Artigos e Opinião

ARTIGO

Luciano Barros: "O impacto social do contrabando"

Economista e presidente do Idesf (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteira)

Redação

28/11/2016 - 02h00
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País de dimensões continentais, o Brasil tem quase 16 mil quilômetros de fronteiras terrestres, o que representa enormes desafios para os governantes e para sociedade, a exemplo da entrada de produtos ilegais no país sem o devido pagamento de impostos e o cumprimento de normas sanitárias e parâmetros de controle de qualidade. 

O chamado contrabando, que parece inofensivo aos olhos de quem compra os produtos a preços baixos nos grandes centros, tem consequências perversas e deixa rastros de destruição por onde passa.

Um triste exemplo dessa realidade é encontrado nos índices de desenvolvimento das cidades de fronteiras.

Segundo estudo recente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf), as cidades que hoje são portas de entrada para mercadorias ilegais apresentam índices muito abaixo da média nacional. Para se ter uma ideia, a média do PIB per capita desses municípios ficou abaixo de R$ 20 mil em 2013, enquanto o PIB per capita médio do Brasil ficou acima de R$ 26 mil.  

Essas cidades também se caracterizam pela enorme dependência de recursos dos governos estaduais e federal, de forma que, em algumas localidades, o volume dos repasses representa mais de 90% do orçamento anual. Estamos falando de cidades que, sem o apoio dos entes federativos previsto na Constituição, não se mantêm. 

Não bastasse o problema econômico em si, esses municípios fronteiriços sofrem também com a violência, que é, na verdade, um reflexo direto da escassez de recursos. Os índices de homicídios por 100 mil habitantes são assustadores e chegam a ser cinco vezes superiores aos índices de uma cidade como o Rio de Janeiro. 

O problema, obviamente, é agravado pelo controle precário das fronteiras. Soma-se a isso a disparidade tributária entre produtos nacionais e contrabandeados, que tornam esses últimos muito mais acessíveis, e está justificado o sucesso do mercado ilegal.

Corroborando o fato, recente pesquisa do Datafolha aponta que 26% dos entrevistados admitem o hábito de comprar produtos ilegais, como eletrônicos, roupas, calçados, DVD’s de jogos e filmes e cigarros. O motivo é sempre o preço. 

Atualmente, o cigarro é o principal produto mais contrabandeado para Brasil, representando 67,44% de tudo que entra no país ilegalmente. A marca Eight, por exemplo, proveniente do Paraguai, é a marca mais vendida no estado de São Paulo e a terceira mais vendida no país. E também pudera: enquanto a carga tributária do produto paraguaio é de 16%, a do brasileiro pode chegar a mais de 80%. 

E não são apenas as políticas tributárias que colocam o produto nacional em desvantagem. Restrições regulatórias severas, como aquelas impostas pelas ANVISA, também contribuem para perpetuar esse cenário. As fábricas paraguaias veem o mercado brasileiro com extremo interesse e, frequentemente, pensam a gestão de seus negócios de forma estratégica, já pensando na obtenção de vantagem competitiva. 

Considerando que o mercado ilegal não cumpre nenhum tipo de norma, seja ela de cunho fiscal ou sanitário, cada aumento de imposto e cada nova restrição regulatória são celebradas pelos nossos vizinhos.

Mais imposições legais para a indústria brasileira abrem uma janela de oportunidade magnífica para a indústria paraguaia. E é justamente em cima da legalidade de atuação das primeiras que as últimas crescem em velocidade assustadora e hoje já detêm 35% do mercado nacional, segundos dados da Euromonitor de 2015.  

Por esse motivo é que, antes de decidirem aumentar a tributação ou implementar novas regras para o mercado nacional, os governantes precisam olhar além de benefícios econômicos passageiros e dimensionar os impactos dessas decisões na vida dos brasileiros.

Não se pode mais jogar cegamente a favor do contrabando em nome de objetivos que não levam em conta aspectos sociais, principalmente das populações de fronteira, que são as que sofrem essas consequências de forma mais direta e cruel. 

EDITORIAL

Dever de agir do poder público no transporte

Quando o transporte coletivo entra em colapso, não se trata somente de ônibus atrasados ou tarifas em discussão, tratase de direito à cidade, eficiência do gasto público e respeito ao usuário

12/12/2025 07h15

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Em Campo Grande, o imbróglio envolvendo o Consórcio Guaicurus e a possibilidade de intervenção escancara um problema que se arrasta há anos e que, agora, exige decisões à altura da gravidade do cenário.

Concessões de transporte coletivo são, por natureza, contratos de longo prazo, exigem equilíbrio econômicofinanceiro, metas de qualidade, fiscalização contínua e mecanismos de correção de rota. O problema começa quando esse tripé se rompe.

Em Campo Grande, a sensação é de que o contrato envelheceu mal: frota aquém do esperado, intervalos irregulares, superlotação, falhas recorrentes e um sistema que parece não acompanhar a dinâmica urbana de uma capital em expansão.

Ao longo do tempo, o debate público ficou refém de um pinguepongue previsível. De um lado, o concessionário aponta desequilíbrios financeiros, aumento de custos, queda de demanda e necessidade de recomposição.

De outro lado, o poder público e a sociedade cobram cumprimento de obrigações, qualidade mínima e transparência. O resultado é conhecido: quem paga a conta, diariamente, é o usuário.

Transporte coletivo não é um serviço qualquer. Ele conecta pessoas ao trabalho, à educação e à saúde, reduz desigualdades e influencia diretamente a produtividade urbana. Quando falha, os efeitos se espalham: atrasos no comércio, evasão escolar, perda de renda, aumento do uso de veículos individuais e pressão adicional sobre o trânsito.

Por isso, a discussão sobre o Consórcio Guaicurus não pode ser reduzida a uma disputa contratual fria. Tratase de avaliar se o serviço prestado atende ao interesse público e se o modelo vigente ainda consegue entregar o que a cidade precisa.

A palavra “intervenção” costuma causar arrepio, e não sem razão. Mal conduzida, ela pode gerar insegurança jurídica, afastar investimentos e criar passivos ainda maiores. Intervenção não é confisco nem ruptura automática do contrato.

É um instrumento previsto em lei para situações em que o serviço essencial está comprometido. Permite garantir continuidade, apurar responsabilidades, corrigir falhas graves e, se necessário, preparar o terreno para uma transição mais eficiente, seja ela a retomada pelo próprio concessionário, seja uma nova licitação.

O debate, portanto, não deve ser “intervir ou não intervir”, mas como, quando e com quais garantias. Nenhuma intervenção se sustenta somente pelo clamor popular.

Ela precisa estar amparada em fatos objetivos, por exemplo, descumprimento reiterado de metas contratuais, especialmente aquelas ligadas à qualidade do serviço, risco à continuidade da operação, seja por incapacidade financeira, operacional ou de gestão, e falta de transparência, dificultando a fiscalização e o controle social.

Se esses elementos estiverem presentes, e devidamente comprovados, o poder concedente não somente pode, como deve agir.

Há, contudo, um risco real: transformar a intervenção em improviso administrativo. Sem planejamento, ela pode resultar em piora no sistema, e quem pagará a conta será novamente o usuário.

Não se confunda intervenção com autoritarismo. O poder concedente tem de conseguir conduzir um debate técnico, transparente e orientado pelo interesse público, mesmo diante de pressões políticas, econômicas e judiciais.

É comum que o usuário seja citado em discursos, mas raramente colocado no centro das decisões. Transporte coletivo eficiente não é luxo, é política pública básica.

ARTIGOS

Os aposentados e o fator previdenciário

Quem já estava aposentado pelo teto da época, que era de 10 salários mínimos, hoje R$ 15 mil, não percebe mais do que R$ 4 mil

10/12/2025 07h45

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Pior que os descontos em folha dos aposentados é a Lei do Fator Previdenciário, aprovada em 1999 pelo Congresso Nacional, logo após a reforma da Previdência aprovada em 1998, e que já provocou um rombo de 65% no valor dos benefícios de quem já estava aposentado, não respeitando sequer os direitos adquiridos. Resultado disso: empobrecimento e mortes causadas por depressão.

Quem já estava aposentado pelo teto da época, que era de 10 salários mínimos, hoje R$ 15 mil, não percebe mais do que R$ 4 mil.

As dificuldades ano a ano, com as perdas salariais, os levaram à pobreza. Já não conseguiam pagar o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) do velho carro, e muito menos o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) da casa adquirida ao longo da vida laboral.

Foram forçados a se desfazerem dos bens que possuíam, passando a morar de aluguel em pequenas casas de periferia ou a se submeterem a aceitar abrigo em casas de parentes ou amigos.

Contudo, é do nosso conhecimento que se encontra dormindo na gaveta da presidência da Câmara o PL 4.434/2008 , sem que tenha sido colocado para discussão no plenário da Casa. Note-se que esse Projeto de Lei já foi aprovado pelo Senado.

O Fator Previdenciário fere frontalmente os princípios dos direitos humanos, um verdadeiro massacre, e o Estado brasileiro, que deveria proteger seus idosos, com essa lei perversa acabou deixando-os na vala da miséria e, sem exageros, praticou um verdadeiro holocausto àqueles que trabalharam e contribuíram regiamente para os cofres da Previdência na esperança de terem uma velhice digna.

Porém, ao contrário, quem ainda sobrevive sofre a humilhação de morar de favor em casas de parentes ou instituições de caridade.

Suas excelências continuam fazendo cara de paisagem, agora com discursos inflamados por conta de mais um escândalo de desvios de dinheiro do INSS e dos seus miseráveis aposentados, mas sabem agir com rapidez quando o assunto é de interesse corporativo.

É bom saber que os aposentados atingidos pelo Fator Previdenciário chegam a 12 milhões e, apesar de idosos, ainda fazem questão de votar. A lei do retorno é infalível, senhores. Cumpram com seus deveres, sejam humanos e reparem esse mal que envergonha o nosso País: o desprezo pelos idosos.

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