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Cezar Benevides:
"Nordeste no centro"

Professor aposentado pela UFMS

Redação

31/10/2014 - 00h00
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O notável historiador pernambucano Evaldo Cabral de Mello, irmão do poeta João Cabral, acaba de ser eleito, merecidamente, para Academia Brasileira de Letras. Ele é o maior especialista sobre o período holandês no Brasil. Seus livros são muito bem escritos e refletem vasta pesquisa documental. Examinando com seriedade fontes históricas, algumas inéditas, holandesas, portuguesas e brasileiras, reconstruiu a trajetória da indústria açucareira que promoveu o principal ciclo econômico de nossa história e que colocou o Nordeste no centro do poder político nacional, onde está até o presente momento.

Qual a chave explicativa para a região manter tamanha longevidade no centro do poder político, quando a economia já não é mais dominada pelo açúcar? A situação de muitos irmãos nordestinos continua não sendo boa. Contudo, o mais grave ainda é o aspecto humano e não apenas o econômico. A forma de ajuda encontrada é degradante, porque acomoda e torna o beneficiário dependente. Em vez de dinheiro fácil, melhor seriam créditos que poderiam ser utilizados para aquisição de bens necessários ao desenvolvimento humano, à educação básica e à montagem de infraestrutura em toda a região.

Vamos tentar esquematicamente mostrar o que aconteceu nos últimos 100 anos. Em primeiro lugar, o poder escapou da monarquia desde que o açúcar perdeu força no mercado internacional. Os principais historiadores, Gilberto Freyre, Caio Prado e Celso Furtado mostram que o poder do Império apoiava-se nos políticos sustentados pela Casa Grande e Senzala. Depois vieram os coronéis que pagavam salário de fome. A agricultura que foi o alicerce da política Café com Leite administrou a República Velha até 1930 quando a queda da Bolsa de Nova Iorque também arrastou, por consequência, os barões do café. Paulistas e mineiros foram afastados pelos gaúchos de Vargas apoiados pelo “Nego” do Presidente João Pessoa, assassinado em 1930 e pelos tenentes do cearense Juarez Távora. 

O retorno do Nordeste depois da Revolução de 30, desta vez ligado ao Rio Grande do Sul, que aparentava conduzir o novo eixo de poder sustentou a ditadura de Vargas e assim perseverou durante o Regime Militar. Enquanto os generais Médici, Geisel e Figueiredo exerceram o poder aparente, multiplicaram-se os subsídios e as transferências de recursos públicos, o número de empregos, empresas e bancos estatais. 

A emenda constitucional nº 11 de 1978, no governo do antigo tenente Ernesto Geisel, transformado em general, rompeu a proporcionalidade entre o número de eleitores e o de congressistas com o propósito de prolongar a agonizante maioria da Arena no Colégio Eleitoral. Por consequência, veio depois o fim do Regime Militar e uma Assembleia Nacional Constituinte fora convocada depois que a Lei Eleitoral tinha sido violada. O resultado não previsto foi que a Constituição Cidadã, nascida da abertura nada lenta, nem gradual, consolidou o eixo de poder Norte/Nordeste com multiplicada avidez fiscal e corporativa. 

O ex-presidente Lula que se autocomparou com Getúlio Vargas foi o maior beneficiário desse esquema que dividiu o país em dois. Faço votos de que o apertado resultado eleitoral contribua para unir os brasileiros e fazer deste país uma grande nação. Nada pior do que estimular qualquer tendência separatista.