco de responderem judicialmente por improbidade administrativa.
Para o advogado e presidente da Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso do Sul (OAB/MS), Arlindo Murilo Muniz, a utilização de resolução como respaldo para ação de improbidade administrativa é “o cúmulo do absurdo”.
O especialista acompanhou os debates e representou a OAB no Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano (CMDU) durante a elaboração do Plano Diretor, durante oito meses em 2017. Para ele, “uma resolução não tem poder normativo suficiente para impor uma obrigatoriedade”, afirma, alegando que a própria Constituição Federal defende que somente leis têm tal poder.
O advogado ainda comenta que o instrumento (Plano Diretor) foi amplamente debatido para ser elaborado e que em nenhum momento houve uma pressão ou mesmo posição enfática do Ministério Público Estadual quanto à adoção do coeficiente “um”. “Lá em 2016 houve sim esse posicionamento, mas no ano passado não. Mas mesmo em 2016, não foi uma “campanha” institucionalizada do Ministério Público em defesa disso, mas a pressão de uma única promotoria (a 42ª)”, disse Arlindo.
Outro jurista, que preferiu não divulgar seu nome, afirma que se “mantidos e acatados os comandos determinados na Recomendação do Ministério Público, estarão sendo violados vários princípios e dispositivos do Estatuto das Cidades, do Código Tributário Nacional e de nossa Constituição Federal. A Cidade e toda a sociedade sofrerão enorme prejuízo”.
A resolução recomenda em seu artigo 1º que “a adoção do Coeficiente de Aproveitamento Básico (seja usado) como princípio balizador da política fundiária urbana municipal, a ser utilizado por todos os municípios até 2015”. Para o arquiteto Ângelo Arruda, que também participou da elaboração do texto final do PD, debatido e aprovado pelo CMDU ano passado, a resolução “não está mais em vigor”.
Ele explica que tal resolução foi uma “recomendação” aos municípios que elaboraram e aprovaram seus Planos Diretores entre os anos de 2013 e 2015. “O argumento de uso dessa resolução (para improbidade) é ilegal”.
CAMPANHA
Em nota, 18 entidades relacionadas à construção, imóveis, comércio e indústria, também se posicionam contrárias à 42ª Promotoria e citam dez pontos de alerta contra as mudanças defendidas pelo MPE. Um deles é justamente da contradição legal.
“O MPE tem defendido que a Resolução nº 148 de 7 de junho de 2013 do Conselho Nacional da Cidades afirma em seu artigo 2º que o “...Coeficiente de Aproveitamento Básico deverá ser unitário (um) e único para toda a zona urbana”. Trata-se de uma recomendação e não uma obrigação”, sustentam as entidades.
Na mesma nota, defendem ainda que “na prática, essa recomendação não é válida para Campo Grande, visto que a revisão do Plano Diretor começou em 2016”, já que a resolução teria validade somente até 2015.
Outro ponto importante e levado em conta pelas entidades é de que a promotoria estaria ferindo o próprio Estatuto das Cidades ao defender o coeficiente de aproveitamento “um”. “O próprio Estatuto da Cidade, que é superior à resolução, no artigo 28 em seus parágrafos 2º e 3º, especifica que o plano diretor poderá fixar coeficiente de aproveitamento básico único para toda a zona urbana ou diferenciado para áreas específicas dentro da zona urbana e que o plano diretor definirá os limites máximos a serem atingidos pelos coeficientes de aproveitamento, considerando a proporcionalidade entre a infra-estrutura existente e o aumento de densidade esperado em cada área”.
No entendimento das entidades, isso mostra que “conforme a Lei, é possível a definição do coeficiente de aproveitamento diferenciado levando em consideração as particularidades da cidade”.
Campanha está sendo iniciada para esclarecer sobre o Plano Diretor e o coeficiente de aproveitamento. Portal na internet e panfletos de divulgação devem começar a circular ainda esta semana.