Artigos e Opinião

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Sônia Puxian: "Um peso saiu de suas costas"

Jornalista

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Conta a lenda que, numa cidade distante, vivia um sábio que era tido como o “Grande”. Grande em conhecimento, sabedoria e arte de lidar com a vida e as pessoas. As suas virtudes e talentos atravessaram fronteiras e vinham pessoas do mundo todo para conhecê-lo e absorver seus ensinamentos.

Certa vez, aproximou-se do sábio um senhor bem-vestido e de posses, considerado inteligente, abastado e dono de muitas terras. Surpreso e apreensivo por estar diante do sábio, perguntou-lhe: “Mestre, muitas vezes sou maltratado, muitas vezes ignorado e na maior parte das vezes não reconhecem a grandeza dos meus feitos. Tenho trabalhado muito, realizado grandes obras, conquistado conhecimento, sabedoria, mas parece em vão!”.

O sábio, entendendo o que se passava, olhou fixamente nos olhos do homem e respondeu: “Eu te reconheço! O seu valor é grande, assim como você!”. De imediato o senhor ficou surpreso e apreensivo, pois essas palavras o tocaram.

E o sábio prosseguiu: “Eu valorizo o seu esforço e te parabenizo por realizar grandes obras e projetos. Cada qual tem a resposta compatível ao nível do esforço e desempenho em conseguir bons frutos. A grandeza pertence somente aos grandes”, destacou.  

O senhor abastado sentiu um grande alívio e teve a alma preenchida diante de palavras tão significativas que, pela primeira vez, eram proferidas a seu respeito. Isso o alegrou e ele conseguiu ter uma visão ainda maior de si mesmo, agora mais real e valorizada por um homem sábio.

Ele ficou pensativo e em seguida respondeu: “Agradeço mestre pelas palavras de reconhecimento, elas me valorizam e isso é bom. Eu me sinto mais forte para prosseguir meu caminho de crescimento”.

O sábio ficou atento às palavras do homem, sentiu-se também reconhecido pelo homem, que o procurou para conhecer mais a respeito dos valores humanos e espirituais, e percebeu que se tratava de alguém de muito valor.

E a conversa prosseguiu: “Antes de se incomodar com o que os outros pensam a seu respeito, pergunte qual o tamanho de quem está diante de ti”, disse o sábio. E completou: “Vou explicar melhor! Geralmente, as pessoas pequenas não têm alcance para enxergar além do seu horizonte limitado, são pequenas. Quando se deparam com gigantes que trabalham, crescem e progridem, não conseguem ver além do seu pequeno tamanho limitado”.

“Como assim?”, perguntou o homem. E o sábio explicou: “Muito simples! Vou pegar de exemplo uma formiga. Se ela se deparar com um gigante, vai conseguir enxergar apenas a ponta do solado do sapato dele, porque é o que está ao seu alcance, ela nunca vai mensurar o tamanho total do gigante, porque é muito grande para ela. Sua visão limitada não lhe permite olhar para cima”.

O homem ficou atento às palavras do sábio, que completou: “Por isso, se você não está sendo visto, pergunte antes o tamanho de quem está à sua frente!”. O homem respirou aliviado, entendeu claramente o que se passava em seu caminho e alegrou-se. Um peso saiu de suas costas...

“Apenas os grandes reconhecem os grandes, porque estão à mesma altura!. Alegre-se de que poucos te reconheçam e a maioria não saiba quem és tu! O que importa é o tamanho de quem te valoriza, porque ‘somente os grandes enxergam os grandes’, lembre-se disso!”, reforçou o sábio.

O homem ficou pensativo e entendeu a mensagem do sábio. Saiu do local feliz, preenchido de suas dúvidas e com a certeza de que tudo na vida depende do tamanho de cada um. De nada adianta comparar-se ao incomparável, de nada vale medir-se pela medida do outro, de nada serve o tamanho do outro diante da sua medida.   

Cada qual tem a sua medida, o seu tamanho e o seu valor. Não existem medidas e valores que possam aferir algum tamanho, sem uma prévia e profunda valiação.

E você, qual é o seu tamanho? Qual o gigante que te reconhece ou qual a formiga que não te enxerga. Tenham ótimos dias e muitas alegriasssss...

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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Antissemitismo contemporâneo e violência simbólica

O atentado ocorrido em Sydney durante uma celebração de Hanukkah não pode ser lido apenas como um episódio de violência extrema circunscrito a um tempo e a um lugar específicos

16/12/2025 07h30

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Havia velas acesas. Não como metáfora literária, mas como gesto antigo: pequenas chamas dispostas contra a noite, insistindo em permanecer. O atentado ocorrido em Sydney durante uma celebração de Hanukkah não pode ser lido apenas como um episódio de violência extrema circunscrito a um tempo e a um lugar específicos.

Ele se apresenta como sinal perturbador da permanência histórica do antissemitismo enquanto estrutura simbólica ativa, capaz de atravessar séculos e adaptar-se continuamente às linguagens do presente.

Longe de constituir um desvio isolado, o ataque se insere em uma longa cadeia de acontecimentos que revela como o ódio ao judeu opera como lógica recorrente de exclusão. O antissemitismo não funciona como simples preconceito individual ou falha moral pontual.

Trata-se, antes, de uma racionalidade do ódio: um mecanismo coletivo que organiza frustrações sociais e crises identitárias por meio da eleição reiterada de um inimigo histórico. Hannah Arendt já advertia que o antissemitismo moderno não é um resíduo medieval, mas produto da fragilização das estruturas políticas e do espaço público.

A história judaica, marcada pela diáspora, pela perseguição e pela resistência, construiu-se sob o signo da memória. Não se trata de uma memória passiva ou meramente comemorativa, mas de uma memória ética.

Há aqueles que afirmam que os judeus têm o dever de continuar existindo enquanto judeus, para não conceder ao nazismo uma vitória simbólica póstuma. Cada ataque contemporâneo, portanto, não fere apenas indivíduos, mas tenta romper uma continuidade histórica sustentada pela transmissão cultural.

O fato de a violência ter ocorrido durante o Hanukkah – festa da luz e da resistência – intensifica a perversidade simbólica do atentado. Quando o sagrado se torna alvo, não se atinge apenas uma comunidade específica, mas a própria ideia de convivência plural.

Elie Wiesel lembrava que o maior risco moral das sociedades não é o ódio declarado, mas a indiferença que o normaliza.

No mundo contemporâneo, o antissemitismo frequentemente se mascara sob discursos políticos ambíguos, nos quais se confunde crítica legítima a decisões estatais com hostilidade dirigida a identidades coletivas.

Essa confusão cria terreno fértil para a estigmatização e para a legitimação simbólica da violência. A advertência de Primo Levi permanece atual: aquilo que aconteceu pode acontecer novamente.

Nesse contexto, a reflexão ética proposta por Martin Buber adquire especial relevância. Ao afirmar que toda vida verdadeira é encontro, o filósofo nos lembra que o antissemitismo nega radicalmente a relação, substituindo o rosto pelo estereótipo, o diálogo pela caricatura, o humano pela abstração.

Combater o antissemitismo não é tarefa restrita a políticas de segurança. Trata-se de um compromisso civilizatório que envolve educação histórica, responsabilidade institucional e vigilância ética permanente. Academias, universidades e veículos de pensamento atuam justamente no campo simbólico onde o ódio se forma ou é contido.

O atentado de Sydney interpela não apenas a comunidade judaica, mas toda a sociedade. Onde o antissemitismo encontra espaço, a dignidade humana se fragiliza. Defender a memória, recusar a indiferença e sustentar o pluralismo não são gestos retóricos.

São como aquelas velas iniciais: frágeis à primeira vista, mas suficientes para lembrar que a escuridão nunca é absoluta – apenas espera que alguém deixe de acender a luz.

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