Estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 184, competir “...à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos...”.
A própria Carta Magna dispõe que “A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei...”, aos requisitos do “aproveitamento racional e adequado”, “utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente”, observância das disposições que regulam as relações de trabalho” e, por fim, “exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores” (artigo 186).
A despeito dessas disposições constitucionais, a “reforma agrária” no Brasil se transformou em vergonha nacional.
O Governo Federal, sob a batuta do Partido dos Trabalhadores, tem se mostrado insensível à política agrícola, tem contribuído para a burocratização dos processos de desapropriação e, para complicar a situação, tem fomentado as invasões e contribuído para o desassossego no campo.
Parece contraditório, mas é a realidade. O governo de plantão – de matiz socialista – que sempre combateu o capitalismo e defendeu a distribuição de terras incentivando as lutas populares (MST, CPT, Abra, Contag, Fetagri etc) como meio eficaz no enfrentamento e obtenção pelos “trabalhadores rurais” dos seus direitos, é o primeiro a não demonstrar interesse verdadeiro pela efetiva reforma agrária, nos moldes propostos pela Constituição Federal.
Na realidade, o que o governo faz – ainda que veladamente – é contribuir para as ocupações de terras rurais, com as marchas populares, com as greves, ocupações de prédios públicos etc., inclusive, mediante a distribuição de verbas públicas, numa verdadeira política do “quanto pior, melhor”.
É um equívoco pensar que os problemas vivenciados pelo trabalhador rural serão resolvidos com luta armada, protestos, invasões de propriedades produtivas, obstrução de rodovias, invasão de sedes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária etc, e que serão superados mediante luta constante contra o capital.
O que se nota é a exploração do povo trabalhador (em todos os sentidos) pelos dirigentes desses movimentos que, por serem “privilegiados” intelectualmente, controlam os incautos.
Matéria publicada no jornal “Correio Estado”, edição de 12.11.2015, intitulada “Reforma agrária em MS transformou-se em negócio”, informa “...que há históricos de brigas entre entidades ligadas aos sem-terra. Em Bandeirantes, por exemplo, cidade distante 100 Km de Campo Grande, uma das organizações pôs fogo em barracos habitados por famílias ligadas a outra entidade. O motivo seria o fato de a direção da organização tida como agressora ter se enfurecido porque a entidade rival havia recrutado integrantes já inscritos, ou seja, que já tinha vínculo com outra corrente pela reforma agrária. O caso foi registrado na polícia, contudo, é tratado em sigilo”.
Revela, outrossim, que “Filiar-se a uma entidade ligada aos interesses dos trabalhadores sem-terra em Mato Grosso do Sul custa uma mensalidade que varia de R$ 30,00 a R$ 100,00. Isto é, o programa de reforma agrária virou um negócio rentável no Estado. Com a parcela em dia, o interessado num lote da reforma agrária garante estadia em barraco construído com lonas, madeiras e até sacos plásticos, em acostamentos de rodovias nos chamados acampamentos, espalhados, hoje, em 47 das 79 cidades, segundo dados da superintendência regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, o Incra. A medida fez crescer o número de acampamentos, estruturados como se fossem favelas à beira da estrada”, uma verdadeira poluição visual.
Conquanto a Carta Política brasileira estabeleça que “Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária receberão títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de dez anos” (artigo 189), inúmeros são os casos em que os beneficiários negociam as suas terras.
Matéria publicada, recentemente, em veículo de comunicação de âmbito nacional, noticiou que “...equipe de reportagens investigativas do Canal Rural percorreu assentamentos em Goiás e no Pará para mostrar como os lotes destinados à reforma agrária servem para especulação imobiliária. Terras que deveriam ser destinadas à produção familiar são vendidas como sítios de lazer. Um mercado que floresce à sombra das autoridades, sustentado pela corrupção, com a conivência de servidores públicos”. Segundo consta, a negociação é intermediada por um agente conhecido no assentamento como “Cigano”, como também por um assentado conhecido como “Capitão” (um dos primeiros a receber um lote do Incra no Assentamento Maria Cícera Neves).
Fato é que o debate acadêmico e político sobre a necessidade de realizar a reforma agrária, como forma de desenvolvimento das forças produtivas, de fortalecer o mercado interno, de estimular a indústria nacional, de distribuir a renda e, acima de tudo, de resolver o problema da pobreza no País, é uma falácia.
A realidade mostra que não existe política agrícola e fundiária séria no Brasil, e a reforma agrária se transformou em uma vergonha nacional.