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"A polêmica decisão do STF e suas consequências nas eleições municipais"

"A polêmica decisão do STF e suas consequências nas eleições municipais"

Redação

19/08/2016 - 02h00
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Ary Raghiant Neto é advogado, membro do TRE-MS entre 2006 e 2012, classe jurista, Conselheiro Federal da OAB pela delegação de MS​.

O Supremo Tribunal Federal, por 6 X 5, no dia 10 de agosto, decidiu no RE 848.826 que cabe exclusivamente às Câmaras Municipais o julgamento das contas dos prefeitos, sejam elas “de governo” ou “de gestão”, tanto faz.

Essa decisão surpreendeu toda a comunidade jurídica e de certo modo a própria sociedade brasileira, na medida em que, desde 2014, o Tribunal Superior Eleitoral vinha decidindo no sentido de que, em relação às contas de gestão, nos termos do art. 71, II, da Constituição Federal, cabia aos Tribunais de Contas o julgamento definitivo; às Câmaras Municipais era reservada a tarefa de examinar somente as contas de governo (art. 71, I, da CF), após o parecer prévio da Corte de Contas.

A propósito, os Tribunais de Contas desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, com base na autorização constitucional, julgavam as contas dos administradores de recursos públicos, inclusive prefeitos, nos casos de contas de gestão, e tudo isso agora terá de ser revisto, inclusive com adaptações nas leis orgânicas e nos regimentos internos das Câmaras Municipais, tudo para atender a novel interpretação do STF sobre essa matéria.

Para fins de inelegibilidade, essa distinção sempre foi fundamental, na medida em que prefeitos, enquanto gestores de fundos municipais como os da saúde, educação e assistência social, para ficar apenas nesses exemplos, tinham suas contas julgadas pelos Tribunais de Contas, com a incidência da hipótese contemplada na alínea g, inciso I, do art. 1o, da Lei de Inelegibilidades (LC n. 64|90), no caso de reprovação pelo órgão técnico.

Em julgamento conjunto, o STF fixou, ainda, no RE 729.744, que o “Parecer técnico elaborado pelo Tribunal de Contas tem natureza meramente opinativa, competindo exclusivamente à Câmara de Vereadores o julgamento das contas anuais do chefe do Poder Executivo local, sendo incabível o julgamento ficto das contas por decurso de prazo”, o que signfica dizer, noutras palavras, que enquanto a Câmara Municipal não proferir julgamento de mérito, não há falar em inelegibilidade, a despeito do parecer técnico emitido pelo Tribunal de Contas.

Respeitadas as posições tecnicamente sustentáveis em sentido contrário, quer parecer que o STF esvaziou parte da competência constitucional que foi atribuída aos Tribunais de Contas e, ainda, dotou as Câmaras Municipais de uma “nova” atribuição para a qual o legislador municipal não está preparado, especialmente se lançarmos olhares para a realidade do interior do país.

O julgamento das contas de fundos, por exemplo, sempre foi eminentemente técnico e as Câmaras Municipais, em sua grande maioria, não possuem em seus quadros pessoal habilitado para realizar essa análise, a despeito do auxílio dos Tribunais de Contas do Brasil.

Do ponto de vista eleitoral, a alínea g do inciso I do art. 1o, da LC 64|90, tornar-se-á letra morta, afinal, o julgamento definitivo pelas Câmaras Municipais não poderá mais ser ficto, conforme decidiu o STF no dia 17 de agosto quando aprovou as teses que decorreram desse julgamento polêmico, o que significa dizer que se porventura não ocorrer o exame das contas remetidas pelos Tribunais de Contas antes do período de registro das candidaturas, a cada eleição, não haverá meios de se obter da Justiça Eleitoral a declaração de inelegibilidade do candidato.

E, indubitavelmente, o julgamento que era técnico passará a contar com certa dose de componente político, já que a Câmara Municipal é um órgão estritamente político, desvirtuando, infelizmente, a ideia inicial do legislador constituinte brasileiro, quando atribuiu aos tribunais de contas a função de julgamento.

Embora o STF tenha a missão de interpretar o texto constitucional, exercendo esse papel quase sempre com brilhantismo, nesse caso específico, por conta das consequências indesejáveis, a solução apresentada pela Corte Suprema, por maioria apertada de votos, não parece ser a mais adequada diante da triste realidade brasileira.

EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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