O diretor da Unidade Educacional de Internação (Unei) Dom Bosco e um agente de segurança socioeducativa estão afastados por tempo indeterminado, mas de forma provisória. A determinação foi judicial e acatada pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). O processo tramita em segredo de justiça.
Jean Lesseski Gouveia e Maurício César Lagoa foram indicados em processo como investigados em irregularidades na Unei que fica em Campo Grande. O afastamento foi assinado pelo secretário-adjunto da Sejusp, Antonio Carlos Videira, em 17 de janeiro, mas publicado só ontem (23) no Diário Oficial do Estado.
Eles não estão trabalhando em unidades desde 22 de dezembro do ano passado. Não foi informado se permanecem recebendo salários. Conforme o site da Transparência do governo do Estado, em dezembro o salário de Jean, que é diretor da Unei Dom Bosco, foi de R$ 4.493,53. As informações referentes a Maurício não constavam na Transparência, em pesquisa feita hoje à tarde.
Relatório do órgão federal Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT) fez vistoria na Unei em setembro do ano passado e identificou: indícios de tortura recorrente com uso de cassetete, condições estruturais precárias, falta de lógica socioeducativa, dificuldade de convivência familiar dos adolescentes que moram longe da família, sanções ilegais aos adolescentes e revistas vexatórias.
A unidade é a maior do Estado e tem histórico de superlotação, com capacidade para 80 pessoas, na vistoria estava com 87. Essa não é a primeira denúncia de violência e tortura contra os menores internados.
As condições encontradas foram relatadas a representantes da Assembleia Legislativa, das Secretarias de Estado de Educação e de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho, da Fundação Nacional do Índio; do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de MS; além do Observatório da Violência e Sistema Penitenciários da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS); do Conselho Penitenciário Estadual; e da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MS.
Promotores de Justiça, defensores públicos, agente da Polícia Rodoviária Federal também foram informados da situação da vistoria.
"Todos os alojamentos estão visivelmente deteriorados, exibindo marcas de possíveis incêndios nos corredores. Chuveiros elétricos nunca funcionaram, alojamentos e corredores ficam, grande parte, na escuridão devido à ausência de iluminação. São espaços bastante desumanos e degradantes", informou relatório.
CONSTATAÇÃO
O documento do MNPCT afirmou, categoricamente, o uso da tortura. "Evidenciou-se que tortura é uma prática recorrente e disseminada na UNEI Dom Bosco. Os relatos de ameaças, agressões físicas e psicológicas são onipresentes na unidade. Esta prática criminosa variaria desde os métodos mais tradicionais como a agressão física direta, até a utilização do frio, da umidade e da privação de saneamento básico."
Foram encontrados no local cassetetes produzidos de maneira artesanal, a partir de pedaços de madeira maciços e com até um metro de cumprimento. O apelido dado aos instrumentos é "chico".
"Informou-se que os agentes socioeducativos fariam uso frequente dos cassetetes, tendo-os em mãos durante idas e vindas para a escola e outras atividades, assim como durante rondas nas Alas, também na transferência ao CR, em casos de indisciplina, e durante atos de tortura", descreveu relatório.