A água, ou melhor, a falta de água em algumas grandes cidades brasileiras está no centro do debate nacional. Daqui vai um recado, baseado em dados. Sabe aquele banho demorado do seu filho adolescente no banheiro? Atenção, ele não é o vilão dessa história. Vamos por etapas.
Primeiro, nada mais simples para o poder público do que jogar a culpa no cidadão, usuário da água tratada. As redes de distribuição das grandes cidades estão sucateadas. Há trincas por toda à parte. Metade da água tratada nas grandes cidades se perde nessas trincas e rachaduras de encanamentos das companhias distribuidoras de água. Toda vez que fecham o registro em nome do racionamento, a SABESP por exemplo, ganha dinheiro, pois não perde água tratada pelos buracos de seus canos, antes dela chegar ao hidrômetro do consumidor. Com a desculpa do racionamento fica mais fácil empurrar aumento para a população em suas tarifas, e assim, a vida segue.
Segundo. O consumo residencial é de apenas 10% da água. A agricultura consome 70% do uso humano da água e a indústria 20%. Para se colocar um quilo de carne à mesa, são gastos 17 mil litros de água, provavelmente muito mais que um mês de banho demorado no chuveiro. Para produzir um litro de cerveja, gasta-se 5 litros e meio de água, e no café da manhã, aquela manteiga que você passa no pão, utilizou 18 mil litros de água para cada quilo produzido.
A falta de água em São Paulo, no Rio de Janeiro e em outras cidades brasileiras, retrata um problema que existe em decorrência de vários fatores que se misturam. São eles, basicamente: a falta de comprometimento no planejamento e administração das áreas urbanas, mudanças climáticas e um modelo de agricultura cada vez mais voltado para a produção de grãos.
A escassez de chuvas, há tempos provoca calamidades em regiões do sertão nordestino, vez ou outra no sul do país e recentemente no Amazonas. Indiferente se essas oscilações no clima são provocadas pelas intervenções profundas dos humanos no meio ambiente, ou, se estamos outra vez passando por uma era de aquecimento do planeta, o fato é que, esse fenômeno, agora ao atingir metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, chama a atenção, acende o sinal de alerta e provoca o debate nacional. Só agora esse debate, depois que milhões de nordestinos migraram para construir Brasília, São Paulo e outras cidades no centro-sul do Brasil.
Enquanto a população mundial cresce, aumenta também a necessidade de ampliação da produção de alimentos. Ocorre que as plantações regionais dão lugar as sementes do agronegócio. Alimentos locais são produtos descartados na escala de produção a granel. O mundo precisa dobrar a produção de alimentos até 2050 e ainda não conseguimos erradicar a fome. Quase um bilhão de pessoas passam fome no planeta e isso ocorre não por falta de produção, mas sim por desperdício e uma melhor distribuição mundial.
O presente nos cobra nossa indiferença praticada no passado. O futuro se desenha com base no que estamos começando a viver. Ainda dá tempo de melhorá-lo, para isso precisamos de, inteligência, bom senso e honestidade na aplicação de recursos públicos. A água é de todos nós e é direito de cada um poder usá-la de forma responsável. É claro que nós precisamos fazer a nossa parte e talvez, a mais importante de todas, além de cuidar da água que temos é, na hora de votarmos, escolhermos na fonte a água menos suja.