No texto anterior contei minha aventura para realizar uma citação judicial na zona rural do município de Bandeirantes, quando eu e o oficial de justiça sofremos até uma velada tentativa de intimidação, por parte de um cidadão armado com um revólver recheado de balas.
Mas, como tudo terminou bem, e com os réus devidamente chamados ao processo, a carta precatória foi devolvida ao Juízo de Campo Grande; na data aprazada, instalou-se a audiência de conciliação, instrução e julgamento. A simplória dupla de fazendeiros, ex-marido e mulher, compareceu acompanhada de advogado.
Iniciando o ato, o juiz perguntou às partes se havia possibilidade de acordo para pôr fim ao processo. Como o direito da autora estava demonstrado e provado de forma cristalina, os réus não tiveram como negar e propuseram entregar a ela outro terreno no mesmo loteamento. Até levaram uma planta do local para que ela escolhesse, entre os lotes disponíveis, aquele que lhe satisfizesse.
Ela concordou com a proposta, fez a escolha e os réus se comprometeram a outorgar-lhe a respectiva escritura sem nenhum ônus para ela, o que seria o mínimo a fazer.
Discutiu-se, então, as condições do acordo: o advogado dos réus rapidamente propôs que cada parte arcasse com os honorários de seu advogado e as despesas a que dera causa. Como somente minha cliente havia suportado as despesas do processo (meus honorários, custas processuais, despesas com a citação – entre as quais a locação do carro por mim utilizado, etc.), ponderei que não seria justo que ela, a autora, além de todo o dissabor por que passara, ainda tivesse que suportar todas as despesas, e pedi que os réus arcassem com, pelo menos, os gastos comprovados nos autos.
O juiz me cortou, dizendo que eu não estava querendo um acordo, mas sim “uma sentença transitada em julgado”; compulsando os autos, ainda estranhou: “Vejo que tem até aluguel de carro!”.
Respondi dizendo que não seria possível realizar as diligências a pé, e que nem eu nem ninguém de bom senso colocaria seu carro naquelas estradas e, mesmo que o fizesse, ainda assim haveria custos, no que ele fulminou-me com um olhar ameaçador.
O advogado dos réus, talvez até estimulado pela manifestação do juiz, fincou pé na sua proposta. Então tentei encerrar o assunto dizendo que, naquelas condições, não haveria acordo e que aguardaríamos o julgamento com tranquilidade, visto que o direito de minha cliente era líquido e certo, quando novamente fui agraciado com o olhar raivoso do juiz.
Minha cliente, pessoa esclarecida, porém humilde, percebendo o impasse e, com certeza, desiludida com a situação, pegou em meu braço e me disse baixinho que aceitava os termos propostos pela outra parte e abria mão do ressarcimento. Ainda perguntei-lhe se tinha convicção disso, respondendo-me ela afirmativamente.
Manifestei ao juiz a aceitação de minha cliente aos termos propostos e a audiência foi encerrada, saindo os réus satisfeitos e eu um tanto frustrado, pois entendi que ali não se fez justiça.
*Advogado e escritor ([email protected])