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Therezinha de Alencar Selem: "E eles vão embora..."

Professora aposentada pela UFMS

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Se a evasão do Capital Econômico-Financeiro prejudica o desenvolvimento do País, o que dizer da evasão do seu capital humano, uma das maiores riquezas de uma Nação e que não se mede em cifras, mas em valores mais sutis, para os quais não se tem “réguas” específicas que as possam traduzir de forma objetiva, e sim pelo vácuo que deixa e pela falta que faz. 

Nossa nação se empobrece a cada dia, pelas vias dos desmandos de sua gestão e pelo êxodo de seus jovens. Os perdemos para a violência, para as drogas, para o péssimo sistema de ensino, para um sistema de saúde público falido e também porque o Brasil não lhes permite sonhar os seus sonhos.

E eles vão embora...

O mais triste é que este capital humano que se vai é o da melhor qualidade. Mesmo os que não têm alta escolaridade e que se sujeitam a trabalhos pesados em outras culturas são corajosos, com espírito de empreendedorismo, capazes das maiores dificuldades por vislumbrarem um horizonte que não encontram aqui. 

Quantos países são beneficiados com os filhos de nossa pátria nas mais diversas habilidades e competências, preenchendo palcos, laboratórios, centros de pesquisa, cátedras, oferecendo lições de civilidade, de criatividade, de alegria, deixando marcas indeléveis por onde passam e que encantam o mundo. Basta observar o que dizem do povo brasileiro. Não do seu governo. 

Raramente alguém deixa os seus porque os quer deixar. O coração se parte, e é preciso apertá-lo firmemente entre as palmas das mãos, respirar fundo e, com lágrimas nos olhos, ir. E o pior, a maioria quase absoluta prefere enfrentar todos os percalços da adaptação que esta decisão exige, e não regressa mais.

E para onde vão os nossos jovens? Para onde exista segurança, oportunidades de progresso, nível cultural estimulante, economia mais estável, chances de agregar conhecimento, enfim, procuram esperança em um futuro promissor que nosso País tornou-se incapaz de lhes oferecer. 

Quando uma família perde um filho, ela sofre, e a partir desse evento jamais será a mesma. O mesmo ocorre com nossa pátria mãe, que, pela impossibilidade de defendê-los ou de acolhê-los com dignidade, os perde. E perde o seu melhor. Jovens em sua mais bela fase produtiva, que podiam criar aqui suas famílias, melhorar o mercado, a indústria, o comércio, a agricultura, as artes, a política, e que, além do enorme vazio que deixam, contribuem ainda mais para o atraso de seu desenvolvimento.

E estamos muito defasados. Nosso País perde praticamente para todas as áreas do desenvolvimento, quando comparado com o resto do mundo, seja ele desenvolvido ou em processo.   

E por que isso?

O item básico: O domínio da língua pátria, sem o qual é impossível a sobrevivência social, não é decodificado por 38% dos “estudantes universitários brasileiros”, e apenas ¼ da nossa população domina esta habilidade, segundo o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) Brasil, em seu último relatório 2012 e 2015. A situação é tão grave que se criou a figura do “alfabetizado funcional”, uma aberração do sistema de ensino com viés eminentemente político, e não pedagógico, que considera estatisticamente alfabetizado quem apenas consegue assinar o próprio nome. 

Outro dado importante: Resultados do Pisa (2015) Programa Internacional de Avaliação de Alunos, na faixa dos 15 anos de idade, em Língua Pátria, Matemática e Ciências, coordenado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, demonstra que os melhores estudantes desta avaliação, tanto de escolas públicas como particulares do Brasil, “estão abaixo dos piores da Coreia do Sul”, por exemplo.

Se o estudante pode ir postergando este não aprendizado indefinidamente, uma vez que não há um momento de barreira ao percurso escolar, o que esperar dos demais conhecimentos necessários para a construção de sua cidadania, como dispõe a ONU e a lógica?

Os filhos de nossa pátria precisam de ensino de qualidade, cujos fundamentos estão em sua base: o Ensino Fundamental, para que se comece a reconstrução de nossa nação, de tal forma que seja bom viver aqui, com riqueza de oportunidades neste solo maravilhoso, cobiçado por tantos, tendo por foco o desenvolvimento integral da criança e do adolescente, sem o que continuaremos a perder indefinidamente o nosso precioso capital humano. Sem este primeiro grande passo, perpetuaremos o chorar de nossas perdas mais sentidas: Eles.

Já perdemos muito tempo e uma infinidade deles. É chegada a hora de reagirmos.