O crescimento do número de barracos pode ser uma amostra dos efeitos da crise, com crescente desemprego e falta de renda.
O temporal do último fim de semana causou estragos em vários municípios do Estado; em Campo Grande, transtorno na região central da cidade, com a queda de árvores e falta de luz em alguns bairros. Mas nada se compara aos que as famílias da favela do Jardim Bom Retiro passaram e continuam a sofrer. A força do vento arrancou os frágeis telhados e as lonas, fazendo com que os poucos pertences fossem danificados pela chuva. São pessoas fragilizadas pela miséria, vítimas da favelização, processo que havia sido extinto há dez anos na Capital, mas que voltou e está se intensificando, agravado pela falta de planejamento urbano e a migração populacional.
O conceito de favela remonta o século XIX, logo após a abolição da escravatura. Além da população negra, segregada depois da libertação, os amontados habitacionais cresceram no século seguinte, com o êxodo rural, decorrente da industrialização e do processo de modernização do latifúndio. Desde então, as causas do crescimento das moradias precárias tiveram outros elementos decisivos, porém, sempre atrelados à desigualdade econômica e a falta de preparo das zonas urbanas em absorver a grande demanda. A improvisação dificulta instalação de infraestrutura básica - água e luz - , além da implantação de ações públicas nas áreas de Saúde ou Educação, como postos de atendimento e escolas. Implantar medidas saneadoras torna-se tarefa hercúlea para qualquer gestor.
É importante que o retorno da favelização em Campo Grande seja visto com preocupação por todos, não só pela gestão pública. O crescimento do número de barracos pode ser uma amostra dos efeitos da crise, com crescente desemprego e falta de renda. Em julho, reportagem do Correio do Estado mostrou alguns exemplos de pessoas que, sem condições de arcar com aluguel, optaram em montar moradias precárias em área próxima da BR-262.
A favela Cidade de Deus, em frente ao lixão, foi aumentando de forma desenfreada. No início deste ano, depois de decisão judicial que determinou a reintegração de posse, a saída escolhida pela prefeitura foi a transferência para outros quatro lotes, nos bairros Vespasiano Martins, Dom Antônio Barbosa, Jardim Bom Retiro e Jardim Canguru. A ideia era que o Município arcasse com 40% dos custos e as famílias pagassem o restante em trezentas parcelas. Porém, até agora, nem todos estão nas moradias prometidas e, pior, a estrutura precária, a exemplo dos que ainda estão nos barracos, também foi atingida no último temporal. Infelizmente, as cenas tristes devem ocorrer novamente, com a proximidade da primavera e intensificação do período de chuva.
Campo Grande tem lista de 32,5 mil famílias à espera de casa popular, sem perspectiva de mudança nesse cenário; não projetos novos em andamento. Dois condomínios, com 532 unidades, começaram a ser construídos há quatro anos e estão prontos nos jardins Canguru e Centro-Oeste, mas não há previsão de entrega. A estagnação é preocupante.
O desafio da próxima gestão é retomar os projetos habitacionais, para que a cidade possa voltar a ter o título de Capital sem favela.