Artigos e Opinião

Felipe Cazuo Azuma

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"Criminal Compliance - como forma de prevenir a responsabilização objetiva"

Advogado criminalista, professor de Direito na Unigran, especialista em Direito Penal e Criminologia pela UFPR e ICPC

Da redação

12/04/2016 - 02h00
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Em 1º de agosto de 2013 foi publicada a Lei 12.846, mais conhecida como Lei da Empresa Limpa ou Lei Anticorrupção. 

Em razão do conteúdo da lei, parece que a nomenclatura que melhor lhe cabe seja a de Lei da Empresa Limpa do que Lei Anticorrupção. Explica-se: a lei é toda voltada para a repressão das empresas que se envolvam em atos de corrupção, ela não visa punir o agente público corrompido (e não raras vezes muito mais corruptor do que corrompido!), mas sim o agente privado corruptor.

A lei é rigorosíssima com as empresas, com previsão de punições severas, fruto de um processo administrativo e/ou de um processo judicial, que vão desde uma multa de 0,1% a 20% sobre o faturamento bruto da receita anual da empresa (fruto de processo administrativo) até a dissolução compulsória da pessoa jurídica (fruto de processo judicial), dentre outras penalidades como a inscrição no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP).

Para a lei ser mais eficaz, o legislador instituiu a chamada responsabilidade objetiva da empresa, pelos atos que seus empregados e/ou terceiros venham a praticar. Isso significa dizer que, a aplicação de uma sanção à empresa por atos de corrupção se dará sem juízo da culpa que a empresa ou que sua alta direção tenha sobre o evento. Imagine-se o seguinte exemplo: um funcionário da empresa, encarregado da execução e entrega da construção de um novo setor, pressionado pelos prazos que estão se exaurindo, paga propina, por iniciativa própria, para um agente público acelerar a expedição de alvará para funcionamento do setor construído. Neste caso, a empresa ficará sujeita às sanções legais, não importando que o funcionário da empresa tenha agido por sua conta e risco, sem ordem ou respaldo da alta direção da empresa, portanto, sem sua culpa. A isso se chama responsabilidade objetiva.

Para aplacar a pesada punição prevista com uma multa que, como já dito acima, pode chegar a 20% do faturamento bruto anual da empresa, a própria lei, em seu artigo 7o,  inciso VIII, previu que devem ser levados em consideração na aplicação das sanções “a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”. Esses mecanismos e procedimentos internos de integridade é que se traduzem nos programas de Compliance.

O termo Compliance, vem do inglês, que significa estar em conformidade com as regras. Quais regras? As regras legais externas à empresa e às regras internas da empresa previstas em seu código de conduta. Assim, por meio do Compliance, a atuação dos dirigentes e funcionários deverá ser pautada pelos objetivos e metas mercadológicas da corporação, mas, sobretudo, deverão agir de forma alinhada sob os seus valores empresa. A empresa, em seu programa de Compliance, deve deixar bem claro qual o padrão ético/comportamental que deseja de todos os seus colaboradores. Na verdade o programa de Compliance efetivo deve produzir uma mudança de cultura na empresa. 

Assim, quando a empresa que se perceber envolvida em algum ato de corrupção, tiver um programa de efetivo Compliance internalizado em sua organização, com a minimização dos riscos, com auditorias internas, incentivo a denúncias etc., ela terá a diminuição da multa, ou quem sabe até a sua isenção, este último ponto a depender dos entendimentos dos Tribunais que, com certeza, terão que se manifestar sobre o tema da possibilidade de isenção da multa ante a existência de um efetivo programa de Compliance.
Para finalizar, os programas de Compliance são importantíssimos no mundo corporativo e tem tripla finalidade de prevenir, detectar e reprimir atos de corrupção praticados dentro do âmbito da empresa.

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Produtos livres de desmatamento nas estratégias da União Europeia

11/04/2024 07h30

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O Regulamento para Produtos Livres de Desmatamento é um entre vários componentes do Pacto Ambiental Europeu (European Green Deal), que tem como objetivo final atingir neutralidade de emissões de gases de efeito estufa em 2050, com um crescimento econômico livre da exploração excessiva dos recursos naturais e sem deixar ninguém para trás.

Trata-se, portanto, de uma peça dentro de um quebra-cabeça bem mais complexo que visa tornar a Europa um continente sustentável e carbono neutro.

Desde 2019, o Pacto Ambiental Europeu apresenta diretrizes que vão sendo gradativamente regulamentadas, cobrindo de energia renovável a produção de alimentos, passando por transporte e construção civil.

Trata-se de um marco legal abrangente que aborda diversas questões ambientais, incluindo o desmatamento, como parte dos esforços da União Europeia (UE) para um novo modelo de economia verde. 

O regulamento para produtos livres de desmatamento, aprovado em 2023, disciplina as atividades dos importadores europeus que passam a ser responsáveis por garantir que os produtos adquiridos não venham de áreas desmatadas depois de 31 de dezembro de 2020.

As restrições entram em vigor no final de 2024. Os importadores são os responsáveis pela implementação das verificações nos países exportadores, as chamadas “due dilligences”. 

As implicações para o Brasil são significativas, pois a UE é o segundo maior comprador dos nossos produtos agropecuários. Enfrentamos sérios problemas de desmatamento ilegal na floresta amazônica, além de questões fundiários e sociais.

Outro ponto importante é que a legislação europeia não faz distinção do que é considerado desmatamento legal ou ilegal. A normativa claramente se refere a desmatamento em geral. 

Esse ponto vem sendo questionado pelo governo brasileiro, alegando que está acima das exigências legais do ordenamento jurídico do país. Argumenta-se que essa normativa representaria uma forma de barreira não tarifária aos produtos do Brasil.

Entretanto, o argumento contrário é de que a UE tem a prerrogativa de estabelecer os critérios para os produtos que farão parte das suas cadeias de suprimento. E, como o objetivo maior é a redução dos impactos ambientais do consumo dos próprios europeus, nada mais lógico do que exigir que seus fornecedores sigam padrões compatíveis com essa ambição.

Importante notar que há fortes reações ao Pacto Ambiental dentro da própria UE, como vimos recentemente nos diversos protestos de produtores rurais no território europeu.

Embora estejam sensibilizando parte da sociedade e postergando algumas limitações, dificilmente a insatisfação dos produtores europeus ou dos governos fornecedores de produtos agrícolas para a Europa terão força para uma guinada nos objetivos de longo prazo da UE.

Parece haver um sério proposito do continente em mudar completamente suas bases de desenvolvimento, mirando a transição para uma economia mais resiliente e de baixas emissões de gases de efeito estufa.

Ao Brasil cabe o desafio de entender essas normativas e entrar em um processo de negociação sério e embasado na ciência. Ainda há grandes lacunas sobre como serão feitas as verificações do desmatamento e, sobretudo, como serão mapeadas as origens de cada lote de exportação.

Precisaremos acelerar nossos investimentos em rastreabilidade e transparência nos processos produtivos, assim como no aprimoramento de plataformas de monitoramento territorial. Tudo isso em consonância e em estreita colaboração com os importadores e agentes da União Europeia.

Ainda estamos em um momento de discussão e entendimento junto aos agentes europeus de como o novo regulamento será implementado no Brasil. Entende-se que será um processo com aprendizado mútuo e um período de adaptação.

Os entes governamentais têm o papel de catalisar essa discussão entre produtores, processadores e exportadores brasileiros para que estejamos prontos para manter a liderança como fornecedores de produtos agrícolas para a União Europeia. 

 

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Era uma vez em uma escola na Suécia

11/04/2024 07h30

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Depois de anos educando as crianças quase que exclusivamente com recursos digitais, o Ministério da Educação da Suécia começou a perceber alguns sintomas perturbadores nas suas crianças: deficiência na leitura e na compreensão de textos apropriados para a idade, muita dificuldade de escrever e, quando solicitadas, escritas realizadas apenas em caixa alta.

Mas o que mais chamou a atenção foi a percepção de que as crianças também começaram a apresentar dificuldades para expressar o que sentiam, pois lhes faltava vocabulário até mesmo para descrever cenas breves ou relatos de emoções simples.

Muitas dessas manifestações, resultantes da falta de exercício cognitivo e motor, assemelhavam-se a alguns transtornos psicológicos, e não é de se espantar que muitos pais possam ter procurado psicólogos, feito exames ou mesmo ministrado medicamentos, preocupados com a lentidão, o mutismo ou ainda com dificuldade de compreensão de seus jovens filhos.

O governo sueco, diante dessa constatação, resolveu dar uma guinada nas suas orientações escolares e agora estimula fortemente o uso de livros em vez de laptops, como também incentiva a leitura em voz alta, as rodas de conversa e a prática da escrita - inclusive ditados - com o objetivo de reverter o cenário que se desenhava catastrófico para o futuro.

Crianças que não são estimuladas desde cedo em atividades motoras e intelectuais podem ter dificuldades de desenvolvimento profissional na vida adulta, particularmente em um mundo onde a criatividade e a inovação são realidade em todo lugar. 

No último Pisa, divulgado em 2023, o resultado geral dos jovens estudantes suecos foi de 487, ante 499 registrado na edição anterior, de 2018. Em Matemática, a queda foi de 15 pontos e em Leitura, de 10 pontos.

Suficiente para que fizesse um país sério, como a Suécia, acender as luzes amarelas e buscar compreender as razões dessa perda de energia no aprendizado de seus jovens cidadãos, (para além dos efeitos da covid, que afetou de maneira praticamente igual os países participantes).

Uma das medidas que o governo buscou implementar em todas as escolas - embora na Suécia o programa e as orientações pedagógicas não sejam unificadas como no Brasil - foi: menos celular, menos laptop e mais livro, leitura, escrita e conversa. O básico que, desde mais ou menos cinco séculos atrás, tem orientado a ideia do que é ensinar e aprender.

 Lógico que esta constatação não implica em demonizar o uso de tecnologia em sala de aula, mas de usá-la com sabedoria, de forma que ela ofereça o que, de fato, não é possível conseguir por outros meios.

Mal comparando, é como o hábito de muita gente usar palavras em inglês para se referir a coisas ou situações nas quais já existe uma palavra em português perfeitamente cabível. Esse é o mau uso da língua estrangeira. O que não significa que não se deva aprendê-la e usá-la, muito pelo contrário.

A tecnologia compreende um conjunto de ferramentas e habilidades que deve servir para ampliar nossa capacidade de ler, raciocinar, produzir e nos comunicar. Mas, para isso, precisamos antes saber ler, raciocinar, produzir e nos comunicar.

O perigo do uso de celulares e laptops no ensino fundamental é o de diminuir ou mesmo obstaculizar  o desenvolvimento motor e cognitivo das crianças, além de dificultar a expressão de ideias, emoções e socialização, por falta de vocabulário capaz de se fazer entender quando relatar uma experiência.

O fenômeno hikikomori, que se refere aos jovens que abandonam qualquer contato social real e mantêm-se isolados em seus quartos, comunicando-se apenas pelas redes sociais, vem se alastrando por todo mundo, assim como a descrição de novos transtornos psicológicos associados à dificuldade de comunicação e socialização. A saída, porém, pode estar um pouco antes do consultório médico ou do psicólogo. Na boa e velha sala de aula.

 

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