Viajar para quê? – é a pergunta que faço diante da horda de turistas com seus celulares na palma da mão em plena Place Concord.
Alguns chegam a carregar um equipamento tão absurdo quanto o nome: pau de selfie – para se fotografar em ângulos melhores.
Há algum tempo, nem tanto tempo assim, costumávamos viajar para conhecer e assimilar novas culturas, descobrir as belezas naturais, admirar a arquitetura local, saborear a comida, sentir os aromas, olhar as cores. Viajávamos para conhecer, aprender e desfrutar.
A viagem, costumava-se dizer, tinha três etapas: a preparação, a viagem em si e as recordações na volta. Na primeira vez que saí do Brasil, recebi um conselho de ouro: olhe para cima, para os edifícios, telhados, olhe o céu.
Quando em Paris a amiga viajada sugeriu apenas que eu me sentasse em um café para ver o desfile das pessoas nas ruas. Segundo ela, este pequeno gesto de observação valeria a viagem.
Quase 30 anos depois desses conselhos, que sempre segui à risca e me foram valiosos, penso – com algum pesar – que a maioria das pessoas não viaja mais, apenas se deslocam. Mudam de paisagem. E só.
Viajar para quê? Para postar foto nas redes sociais do prato do restaurante, com a escultura famosa ao lado, a placa do museu enquadrada. As pessoas não viajam mais, elas fotografam, fazem o registro, a pose, simplesmente para mostrar a outras pessoas.
A ideia agora é compartilhar, e não desfrutar. Perdem, a meu ver, tempo e energia captando superficialmente o que poderia ser vivido em sua profundidade. A câmera do celular se tornou mais importante do que o olhar vivo, curioso, atento, aberto.
O aparelhinho substituiu os sentidos do prazer. Substituiu o andar vagaroso e contemplativo pela pressa de publicar o momento que, em vez de eterno, se tornará fugaz.
Já contei aqui e vou repetir, certa vez na Índia e diante da minha total despreocupação em registrar os momentos, meu guia – um tanto indignado – não parava de perguntar: mas por que a senhora não tira fotos?
Eu respondia que guardava tudo nos meus olhos, e ele apenas sorria, balançando a cabeça com aquele jeito indiano que nunca sabemos se concordam ou não. Finalmente, e diante do Taj Mahal, ele não suportou mais a minha suposta indiferença.
Chamou um amigo com máquina a tiracolo e fez com que ele fizesse a tradicional fotografia em frente àquele que é considerado uma das maravilhas do mundo. Uma recordação, me disse, sem cobrar nem uma rúpia sequer pelo trabalho. Embora a foto seja bonita, não se compara à beleza que guardo na memória.
Viajar para quê? – é a pergunta que faço ao mineiro sentado a meu lado no aeroporto, ao ouvir suas reclamações sobre sua passagem por Barcelona. A principal delas, não poder fotografar tudo o que queria.
“Meus amigos vão ficar frustrados se não virem fotos minhas”, argumentou, revelando que quase saiu aos tapas com um guarda que lhe impediu de fotografar o interior de uma igreja. Mas e a cultura, arquitetura, a comida, não gostou de nada? Perguntei. Nada, respondeu. Estava mesmo era com saudade do feijão com arroz.
Não conheço Barcelona, mas imagino que o incauto viajante perdeu uma bela experiência. E, convenhamos, jogou dinheiro fora. Euros, inclusive.
Me contaram: uma distinta senhora americana foi a um dos mais famosos restaurantes do mundo, de propriedade do chef estrelado Joel Robuchon. Estava acompanhada de um casal de amigos franceses.
Ao final da refeição, um verdadeiro festival de iguarias. Na hora que veio a sobremesa, ela pediu desculpas aos amigos, tirou o celular da bolsa e disse: sei que o que vou fazer não é nada elegante, mas, diante de tanta beleza, arte e bom gosto, não resisto a uma foto.
Vocês me dão licença? No restaurante, deu-se um silêncio sepulcral diante do clique. Madame se esqueceu de que os franceses levam muito a sério as refeições. Mas quem se importa?