Mais que um espaço de confraternização e consumo de bebidas e petiscos, os bares e botecos do Estado estão inovando como locais de fomento à cultura, propondo espaços diferenciados para abrigar manifestações artísticas.
Para quem trabalha no ramo, o fato de os clientes procurarem este tipo de estabelecimento para relaxar e se distrair é um benefício para as iniciativas diferentes.
A partir de junho, por exemplo, o Bar Valu, iniciará uma temporada de teatro. Além dos espetáculos, que acontecerão toda quarta-feira de junho, também haverá exposições de artes plásticas.
Silvana Valu, proprietária do bar, explica que a ideia surgiu pela necessidade de valorizar os artistas locais. “Se a gente tem um espaço que pode promover esse artista, seja com música, teatro, dançar, ou outras manifestações, é bom para o bar e para a cultura”, defende.
O diretor Jair Damasceno apresentará uma de suas peças, “Café Santo”, no Bar Valu e está animado com a oportunidade. “Nós precisamos de espaços para o teatro”, diz. “Eu me interessei porque a proposta é fechar o consumo de bebida alcoólica durante os 30 minutos de peça, então não vai atrapalhar os artistas”, pontua Jair.
“É uma forma de trazer pessoas diferentes para o bar e fazer coisas que a gente gosta e quer ver na cena cultural da cidade”, acrescenta Silvana.
DRAG
Uma das últimas empreitadas do Bar Valu foi o “Corrida das Drags”, que acontecia toda quinta-feira. No evento, fãs da cultura de drag queen assistiam, juntos, aos episódios do reality show norte-americano “RuPaul’s Drag Race”, uma competição de drag queens que se tornou mundialmente popular.
A ideia veio do artista plástico e ator Thiago Silva Moraes, junto do seu irmão, que é drag queen, Guilherme Moraes, e da professora Pamella Paine.
Já nas primeiras edições, a ideia conquistou público fiel. “Tivemos de 40 a 50 pessoas por noite. Nossa maior noite foi com 80 pessoas”, conta Thiago.
Além da exibição do episódio da série, o trio também teve a ideia de contratar uma drag queen da cidade diferente a cada noite, para realizar apresentação, fortalecendo a cultura local.
De acordo com Silvana, muitos clientes tinham um estranhamento inicial com o evento, mas rapidamente aceitavam a proposta. “É algo que eles não conheciam, que é diferente, e acaba gerando interesse”, opina.
Com o fim da temporada do seriado, o trio de organizadores planeja reformular o “Corrida das Drags”, priorizando shows mais elaborados das drag queens locais. “Devemos mudar o dia, para domingo, e acertar os detalhes, em breve”, promete Thiago.
CIÊNCIA
Em Dourados, dois bares da cidade abriram as portas para debater ciência e pesquisa científica. Parece inusitado, mas a iniciativa, intitulada “Ciência no Boteco”, foi sucesso de público e terá outras edições.
O evento aconteceu na segunda, terça e quarta-feira na semana passada. A ideia de introduzir discussão científica em bares e botecos faz parte do projeto “Pint of Science”, um festival internacional que acontece simultaneamente em sete cidades do Brasil e em mais 11 países.
A professora Isis Faria, do curso de Engenharia Física da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), coordenadora do evento em Dourados, conta que o público estava interessado e compareceu em peso. “Nós temos bastante receptividade do pessoal da cidade. Nos três dias, tivemos um público considerável, que nem estávamos esperando”, afirma.
Na ocasião, professores da UEMS apresentaram temas como microbioma humano e tecnologia e produção de cervejas artesanais. “A ideia é aproximar a comunidade do trabalho dos cientistas locais, para a população saber o que estamos pesquisando, e também esclarecer assuntos que as pessoas geralmente só escutam falar na televisão”, explica a professora.
Ela relata que muitos clientes foram pegos de surpresa, não sabiam do evento, mas participaram de maneira positiva. Após a apresentação dos professores, houve espaço para perguntas e interação do público.
Com o sucesso da primeira edição do “Ciência no Boteco”, Isis e os professores da UEMS preparam novas datas, ainda a serem anunciadas.
HUMOR
Os humoristas da cidade também encontraram, nos bares, um espaço de apoio e divulgação de seus trabalhos.
Raphael Luiz Baptista de Oliveira faz comédia stand up há quatro anos e tem experiência em apresentar seus monólogos em bares e botecos da Capital. Ele conta que o público é totalmente diferente. “Ao contrário da plateia de teatro, algumas as pessoas em bares nem sabem o que está acontecendo, e não gostam do tipo de piada que você está fazendo”, opina. “Isso gera um pouco de desconforto. Você perde a concentração, porque contas as piadas e as pessoas não dão risada”.
Raphael recorda a apresentação que fez em uma extinta casa de shows da cidade. No meio de seu número, um cliente o interrompeu, gritando o nome da banda que tocaria a seguir. Por conta dos obstáculos, o humorista diz que é mais criterioso com os convites de se apresentar nesse tipo de espaço, porém não recusa todas as ofertas. “Tem gente que só conhece esse tipo de humor desse jeito, e passa a frequentar as apresentações em teatro”, avalia. “Então tem a parte boa, porque fomenta a cultura”.