Por enquanto, tudo parece apenas excesso de imaginação, pois não há nenhum flagrante de pessoas perfurando as ruas durante a madrugada
Imagine a cena: 3 horas da madrugada, o despertador toca, o cidadão tira o pijama, coloca uma roupa velha (que costuma usar quando faz trabalhos pesados), pega uma picareta, sai de casa, anda cerca de três quadras e começa a fazer buracos no asfalto. Depois do “trabalho” concluído, ele retorna para casa e volta a dormir. Não, não se trata de um caso de sonambulismo. Na verdade, essa foi a justificativa, no mínimo inusitada, apresentada pelo prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal, para falar da buraqueira nas ruas da cidade. “Tenho pessoas que me informaram que tem gente, à noite, dando picaretada no asfalto”, disse o atual gestor municipal.
De tão improvável, a declaração parece cômica, inicialmente. Uma breve reflexão sobre os problemas enfrentados pelos campo-grandenses, porém, suscita preocupações. Motoristas de todas as regiões da Capital precisam ultrapassar diversos obstáculos para chegar a seus destinos e até enfrentam prejuízos caso não consigam “escapar” de alguma cratera. A Operação Tapa-Buraco foi lançada recentemente, depois de ter ficado meses paralisada. Entretanto, a qualidade ainda deixa a desejar. Na última semana, o Correio do Estado mostrou locais onde os reparos não estavam durando. Na Avenida da Capital, os danos na via já eram visíveis menos de 24 horas depois da atuação da equipe.
Os gastos para tapar os buracos da cidade chegam a R$ 1,5 milhão mensais e irregularidades já foram flagradas em diversas ocasiões. No começo do ano, por exemplo, funcionários de empreiteiras foram flagrados tapando “buracos fantasmas” na região do Parque dos Poderes. Depois, várias denúncias semelhantes surgiram. Houve promessa de aprimorar a fiscalização, algo que ainda não ocorre na prática. As empresas agem sem qualquer intervenção e, em muitos casos, não adotam todos os procedimentos técnicos exigidos para evitar que os problemas retornem em pouco tempo. Muitos dos casos precisariam ser melhor investigados pelo Ministério Público Estadual para que não persista a sensação de descaso e impunidade diante das irregularidades flagradas.
Bernal retornou ao cargo no dia 26 de agosto e repete o discurso de sabotagem a sua administração. Nos primeiros meses de gestão, ele alegava perseguição sempre que recebia queixas, seja da falta de merenda ou de paralisação de obras por falta de pagamento às empresas. Até hoje, porém, muitas construções não foram retomadas, a exemplo de postos de saúde, Centros de Educação Infantil (Ceinfs) ou o Centro de Belas Artes. A população sai perdendo mais uma vez.
É preciso agir com pouco mais de seriedade e ter certeza dos fatos antes de trazer à tona algo tão absurdo. Por enquanto, tudo parece apenas excesso de imaginação, pois não há nenhum flagrante de pessoas perfurando as ruas durante a madrugada, o que faria, no mínimo, barulho para acordar os vizinhos.