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Leonardo Avelino Duarte: "Medidas urgentes e importantes para sairmos da crise do coronavírus"

Professor, advogado e ex-presidente da OAB/MS

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Até pensei em escrever mais um capítulo das minhas famosas ligações do Cazaquistão. Algumas pessoas me pediram. Mas aí percebi que o assunto é muito grave. Acho que não dá para fazer humor com isso. É prudente não humorizar tudo o que há. Vamos lá. Quero falar de três coisas, três coisas apenas. Tirem após as conclusões que vocês quiserem.

Primeiro: não temos que escolher necessariamente entre a proteção de vidas (quarentena) e a atividade econômica (lojas abertas). Essa escolha não é só desnecessária, ela é burra, e contribui para a confusão geral de opiniões que temos por aí. É possível proteger vidas, mantendo a recomendável (até que me provem o contrário) quarentena e, mesmo assim, impedir a recessão e a onda de desemprego. Para isto, o governo tem que fazer o seu dever de casa, que todos os países sérios do mundo estão fazendo, neste momento: despejar dinheiro na economia, com crédito barato e sem garantia.  

Se precisar, dar dinheiro mesmo. Há países que estão dando dinheiro aos seus cidadãos. Claro, por aqui, seria preciso rasgar a lei orçamentária e a pec/lei de responsabilidade fiscal, mas tem que ser feito. Por favor, nada de loucuras como cortar o salário de servidores, ou suspender o pagamento de funcionários. Isso é ir na contramão do necessário. O mercado preciso de dinheiro, com urgência. E as pessoas precisam ficar em casa, até a poeira baixar. Simples assim. Se isto é possível lá fora, certamente será possível aqui.  

Que se paguem os precatórios atrasados, que se perdoe ou estendam os prazos das dívidas dos estados e municípios. Volto a dizer: não temos que escolher entre o mal e o ruim. O governo existe exatamente para nos atender nestas horas. Está na hora (já passou da hora) do governo ser governo. Vidas humanas não podem ser relativizadas. E nós, cidadãos, não precisamos orbitar em uma polaridade desnecessária, que só leva ao medo, oscilando entre premissas que são, essencialmente, falsas.

A segunda: já disse aqui, vou repetir. Verdadeiros líderes NÃO SÃO beligerantes. Eles praticam a paz. Líderes não destroem, constroem. Líderes não apontam culpados, e sim assumem responsabilidades. Líderes não dão desculpas, eles buscam resolver os problemas. Líderes não ofendem, eles dialogam. Líderes não agridem, porque buscam ser empáticos. Líderes andam com todos os homens, e sabem que a verdade não está em qualquer ideologia. Acima de tudo, líderes não segregam. Eles unificam. Não se iludam com falsos líderes que perdem o seu tempo agredindo os outros na internet. Há uma lei inescapável na vida, a da correspondência. Se você destila conflito e beligerância, você terá conflito e beligerância.

A terceira: sem adentrar no mérito ou de-mérito deste governo, ou na gravidade ou suposta não-gravidade do coronavírus. Há algo de errado em Brasília. Vamos a alguns fatos e perguntas: o Presidente fez três ou quatro pronunciamentos a respeito do coronavírus. Em alguns, disse que a doença era séria. Usava máscara. Falou para as pessoas seguirem recomendações médicas. Noutros, disse que era uma gripezinha. Em qual, ou quais pronunciamentos, devo acreditar? Eu, cidadão comum, quero saber qual é o exemplo e qual é a orientação do meu líder. Qual Bolsonaro deve ser levado a sério? O da quinta-feira passada, que usou máscaras ao vivo, ou o de ontem, que falou que a gripe não era nada demais?

Afinal, o coronavírus é ou não é sério? Há provas a respeito da não-gravidade da doença ou é tudo só uma teoria? Se for uma teoria, estamos sendo usados como cobaias, como um experimento? Vamos arriscar para ver se a economia (finalmente) decola? Só o México (governo socialista), a Nicarágua e o Brasil têm chefes de estado que negam a doença. Estamos baseados em ciência comprovada, em hipóteses científicas ou em superstições? Como cidadão, tenho direito de saber.

Outra pergunta, nosso chefe-de-estado disse, duas semanas atrás, que tinha ganho a eleição em primeiro turno, e que tinha provas disto. Aonde estão as provas? Eu quero saber se o nosso sistema eleitoral é fraudulento ou não. Como cidadão, eu tenho o direito de saber.

Última pergunta: qual providências estão sendo adotadas pela área econômica federal para defender pessoas como eu, sem renda fixa, durante o tempo desta pandemia? Domingo passado, me falaram que eu não deveria pagar meus funcionários. Segunda-feira disseram o contrário. Eu terei acesso a algum crédito barato federal? Meus impostos serão cobrados só depois que a crise passar? O governo me dará algum dinheiro? Ou eu devo expor a mim, minha família e meus colegas de trabalho, laborando normalmente com o pessoal no escritório, e atendendo clientes tanto quanto possível, fazendo a economia girar? Eu preciso saber. Sou um cidadão brasileiro.

Afinal, ter visto um chefe-de-estado dizer, em rede nacional, que é imune à pandemia em razão de seu histórico de atleta não foi o bastante para me confortar. Ao contrário, foi das coisas mais grotescas, bizarras e medonhas que já vi na vida, indigna de qualquer Cazaquistão, especialmente para mim, que nem futebol joguei.

Talvez razão mesmo tenha Miguel Reale Jr., um dos autores do pedido de impeachment da antiga presidenta. Ele defende que junta médica avalie a sanidade mental deste presidente.

Tomara que haja alguma. 

ARTIGO

Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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