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Rapphael Curvo: Nos ''úrtimos''

Jornalista e advogado

Redação

25/05/2015 - 00h00
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“Ói nóis aqui travez, nos úrtimos”. Mais uma avaliação internacional da qualidade de ensino e o Brasil, como sempre, entre os últimos, desta vez 60º entre 76 avaliados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE. Não bastasse, greve dos professores que querem melhores salários e sem ter como oferecer contrapartida. O resultado dessa avaliação mostra o fiasco que é o ensino brasileiro e seu quadro docente e gerencial. Os alunos são meras consequências do aprendizado aplicado,  o que nos leva a crer ser impossível a continuidade do sistema de ensino e da forma estrutural em que se baseia o seu gerenciamento. 

Anos após anos os governantes sempre têm milhares de saídas e desculpas pelo fracasso e, de imediato, reagem com novas normas falaciosas para a educação. Promessas de novos investimentos são irradiadas pela mídia como um novo tempo, que nunca virá se mantido o cordão umbilical da educação ao corpo político, o Executivo. A palavra de ordem de quem quer realmente fazer pela educação deveria ser ruptura, com o sistema vigente, na forma e no conteúdo. Proposta para tal ruptura apresentei em 17/01/2015 – artigo “Educação para os educadores, uma proposta”.  
Temos que descolar a educação do comando da política. Ela tem que ter personalidade própria e dirigida de forma inteligente e sábia e não ao sabor dos ventos e ingerências, como já ocorreu, de quem mal sabe assinar o seu nome, caso do ex-presidente. Educação é coisa extremamente séria para ser tratada da forma como é feita no Brasil. Não há nenhuma possibilidade de desenvolvimento de qualquer Nação sem um excelente sistema de ensino. É balela o que pregam os mandatários, ocupantes de cargos executivos na esfera federal, estadual e municipal, de que investimento financeiro resolverá o problema brasileiro na educação. Esse discurso está restrito a obras físicas e sem qualquer preocupação com a questão didática e pedagógica. É preciso melhor atenção e determinação com a exigência da boa educação, a qualidade. 

Os cuidados de gerenciamento com aquele que ensina não existem. Por outro lado, se baixo está o grau de respeitabilidade dos professores na escala profissional, é deles a responsabilidade. A grande massa não faz por merecer respeito como tal, exatamente por não ter um nível de preocupação e interesse em exigir equipamentos, treinamentos, conhecimento profissional de sua área, formação continuada, observação da linguagem culta, conhecimento e base de relacionamento interpessoal e, até mesmo, de cuidados pessoais e por aí vai. O grave disto é que este comportamento se estende até aos cursos superiores. Existe apenas um ponto em comum entre todos: a briga por melhores salários. Os fatores melhores condições de trabalho e outros exigidos algumas vezes nos movimentos reclamatórios salariais são apenas um disfarce para dar aquele ar de que se preocupam com as condições das escolas. Conseguido o aumento no holerite, tudo o mais fica para a próxima greve.

Dominada por sindicatos oportunistas que, quase sempre, têm como única meta aproveitar-se das benesses que o cargo oferece, até mesmo na relação com governos, os educadores são manipulados como massa de manobra pelos chamados líderes que não fazem outra coisa a não ser cumprir com determinações ideológicas de partidos ou grupelhos que os dominam. Estes, por outro lado, fazem suas ações de forma a assegurar sua condição política de comando, mas não são minimamente capazes, e competentes, em realizar ações que possam dar um “start” em um novo tempo aos profissionais da área. Não conseguem assimilar que a evolução da educação é acompanhada de maior valorização profissional, seja no campo salarial, social, técnico, entre outros.
Somado aos problemas com os educadores, está o povo brasileiro que, caso tivesse maior grau de formação escolar, não teria permitido as lambanças que fizeram, e ainda fazem, com o seu dinheiro e com a economia do Brasil. Perdeu-se, em nome de políticas populistas, aquele período de fartura no mercado mundial para nos consolidar economicamente e, talvez, nossa situação teria sido outra em nossos dias. O despreparo educacional da população favorece o aparecimento de oportunistas e mercadores de sonhos, os ilusionistas, que levam a grande massa a acreditar que vive um novo tempo. É o chamado voo da galinha, curto e desastroso. São razões que levam ao “Ói nóis aqui travez”, de volta aos velhos tempos, o povo sem grana, inflação, doenças se alastrando, criminalidade em alta, quebradeira de empresas, educação uma lástima, enfim, nos “úrtimos”.

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Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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