A mãe do adolescente Marcos Vinícius da Silva, 14, morto nesta quarta-feira (20) a caminho da escola durante operação policial no Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, culpou a polícia pela morte do filho.
Na manhã desta quinta-feira (21), a diarista Bruna da Silva levou ao IML (Instituto Médico Legal), na região central da capital, a camiseta do uniforme do aluno suja de sangue e o material escolar que Marcos carregava na mochila.
"Onde bandido carrega isso? Bandido não carrega mochila! Olha o armamento dele [se referindo aos cadernos do estudante]. Isso aqui é arma? Eles entram na comunidade para destruir famílias. A irmã dele diz: 'tiraram meu irmão!' É uma polícia homicida", disse ela.
Procurada, a Polícia Civil do Rio informou que a Delegacia de Homicídios abriu inquérito para apurar as circunstâncias da morte de Marcos Vinícius. "Uma perícia já foi feita no local e está prevista uma reconstituição para determinar de onde partiram os tiros que atingiram o estudante", disse a instituição, por meio de nota.
Criticada por utilizar um helicóptero que realizava disparos, segundo depoimento de moradores, a Polícia Civil disse que "a utilização do helicóptero em operações, como as ocorridas na quarta-feira, se dá para a garantia da segurança de toda a população, entre eles, os moradores da comunidade envolvida e os policiais que desempenham suas atividades".
A polícia disse ainda que não há qualquer registro de que alguém tenha sido atingido por tiros vindos da aeronave empregada na operação na Maré.
Marcos Vinícius era o filho mais velho de Bruna. Ontem, ele acordou atrasado para a escola e, no caminho, foi baleado na barriga. O estudante foi socorrido por um morador que o levou a uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento).
"Meu filho estava lúcido. Ele chegou a dizer: 'mãe, nunca mais quero sentir essa dor na vida. Estou com sede'", contou Bruna no IML.
Após receber os primeiros atendimentos na UPA, o adolescente foi transferido em estado grave para o Hospital Getúlio Vargas, onde passou por cirurgia e morreu no início da noite de ontem.
"Eu estava trabalhando e não acreditei quando ouvi. Abandonei o trabalho e fui às pressas e, quando cheguei, ele estava entubado no hospital. Eu só o vi respirando com os aparelhos, não consegui falar com ele", disse Gerson da Silva, pai de Marcos Vinícius.
O velório acontece hoje no Palácio da Cidade, sede da prefeitura, em Botafogo (zona sul), e o enterro está previsto para esta sexta-feira (22).
A Linha Vermelha e a avenida Brasil ficaram bloqueadas na altura do Complexo da Maré nas primeiras horas da madrugada de hoje em razão de um protesto após a morte do estudante e de uma troca de tiros entre traficantes e policiais. O acesso e a saída da linha Vermelha para a linha Amarela também chegaram a ser fechados. Um ônibus foi queimado.
OPERAÇÃO POLICIAL TERMINOU COM 7 MORTOS
A operação na Maré tinha como objetivo cumprir 23 mandados de prisão. No entanto, a ação terminou com sete mortos --seis apontados como suspeitos, além do adolescente Marcos Vinícius.
Cinco deles têm entre 20 e 30 anos. Eles chegaram a ser levados ao Hospital Federal de Bonsucesso, mas, segundo a unidade, deram entrada mortos, com ferimentos de arma de fogo. Outro suspeito foi encaminhado para o Getúlio Vargas e também não resistiu.
A Polícia Civil afirmou que os homens baleados eram suspeitos e teriam reagido ao avanço dos policiais nas comunidades da Vila do Pinheiro e da Vila do João, ambas na Maré. A instituição informou ainda que foi encontrado "farto material bélico" em posse dos supostos criminosos, sendo quatro fuzis calibre 5.56 mm, duas pistolas e uma granada, entre outros materiais.
Os tiroteios ocorreram durante ação realizada por delegacias especializadas da Polícia Civil, com apoio do Exército e da Força Nacional de Segurança.
Na operação, dois blindados do Exército foram usados pela Polícia Civil, segundo o porta-voz do Comando Conjunto da intervenção federal, Carlos Cinelli. Os blindados foram usados para levar policiais para regiões mais perigosas da favela, que não haviam sido ocupadas por policiais que avançaram a pé. O objetivo era entrar em área "instável" para cumprir mandados de prisão antes que os suspeitos conseguissem fugir.
A operação de quarta-feira levou a Defensoria Pública do RJ a pedir uma liminar para proibir disparos de aeronaves em favelas ou lugares densamente povoados, mas o pedido foi negado pela Justiça nesta quinta --o órgão vai recorrer.