De tudo o que vem acontecendo não dá para ter certeza de nada. O imponderável começa por levar a melhor. O que podemos contra o desencanto e o desemprego? O que nos recusamos do que já temos e do que nos andam retirando de crenças e direitos? O novo, que não se vislumbra, e o velho, que não se renova? Os trabalhos e os dias estão incertos e a esperança, esta será, ainda, a última que morre?
Converso com pessoas que têm as mais diversas formações e trabalhos e, nos últimos dias, parece que a coisa virou. Ninguém para dizer que tudo vai bem no melhor dos mundos possíveis. Impossível cultivar, panglossianamente, um jardinzinho que seja.
Nem a versão mais comum de Poliana tem tido vez. Policarpo Quaresma, então, desistiu de manter seu sítio e tocar modinha no violão, há muito tempo. As formigas tomaram conta das plantações, e a música, cada dia menos musical. Muito pessimismo? A verdade é que não dá para ser alegre, ainda que Vinicius diga o contrário. O modernista Paulo Prado, no século passado, escreveu “Retrato do Brasil: Ensaio sobre a Tristeza Brasileira”. Mesmo que questionável sob muitos aspectos, o autor já identificava um mal-estar no povo brasileiro causado, entre outros fatores, pela ganância pelo ouro e pelas trapalhadas da politicagem.
Ao mesmo tempo, Mário de Andrade escrevia “Macunaíma”, o herói sem nenhum caráter.
Passamos os últimos 90 anos tentando provar o contrário, afirmando que somos um povo alegre, cordial, bom como Jó Joaquim, capaz de desenredar o pior enredo. Mas parece que não está certo. O carnaval da avenida desandou, perdeu o freio, o de rua não tem resistido à falta de banheiros. O futebol, um tédio. Ou seja, aquilo que ligeira e aparentemente nos identifica nada nos acrescenta.
Ainda morremos de febre amarela e de disenteria (inclusive verbal), quem diria? Conde Drácula, com o caixão cheio de ratos, resolveu viver num país tropical, abençoado por Deus. O churrasco virou papelão e a frangolândia bateu asas.
Além disso, o Papa, que deu certo, é argentino. Nem nossos preconceitos escapam! Mas não sou pessimista, apenas constato fatos corriqueiros que me fazem pensar melancolicamente que somos reféns de uns poucos, e nada nobres colegas, que não sabem a que vieram e só fazem olhar para o próprio umbigo dourado. O pior é que são eles a decidir o que somos e o que podemos ter: vida, trabalho, direitos. Eu, de minha parte, faço o que posso no meu mundo que é pequeno. Sem conhaque pra me deixar embriagada como o poeta, ainda consigo ficar comovida como o diabo, diante de tanta tristeza a assombrar o meu povo.