As exigências impostas pela burocracia são necessárias, mas não podem servir como justificativa para o desperdício.
A legislação impõe obrigações aos cidadãos, com objetivo de disciplinar comportamentos e normas para conviver em sociedade. Neste conjunto, há deveres que precisam ser cumpridos, tanto pelo poder público quanto pela população. O problema ocorre quando essas regras acabam tornando-se entraves para determinadas ações necessárias. É o que vem ocorrendo, há décadas, com centenas de veículos apreendidos, que apodrecem nos pátios do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul (Detran/MS) e de delegacias.
Os responsáveis reclamam da burocracia para leiloar esses bens, que viram sucata e acabam tornando-se símbolos de desperdício de dinheiro público. Um problema que aguarda soluções e, sem dúvida, mudanças em normas que precisariam ser revistas com urgência. Se as leis estão atrapalhando, cabe aos nossos legisladores (deputados federais e estaduais) propor projetos que possam modificá-las.
O problema, porém, parece ir além dos entraves legais. Em entrevista concedida ao Correio do Estado na última semana, o juiz federal Odilon de Oliveira afirmou que os danos aos veículos e prejuízos econômicos ao Estado podem configurar atos ilícitos, resultando em responsabilidades até mesmo na área criminal, por prevaricação.
“O servidor que atua com negligência, causando um dano a outrem - no caso, o Estado -, comete ato ilícito, perde o cargo e tem o dever de indenizar. O que está sendo sucateado é o interesse econômico do estado”, revelou. Em algumas situações, há demora para adotar os ritos legais, notificando os proprietários - até mesmo por Diário Oficial - e estabelecendo prazos para que procurem os órgãos legais, informando que, posteriormente, os veículos serão encaminhados a leilão. Em síntese, há negligência.
No caso específico da Polícia Civil, há dificuldades porque veículos tiveram chassi adulterados por criminosos, impossibilitando identificação os proprietários. Então, os veículos acabam abandonados por anos, deteriorando-se.
Surge, neste contexto, série deproblema, até mesmo na área da saúde decorrente do acúmulo de água favorecendo a proliferação do mosquito Aedes aegipty, transmissor da dengue, zika e chikungunya. O transtorno expande-se ao setor da segurança, pois o descaso acaba tornando-se oportunidade para quadrilhas de assaltantes e receptadores de peças furtadas. Há ainda, como consequência dos demais, o gasto ao poder público, que precisa investir no monitoramento dos pátios.
Acrescenta-se à conta o desperdício, pois o Governo poderia estar economizando na compra de veículos ao utilizar esses carros e até ônibus que estão em condições de circular. Outra perda ocorre porque, devido aos anos de abandono, acabam indo para leilão apenas sucatas, depreciando o preço de mercado dos veículos.
Os primeiros passos para acelerar os trâmites estão sendo dados, com formação de força-tarefa entre Polícia Civil, Ministério Público e Justiça, que devem discutir medidas para acelerar destinação. Detran também precisa, com urgência, participar das discussões.
As exigências impostas pela legislação são necessárias, mas não podem servir como justificativa para o desperdício. Nesse caso, revisões precisam ser feitas na forma de aplicar as regras vigentes ou até mesmo alterá-las. Não podemos, porém, permitir que o descaso perpetue-se amparado sob a justificativa da burocracia.