Artigos e Opinião

ARTIGO

Guilherme Melo: "Petróleo e as incertezas sobre a demanda de algodão"

Analista sênior de Agronegócios do Itaú BBA

Redação

18/02/2016 - 00h00
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As fibras sintéticas, derivadas de petróleo, têm capturado grande parte do crescimento do mercado têxtil nos últimos anos em detrimento da fibra natural e, por conseguinte, do algodão. Mais recentemente, esse movimento se acelerou na esteira da queda das cotações do petróleo, reduzindo ainda mais a importância do algodão na demanda global. 

Diante disso, mesmo com a redução da oferta de algodão nos últimos anos, os estoques de fibra natural se elevaram e seguraram os preços internacionais. Agora que o mercado já antecipava o início da redução dos estoques na safra 15/16, sugerindo recuperações de preços, a queda da cotação do petróleo e a perspectiva de que seguirá flutuando em patamares baixos no curto/médio prazo podem minimizar essa tendência.

Os preços internacionais do petróleo influenciam de maneira relevante as cotações das fibras sintéticas no mercado internacional. Estimativas do Itaú BBA, usando preços mensais do petróleo brent e do índice de fibras sintéticas PCI, revelam que uma variação de 10% na cotação do petróleo causa, na média, uma variação no mesmo sentido de 3,7% na cotação da fibra sintética. Isso indica que preços mais deprimidos do petróleo podem ser repassados para os preços das fibras sintéticas e, consequentemente, reduzir a competitividade relativa da fibra de algodão (efeito substituição), impactando a demanda pelo produto. 

Além do efeito preço, que possui um impacto conjuntural sobre a demanda do algodão, é importante mencionar também que a aceleração da tendência estrutural dos consumidores em buscar produtos com características que não são oferecidas pela fibra natural é outro elemento que reduz o espaço para o avanço do consumo da fibra.  Este é o caso, por exemplo, dos tecidos inteligentes. Embora ainda não sejam tão relevantes do ponto de vista do mercado total, a aceleração da demanda por tais produtos – cuja matéria-prima para a produção é a fibra química (sintéticas e artificial) – pode encurtar o espaço para o acréscimo futuro do consumo da fibra de algodão.

Diante desse cenário, o tão esperado deficit global no mercado de algodão, após quatro anos de superavit, pode ser atenuado por um aumento menos expressivo da demanda, o que postergaria ainda mais a recuperação das cotações. Esse elemento de incerteza, relacionado ao efeito substituição das fibras naturais pelas fibras sintéticas, ressalta ainda mais a importância de fixar preços quando boas oportunidades surgirem.

O petróleo mostra fraqueza no curto prazo, mas indica recuperação a partir da metade de 2016.
Os preços do petróleo continuaram a recuar desde o fim de novembro, com o brent e o WTI atingindo US$ 30 por barril. Esses preços estão abaixo das mínimas atingidas no auge da crise do subprime em 2008/2009.
O excesso de oferta continua afetando os preços. Com a alta da oferta da Opep em relação ao ano passado e a estabilidade do agregado ex-Opep, o mercado segue desequilibrado, com estoques elevados. 

Revisamos a projeção de preços médios do petróleo do tipo brent, no primeiro semestre de 2016, de US$ 44 para US$ 37 por barril. O arrefecimento da preocupação com a China é capaz de ajudar a recuperação dos preços para US$ 35, mas, enquanto o acúmulo de estoques persistir, será difícil uma alta relevante nos preços.
Apesar dos preços ainda mais baixos no curto prazo, mantemos a projeção em US$ 55 por barril ao fim de 2016. Nosso cenário baseia-se na avaliação de que os preços dos últimos 18 meses estão reduzindo.

EDITORIAL

As bolhas que nos afastam da realidade

Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis

17/12/2025 07h15

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A expressão “estar em uma bolha” deixou de ser apenas uma gíria de internet para se transformar em um retrato cada vez mais fiel da forma como a sociedade vem se organizando. Nas redes sociais, algoritmos direcionam conteúdos, opiniões e notícias de acordo com preferências previamente identificadas.

O resultado é um ambiente confortável em que quase tudo confirma aquilo que o indivíduo já pensa. Divergir passa a ser exceção e confrontar ideias, um incômodo evitado.

Fora do ambiente digital, a lógica das bolhas também se impõe. O isolamento crescente em condomínios fechados, verticais ou horizontais, reduz o contato cotidiano com o diferente. Ao limitar o convívio, o indivíduo perde a oportunidade de compreender realidades distintas da sua própria.

Torna-se, ao mesmo tempo, mais desconfiado e mais desinformado, conhecendo o mundo mais pelo “ouvir dizer” do que pela experiência direta. A realidade passa a ser filtrada, editada e, muitas vezes, distorcida.

As bolhas criam falsas impressões. Quando se consolidam em grupos, reforçadas pelo sentimento de pertencimento, geram uma perigosa falta de sintonia com o restante da sociedade. Problemas coletivos passam a ser relativizados, minimizados ou simplesmente ignorados.

A empatia dá lugar à autoproteção e o interesse público acaba substituído pela preservação de privilégios.

Nesta edição, mostramos um exemplo concreto dessa desconexão: o aumento do duodécimo para quase todas as instituições de Mato Grosso do Sul, mesmo após um ano marcado por crise financeira, enquanto cresce a sobrecarga sobre o Poder Executivo.

É sobre ele que recai, de forma quase exclusiva, o peso de enfrentar as dores reais da sociedade: da falta de recursos para serviços essenciais às demandas crescentes por saúde, educação, transporte e assistência social.

Essa discrepância orçamentária não é apenas um dado técnico. Ela reforça as bolhas institucionais. Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis.

Trata-se de um desequilíbrio que aprofunda a sensação de injustiça e distancia ainda mais as instituições da realidade vivida pela população.

Seria desejável que integrantes das instituições que recebem repasses de duodécimo saíssem de suas bolhas. Que vivessem mais intensamente a realidade fora de gabinetes, relatórios e planilhas.

Que entendessem que, em tempos de dificuldades financeiras, reforçar privilégios e ampliar confortos institucionais não é apenas insensível, é socialmente injusto.

Romper bolhas não é simples, mas é necessário. Para indivíduos, para grupos e, sobretudo, para instituições públicas. A democracia e a justiça social exigem mais contato com a realidade concreta e menos acomodação em mundos protegidos. Caso contrário, seguiremos administrando percepções, e não problemas reais.

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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