Ano passado, a Guerra do Paraguai (1864-1870) foi revisitada e debatida por professores e pesquisadores que se reuniram em Aquidauana, em um evento promovido pelo curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). O objetivo era elucidar pontos obscuros do período, que se tornou o mais longo e o maior conflito armado ocorrido na América do Sul, no século 19.
A iniciativa foi bem-sucedida, teve palestras lotadas, e este ano o encontro será ainda maior. “Nós percebemos que a população se interessou; então, ampliamos”, diz o professor de História Paulo Esselin, idealizador do evento.
O primeiro Congresso Internacional de História Regional: Pensando a Guerra do Paraguai e a Consolidação dos Estados da Bacia do Rio da Prata terá início hoje, em Aquidauana, com programação até quinta-feira. Serão seminários, debates e apresentação de trabalhos referentes ao período da guerra e às consequências geradas pelo conflito, o qual durou cinco anos, até a tríplice aliança formada por Brasil, Argentina e Uruguai derrotar o exército paraguaio. Até os dias de hoje, há muitos episódios controversos e diversas discordâncias entre historiadores.
O congresso é organizado pelos cursos de graduação em Biologia, História, Geografia e Turismo, bem como pelo mestrado em Geografia, do câmpus de Aquidauana da UFMS, e mestrado em Estudos Fronteiriços, do câmpus do Pantanal da UFMS.
TEMAS OBSCUROS
Para aprofundar o olhar sobre as ações do passado, o evento terá participação de quatro historiadores paraguaios, um argentino, um uruguaio e quatro brasileiros, de diferentes regiões do País.
Além disso, mais de 400 acadêmicos inscreveram trabalhos para apresentação durante o congresso – e cerca de 60 conseguiram uma vaga para expor seus estudos.
De acordo com o professor Paulo, o congresso irá trazer temas pouco abordados sobre o período, como a participação dos indígenas. “Pouco se fala sobre os índios, que lutaram tanto ao lado do exército imperial quanto ao lado dos paraguaios”, destaca.
O professor Jorge Eremites, da Universidade Federal de Pelotas, pontua que os índios foram escravizados após o fim do conflito, mas esta é uma memória que foi apagada com o passar dos anos.
Outros pontos que serão abordados incluem a conversão dos índios terenas ao cristianismo, o papel das crianças durante a guerra, a situação do Paraguai devastado pelo conflito, entre outros.
NOVO OLHAR
O cientista Fabio Goiris, da Universidade Estadual de Ponta Grossa, também é presença confirmada no congresso.
Ele acredita que a versão oficial da guerra tem sido questionada há algum tempo.
“A ‘história oficial’ da guerra foi a mesma, tanto no Brasil como no Paraguai, depois de 1870: ‘Solano López era um expansionista, megalômano e desnaturado, que, praticamente sozinho, levou quatro países à guerra’”, afirma. “Este discurso já não se sustenta mais como antes se sustentava. Ou seja, com este discurso, excluía-se a participação do capitalismo expansionista, especialmente da Inglaterra (esta sob a forma de fiadora econômica dos aliados)”, argumenta.
Para o pesquisador, os revisionistas da América Latina, como Chiavenato, Leon Pomer e Eduardo Galeano, tiveram méritos indiscutíveis ao tentar desvendar estas questões.
“Com estas interpretações ‘mais à esquerda’, iniciou-se na América Latina uma visão mais crítica, mais progressista e, certamente, mais humanista da guerra”, define.
Conforme o professor Mario Maestri, do programa de pós-graduação de História da Universidade de Passo Fundo, o congresso é a chande de haver uma revisão sobre a guerra, suas motivações e seus resultados.
“Precisamos de uma visão que procure superar a mitologia que ainda cerca a guerra. Essa mitologia que tem um fundo muito patriótico”, conclui