Sabe aquele horizonte verde, composto por hectares e mais hectares de soja e milho que você enxerga sempre que viaja pelas estradas de Mato Grosso do Sul? Então, essa visão poderá mudar completamente nos próximos anos em função do aumento de temperatura. E, de carona, vai o cenário econômico de todo o Centro-Oeste, justamente em função da atividade agrícola que caracteriza a região.
Não há soja que resista ao aumento de até 6,4°C, estimada até o final do século XXI, em um dos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudança do Clima (IPCC, sigla em inglês). Baseado em duas possíveis trajetórias do clima futuro desenvolvidas pelo IPCC, uma com emissões maiores de gases de efeito-estufa e outra com emissões menores, foi elaborado o estudo “Economia do Clima”, que faz uma avaliação econômica dos impactos da mudança do clima no Brasil e identifica as principais vulnerabilidades da economia e da sociedade brasileiras.
De acordo com o estudo, a região central do país é a que mais deve sofrer com o aumento da temperatura. No cenário pessimista, o Produto Interno Bruto (PIB) do Centro-Oeste pode encolher 4,5%; Mato Grosso pode ter o maior prejuízo do país, 11,1%. Em Mato Grosso do Sul, o encolhimento do PIB pode chegar a 5,2%. A perda para o cidadão médio brasileiro, com respeito aos aspectos socioeconômicos, pode chegar a R$ 1,6 mil.
Agropecuária
Aquele horizonte verde citado no início da matéria poderá desaparecer porque, com exceção da cana-de-açúcar, todas as culturas sofrerão redução das áreas com baixo risco de produção, em especial soja (-34% a -30%), milho (-15%) e café (-17% a -18%).
No cenário pessimista, a soja terá sua área favorável de plantio encolhida em 41% até 2070. Já a cana poderá ter expansão de até 118%, se espalhando por toda a região Sul do país, que ficará mais quente.
Segundo o relatório, as modificações genéticas seriam alternativas altamente viáveis para minimizar impactos da mudança do clima, exigindo investimento em pesquisa da ordem de R$ 1 bilhão por ano.
Recursos hídricos
Nesse quesito, os resultados mais alarmantes são para as bacias do Nordeste Oriental e Atlântico Leste, para onde se espera uma redução brusca das vazões até 2100.
Praticamente em todas as bacias hidrográficas do Brasil a tendência é de diminuição das vazões, inclusive nas regiões em que os modelos indicam um aumento das chuvas. Nestes casos, a diminuição das vazões é decorrente das perdas por evapotranspiração causada pelo aumento da temperatura.
A diminuição das vazões refletirá na geração de energia hidrelétrica. Haverá perda de confiabilidade na geração de hidreletricidade, por uma combinação de efeitos climáticos desfavoráveis com uma grande dependência desse recurso no Brasil.
Para fazer frente à mudança do clima seria preciso instalar uma capacidade extra para gerar entre 162 TWh e 153 TWh por ano. A análise de adaptação indica que essa capacidade adicional seria obtida, principalmente, com gás natural, tecnologias avançadas de queima de bagaço de cana e energia eólica. Agregadas, essas opções implicariam custos de capital da ordem de até US$ 51 bilhões.
Meio Ambiente
A mudança do clima poderá causar redução entre 15% e 20% das áreas de florestas e matas localizadas nos estabelecimentos agrícolas, que cederiam espaço para outros usos, principalmente para a pecuária, que deverá ter um aumento de área de pastagens de até 11%.
A Amazônia vai virar savana. Estima-se uma redução de 40% da cobertura florestal até 2100 e a associação do aumento de temperatura com o desmatamento projetado leva a um quadro catastrófico de extinção de cerca de um terço das espécies animais da região mais biodiversa do planeta.
Prioridades de ação
No presente, a principal recomendação é estancar o desmatamento da Amazônia. O desmatamento gera significativas mudanças no clima local e regional e resulta em uma perda projetada de até 38% das espécies e de 12% de serviços ambientais em 2100.
Também está entre as prioridades o investimento em pesquisa agrícola de ponta, em particular na modificação genética de cultivares e desenvolvimento de mais estudos para identificar a natureza e quantificar os riscos de eventos extremos além de 2050 e 2100.